Madrid. A crise dos mestrados que está a abalar o PP

Ciudadanos ameaça fazer cair o governo de Madrid se o PP não demitir a presidente da comunidade autonómica, Cristina Cifuentes

A crise política está instalada em Madrid e ameaça afastar o Ciudadanos do Partido Popular. A polémica em torno do mestrado da presidente da Comunidade de Madrid, Cristina Cifuentes, que está a ser investigado pelo Ministério Público e ao qual o conselho de reitores espanhola se referiu como eivado de “graves irregularidades”, levou o Ciudadanos a fazer um ultimato ao PP: ou Cifuentes sai ou o partido irá apoiar a moção de censura dos socialistas (PSOE), que já tem o apoio do Podemos.

O PP “tem de decidir se quer conservar o governo de Madrid ou Cristina Cifuentes”, afirmou ontem, em conferência de imprensa, o secretário-geral do Ciudadanos, José Manuel Villegas. Se a presidente do executivo madrileno se mantiver em funções, Villegas garante que o seu partido votará favoravelmente a moção de censura.

“A bola está agora nas mãos do partido de Rajoy”, acrescentou o dirigente do Ciudadanos. A formação política garante que continuará a apoiar a solução governativa em Madrid, o que não apoia é a manutenção de Cifuentes no cargo.

Mariano Rajoy, que governa Espanha com um executivo minoritário apoiado no parlamento por PSOE e Ciudadanos, está agora perante o dilema de ter de agir ou ver cair o governo em Madrid. Até porque Cifuentes não parece disposta a facilitar a vida ao líder do seu partido saindo pelo próprio pé. Só se demite se for o próprio Rajoy a pedir-lhe, refere a imprensa espanhola. “Se Rajoy lhe pedir, ela sai nesse instante”, disseram fontes do partido ao “El Mundo”.

Outras fontes da direção do PP garantiam ao eldiario.es que a situação de Cifuentes “se tornou insustentável” e que a direção já está a preparar desde o princípio da semana um futuro sem ela. Rajoy e Cifuentes estão em contacto desde o início da crise e a presidente do governo de Madrid tem insistido sempre na ideia de que não cometeu nenhuma ilegalidade e que as irregularidades estão cingidas ao âmbito universitário, nada tando a ver com a sua carreira política. E, afirmam outras fontes, essa tem sido também a interpretação do presidente do governo e da cúpula do PP, para a qual seria “um grave erro” que a direção nacional deixasse cair Cifuentes.

Ao “El Mundo”, um membro da comissão executiva de Madrid garantiu que “estamos com Cristina a 100%” e que os eleitores do PP não iriam entender que, por causa da chantagem do Ciudadanos, o partido deixasse cair uma das suas dirigentes. Até porque não acreditam que aquele partido concretize a sua ameaça de votar ao lado do PSOE e do Podemos e derrubar o executivo do PP. Seria um “suicídio político”, dizem as mesmas fontes do Partido Popular.

As sondagens apontam para uma maioria de 52% das intenções de voto na direita em Madrid para as eleições de 2019. E os populares consideram que, se o Ciudadanos votasse a moção de censura, estaria a prejudicar essa vitória da direita. E poderia acontecer que, derrubada Cifuentes, esta passasse à oposição e voltasse a candidatar-se ao cargo no próximo ano, sem que a direção nacional do partido o pudesse impedir, tendo em conta a autonomia do PP regional.

Mais políticos envolvidos O escândalo do mestrado irregular de Cristina Cifuentes na Universidade Rei Juan Carlos (URJC), que é uma universidade pública, vai mais além da presidente do governo de Madrid, implicando outros políticos num esquema que envolve assinaturas falsificadas de professores. Pelo menos dez alunos do mesmo curso da presidente do executivo madrileno estão envolvidos em irregularidades, alguns deles com vínculos ao PP, outros à URJC. O nome mais conhecido é o de Pedro Calvo, que foi o número três da Câmara de Madrid, liderada por Alberto Ruiz-Gallardón, também do PP.

O presidente da Conferência de Reitores de Universidades Espanholas, Roberto Fernández, afirmou ontem em conferência de imprensa que se detetaram “graves irregularidades” nas investigações ao mestrado de Direito Público no Estado Autonómico de Cristina Cifuentes no Instituto Universitário de Direito Público (IUDP) da URJC.

Fernández refere que “não parece que todas as notas estejam [lançadas] de forma correta e legal” e que também “parece não haver trabalho” que justifique o tratamento que o IUDP deu a Cifuentes. “Se se confirmar, estamos perante uma irregularidade muito grave”, concluiu Fernández.

Este instituto, que pertence à URJC mas funciona de forma autónoma, é dirigido por Enrique Álvarez Conde – suposto tutor do trabalho de fim de curso do mestrado que o conselho de reitores considerou agora parecer não ter existido. Apesar de funcionar com dinheiros públicos, não apresenta as suas contas publicamente. Álvarez Conde escolheu pessoalmente os professores sem que a reitoria da universidade tivesse voto na matéria – tanto nesse mestrado como nos de Sexologia ou de Terapia de Casal.

Criado em 2001, foi aprovado em 2005 por outro governo do PP, nessa altura liderado por Esperanza Aguirre. Por trás da sua criação e à sua frente sempre esteve Álvarez Conde – o mesmo que terá ameaçado uma professora do mestrado cuja assinatura é dada como falsa.

Aos agentes da polícia que a interrogaram, a professora afirmou que gravou o diretor do instituto a dizer que lhe arruinaria a carreira docente se não participasse na falsificação de provas que a presidente da Comunidade de Madrid apresentou para garantir que o seu mestrado era mesmo verdadeiro.