José Sócrates disse esta tarde que os principais suspeitos da divulgação de parte dos interrogatórios numa reportagem da SIC são o juiz Carlos Alexandre e o procurador Rosário Teixeira. Segundo o ex-primeiro-ministro, acusado de corrupção no âmbito da Operação Marquês, os trabalhos jornalísticos que foram transmitidos só têm dois objetivos: o de aumentar audiências e a sua perseguição.
“A exibição televisiva de interrogatórios judiciais fez o processo da Operação Marquês subir a um novo patamar de infâmia. Ficámos agora a saber que as inquirições judiciais estão no mercado; que a dignidade das pessoas é objeto de negócio e artigo de contrabando; que os direitos individuais nada valem face á lei cega do lucro, das audiências e do espetáculo”, começou por dizer José Sócrates hoje numa conferência de imprensa no Hotel Tryp, na Expo.
Sócrates lamentou ainda que o MP só tivesse reagido 48 horas depois da transmissão das imagens – que não são públicas – anunciando que se vai constituir arguido no inquérito que foi instaurado.
“Não, não há nenhum interesse público nisto. O que há é apenas o interesse venal, a motivação política e, claro, a patifaria”, continuou, dizendo que é hora e parar de fingir que “não vemos o que está à vista de todos”: “A violenta campanha de difamação feita contra mim durante estes quatro anos sempre contou com a complacência, se não com a cumplicidade, do Ministério Público e do juiz de Instrução”.
É aqui que José Sócrates introduz aqueles que para si são os principais suspeitos da divulgação dos interrogatórios: “Por ação ou por negligência eles [juiz e procurador] são os autores morais dessas e das demais violações da lei que ocorreram”.
Mas se havia o interesse de o prejudicarem, Sócrates diz que isso fracassou. Assegura que as reportagens recentemente emitidas mostram a “injustiça da prisão, a vacuidade de todo o processo e a ausência de factos e de provas capazes de sustentarem as graves imputações que [lhe] fazem”.
Dizendo que já se referiu às diversas suspeitas que sobre si recaem, preferiu centrar-se apenas nas que dizem respeito à Parque Escolar e que foram transmitidas nos trabalhos recentemente publicados: “No interrogatório que todos puderam ver, é possível ouvir o sr. Procurador dizer que a acusação neste ponto nada tem a ver com nenhum concurso viciado, nem com o favorecimento seja de quem for, mas com a dimensão das adjudicações à empresa Lena que teria tido uma percentagem de 10,6% do total, e, portanto, muito acima da sua quota de mercado”. Um número que na altura deu como bom, mas que agora garante ser falso: “Não é 10,6%, é 3,7%, três vezes menos do que é afirmado. A acusação está baseada, portanto, num erro e numa falsidade.”
Além das violações do segredo de justiça, da sua prisão e da extensão dos prazos para conclusão da investigação, o antigo primeiro-ministro falou ontem da entrevista que Carlos Alexandre deu à SIC há mais de um ano. “[Pôs] em causa, perante os portugueses, a isenção da justiça a que está vinculado e os seus deveres de imparcialidade no processo de inquérito. A história deste processo é a do frontal e continuado desrespeito pelos direitos individuais previstos na lei”.
José Sócrates admite que para muitos a abertura deste novo inquérito relativo às imagens da SIC pode ser visto como mais “uma atitude de fingimento e de hipocrisia”, mas o ex-primeiro-ministro considera que é preciso dar mais esta oportunidade às instituições “para que parem com os abusos […] e possam garantir que os inquéritos policiais não se transformam em caçadas policiais, destinadas a obter condenações sem justo processo, sem defesa e sem julgamento”.
“A minha defesa vai constituir-se como assistente no processo que o MP abriu, por forma a garantir que tudo será feito para que os autores e cúmplices destes crimes respondam pelos seus atos”, anunciou.
Sobre o facto de Carlos Alexandre ter decidido não decretar a nulidade das escutas telefónicas com vírus informático, José Sócrates não se alongou muito, mas disse ser escandaloso que o MP tenha entregue as escutas com vírus e tenha sugerido que a culpa era dos escutados.