A morte de Stompie Sepei ficou–lhe colada à reputação e jamais a abandonou. A morte daquele jovem de 15 anos, raptado, torturado e depois assassinado pelo Mandela United Football Club (MUFC), a milícia criada por Winnie Madikizela-Mandela em 1985, por ser um informador, foi apenas a ponta do icebergue da história de uma lutadora anti–apartheid que se transformou em rufia, habituada a ordenar aos seus seguidores que usassem da violência.
Jerry Richardson, guarda-costas e confidente, condenado a prisão perpétua pela morte de Sepei, disse-o na Comissão da Verdade e Reconciliação da África do Sul: “As minhas mãos estão hoje cheias de sangue porque me disseram para matar e eu faço o que me mandam.”
Lutadora incansável contra o apartheid, tudo fez durante os 27 anos em que Nelson Mandela esteve preso para conseguir a sua libertação. E no momento em que ele foi libertado da prisão de Robben Island, o seu punho erguido de black power era também o triunfo do seu combate político. Esse dia foi o seu momento áureo, o de maior importância da sua vida, porque no dia em que Mandela se tornou presidente, e ela primeira-dama, já tinha começado o declínio da relação, as diferenças irreconciliáveis entre um chefe de Estado que se empenhou na reconciliação e uma primeira-dama que pretendia vingança.
Richardson confessou ter assassinado quatro pessoas a mando de Winnie, mas a comissão de reconciliação investigou 18 casos de homicídio e agressões do MUFC durante os anos 1980. Madikizela seria condenada pelo seu papel na morte de Stompie, primeiro a seis anos de prisão, pena comutada depois para uma multa de 3200 dólares.
O bispo Desmond Tutu, figura maior da luta anti-apartheid e Nobel da Paz em 1984, chegou a implorar-lhe, durante as audiências da comissão da verdade e reconciliação, que pedisse desculpa. Debalde.
No filme “Winnie”, construído a partir da sua perspetiva, a história conta-se de outra forma, a de uma mulher no mundo machista do Congresso Nacional Africano (ANC na sigla em inglês), onde nunca lhe perdoaram ações que aos homens eram comummente desculpadas.
Apesar do fim do casamento com Nelson Mandela em 1996, depois de acusações de adultério por parte do então presidente, e da sua demissão do cargo de vice-ministra das Artes e Cultura, Winnie manteve a sua popularidade junto das comunidades negras mais pobres, onde sempre esteve a sua principal base de apoio.
Em 2003 voltaria ao banco dos réus, desta vez acusada de roubo e fraude. Foi condenada a seis anos de prisão, reduzida a pena para três anos e seis meses no recurso.
Mesmo assim continuou a desempenhar um papel importante dentro do ANC, mantendo-se como deputada até à morte. Eleita membro do comité executivo do partido em 2007, foi quinta na lista de deputados nas eleições de 2009. Mas a sua boa relação com Jacob Zuma foi sol de pouca dura e Winnie acabaria a apoiar o jovem radical Julius Malema, que deixaria o ANC para fundar o seu próprio partido, atualmente a terceira maior formação política no parlamento sul-africano.
Apesar de ter chorado ao lado da viúva Graça Machel no funeral de Mandela, em 2013, rapidamente se envolveu numa batalha legal para garantir que a casa do ex-presidente na sua aldeia natal fosse herdada pelas suas duas filhas, Zinzi e Zenani, algo que o Supremo Tribunal acabou por lhe negar em janeiro deste ano. Nestes últimos meses, a sua saúde tinha–se deteriorado e passava o tempo a entrar e sair do hospital. A família deu a notícia de que morreu ontem, pacificamente, durante a madrugada. Tinha 81 anos.