A organização internacional de proibição das armas químicas confirma a avaliação do governo britânico ao caso do envenenamento do espião russo Sergei Skripal e da sua filha, Yulia. De acordo com o resumo da investigação, publicado ontem, a arma que quase matou pai e filha pertence, de facto, ao grupo de agentes neurotóxicos Novichok e, além disso, apresenta um elevado grau de pureza. A organização está impedida de atribuir responsabilidade, mas as suas conclusões reforçam a tese de que a arma foi manobrada por agentes ao serviço do Kremlin, que continua a negar qualquer responsabilidade e insiste em receber as amostras recolhidas em Salisbury.
“Não podem restar dúvidas sobre o que foi usado e continua sem existir explicações alternativas sobre quem é o responsável: apenas a Rússia tem os meios, a motivação e o historial”, lançou ontem o ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, Boris Johnson, comentando a análise da Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPCW, em inglês). O grupo entregou uma versão detalhada e confidencial do agente neurotóxico ao governo britânico, na qual incluiu a fórmula química do composto. “Tentaremos fazer o que está ao nosso alcance, com os nossos parceiros, de forma a eliminar o uso grotesco deste tipo de armas”, acrescentou Johnson, convocando uma reunião do Conselho de Segurança da ONU.
Londres, Washington e a aliança de países europeus que há duas semanas expulsaram mais de cem diplomatas russos vêm assim validada a sua posição. O Kremlin, contudo, insiste em dizer que a atribuição de culpa não passa de mais um sintoma da síndrome antirrussa do ocidente. Moscovo insistiu na sequência do ataque em que a OPCW participasse na investigação do governo britânico e avaliasse as amostras recolhidas. Agora, todavia, o Kremlin defende que também o relatório da organização faz parte do complô antirrusso. “Não há motivo para acreditar que isto não passa de mais um passo na provocação rude à Federação Russa por parte dos serviços de segurança do Reino Unido”, disse a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo, Maria Zakharova
Melhorias Sergei e Yulia Skripal foram encontrados no início do mês de março desmaiados num banco do centro comercial de Salisbury, no sul da Inglaterra. Assim que os investigadores britânicos determinaram que os dois haviam sido envenenados com o agente neurotóxico da família Novichok – pensa-se, agora, que o agente foi colocado na porta da sua casa –, as esperanças de que viessem alguma vez recuperar do estado de coma chegaram a ser consideradas mínimas. A família Novichok designa a mais avançada gama de agentes neurotóxicos conhecidos, desenvolvidos na União Soviética ao longo das décadas de 1970 e 80, e a primeira-ministra britânica, Theresa May, chegou a afirmar em Westminster que as chances de sobrevivência dos Skripal eram quase nulas.
May enganara-se. Yulia registou melhorias inesperadas e rápidas ao longo da semana passada e já recebeu alta hospitalar. O seu pai, que ainda se encontra em estado grave, dá também sinais de melhoras e os médicos britânicos antecipam que em breve possa abandonar o hospital. Os seus testemunhos serão preciosos para a investigação. Yulia publicou um comunicado na terça-feira dizendo que ainda tem sintomas do envenenamento e negando a ajuda oferecida pela embaixada da Rússia em Londres. Yulia desmentiu também os comentários de uma prima que na semana passada afirmou que ela pretendia regressar ao país natal.