É favor aumentar o som. Os melhores discos da semana

Destaque para Suave, Sean Riley e Chloe X Halle

Tabaco sem filtro. Suave – “Português suave”

Todas as vidas de Nick Nicotine acabam no mesmo sítio: o rock’n’roll. Nos Act-Ups, na Nicotine Orchestra ou como Suave, a eletricidade é o fio condutor, mas nunca como em “Português Suave” o afeto foi um canal do amplificador, e a distorção mera circunstância ruidosa. Culpa de ser em português, o primeiro miniálbum do homem dos sete ofícios (é músico, tem um estúdio, uma editora, promove o Barreiro Rocks e é um dos grandes agitadores culturais da cidade) que até deixou de fumar. Em 20 minutos apenas se escreve a palavra amor de um disco luminoso permitido por um coração do tamanho do leito do Tejo. “O coração na soul e as ancas no rock’n’roll”, diz-se na introdução. Talvez os refrãos tenham a chama imensa da Motown. E as guitarras recuem aos criadores da ciência do rock’n’roll, mas o produto é um mini-LP – para usar linguagem de época – de hoje que podia ser do tempo de Vítor Gomes & Os Gatos Negros ou de Zeca do Rock, com um toque de twist para servir em chávena de chá dançante.

Sonho californiano. Sean Riley – California

Se Sean Riley e os Slowriders são um corpo inteiro de América elétrica, extenuada, galvanizada ou viajante, a Califórnia do timoneiro é um amputar de membros sem perder o coração e a cabeça. A história conta-se desta forma: há poucos anos, Afonso Rodrigues foi convidado para um concerto solo no Musicbox. Quando o parceiro de crime Legendary Tiger Man contou que iria concretizar o sonho americano de gravar “Misfit” no Rancho de La Luna, o amigo ficou com vontade de fazer uma visita. Em vez de cervejas artesanais, discos usados e guitarras, trouxe um miniálbum de 21 minutos gravado em quartos de motel de cidades fora do mapa. E o que fica da rota sonora de “California” é um reduzir ao mínimo denominador comum de voz e guitarra o livro de estilo de Sean Riley & The Slowriders, segundo as regras dos livros dylanescos. Não se escuta uma vontade de criar uma estrada paralela. Ou de reinventar uma personalidade. Apenas de captar um momento emocional de paz interior e reflexão servida pela folk. Com toda a sinceridade.

Raparigas crescidas. Chloe X Halle – The Kids are Alright

 

É o estado de graça de R&B entre as mulheres. SZA tem unanimidade crítica e auditório em partes idênticas, Jhené Aiko, Tinashe e Kehlani formam uma segunda linha de respeito, Kali Uchis, Kelela, Syd ou Sevdaliza usam-no para experimentar novas ciências rítmicas, e vozes como as de H.E.R. ou Jorja Smith aspiram com legitimidade a conquistar uma assoalhada por direito próprio. As irmãs Bailey foram descobertas por Beyoncé graças a uma versão de “Pretty Hurts” no YouTube e, acabadas de entrar na maioridade (Chloe tem 19 anos, Halle fez 18 há um mês), estreiam-se com um álbum que, apesar de esculpido com as regras da perfeição formal de Queen B, tem a espontaneidade e a força de juventude que um empacotamento fabril subestimaria. Ou seja, não é necessário separar o plástico onde ele não existe. Sim, Chloe e Halle são harmoniosas e afinadas. Têm uma imagem favorecedora. Uma madrinha influente e capaz de determinar decisões importantes. Mas “The Kids Are Alright” tem voz própria. E singles para ganhar lugares na fila dos relacionados.