É terça-feira, o sol está a brilhar e o tempo está agradável. À porta do centro de reabilitação respiratória, em Lisboa, os ponteiros do relógio marcam as 14h40 quando esta se abre.
O espaço é amplo e o dr. António Carvalheira Santos, responsável pelo programa de reabilitação aponta para o corredor que dá acesso à sala de educação, uma sala usada para fazer reuniões e para ensinar os doentes a viver com a sua doença. Está equipada com uma mesa branca, um quadro e várias cadeiras, onde se senta e começa por explicar que em Portugal são escassos os centros de reabilitação respiratória e que o nosso país está muito mal servido a nível público, para conseguir ajudar os doentes respiratórios crónicos a melhorarem a sua qualidade de vida.
“Infelizmente isto é uma coisa privada, não há aqui nenhum investimento público. Nós temos algumas ligações a determinados seguros mas ao Serviço Nacional de Saúde não”, refere o responsável, admitindo que este tipo de serviço deveria ser alargado ao setor público.
Falta de uma rede de reabilitação A realidade da reabilitação em Portugal é preocupante. António Carvalheira Santos explicou ao i que “menos de 2% dos doentes que deviam fazer reabilitação”, estão a fazê-la, classificando o nicho como um “grupo de privilegiados”, mas que Portugal ainda está muito abaixo da média europeia, que se fixa nos 30%. “O que é que isto significa?”, questionou, acrescentando que “os nossos doentes estão mal servidos e o não investir nesta área tem implicações graves quer do ponto de vista social, quer do ponto de vista económico”.
Apesar da Direção-Geral de Saúde ter normas que ditam que os doentes devem estar integrados em programas de reabilitação e qual a medicação mais adequada para ser prescrita, a realidade é completamente diferente. “Enquanto não houver da parte do estado esta possibilidade de alargamento destes centros de proximidade não há possibilidade de tratar de uma forma adequada este grande número de doentes que tanto sofrem”, frisou o responsável, que considera que a rede de reabilitação a nível nacional nunca foi encarada como deveria ser e que “nunca foram dados passos significativos nessa direção” para combater a falta de oferta.
Em Portugal, só com Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC) existem cerca de 800 mil doentes, mas apenas 2% está a receber tratamento. Esta escassez de oferta, segundo o responsável poderia ser combatida com a criação de “uma rede nacional de reabilitação respiratória”.
António Carvalheira Santos é o responsável pelo programa de reabilitação do centro | FOTO: Mafalda Gomes
O tratamento ajuda os doentes a terem uma melhor qualidade de vida, menos incapacidade e a integrarem-se melhor a nível social e familiar e, é isso mesmo que este centro faz, pois em média, por dia são tratados 30 doentes na unidade.
O tratamento é composto por três pilares: avaliação e controlo clínico, treino de exercício físico e educação. No programa, os doentes são ensinados a conviver com a doença e fazem vários exercícios, no ginásio do centro, que está equipado com várias máquinas. O centro tem ainda um corredor amplo, com 20 metros, que segundo o responsável serve para os doentes fazerem a prova de marcha. No início do tratamento, a prova é crucial para avaliar as cargas a que os pacientes podem ser submetidos. A prova é ainda feita no final da reabilitação para saber se o paciente sofreu alguma melhoria com a reabilitação.
Viver com a doença
O tenente coronel João Martins, tem 61 anos, está reformado e foi diagnosticado com DPOC em 2014, quando sofreu um colapso cardiorespiratório no Hospital das Forças Armadas.
Depois de um ano sem conseguir fazer as atividade do dia-a-dia sem perder o fôlego, a sua médica aconselhou-o a visitar o centro de reabilitação. João marcou uma visita, gostou do que viu e decidiu que iria começar a fazer a reabilitação. Depois de ter sido avaliado começou a ir três vezes por semana ao centro. Durante toda a manhã fazia exercícios físicos e respiratórios e, além da componente de treino, também foi ensinado a lidar com a sua doença.
O centro “tem uma equipa muito completa”, afirmou, acrescentando que foi acompanhado por todo o tipo de profissionais de saúde, que o ajudaram a controlar a doença e que lhe deram capacidade para fazer as atividades do quotidiano sem se cansar rapidamente.
Todos os doentes são acompanhados por uma equipa médica durante o tratamento | FOTO: Mafalda Gomes
“Eu não conseguia fazer quase nada. Custava-me imenso levantar, fazer a barba, tomar banho, descer e subir escadas, andar na rua (…) Tinha uma dificuldade tremenda em fazer quase tudo”, descreve ao i. No entanto, com o desenvolver do tratamento aprendeu a viver com a DPOC e já não tem vergonha de andar com o tanque de oxigénio quando sai de casa. “Não tenho problemas em ir para a rua com o meu aparelho”, conta.
Agora, vai ao centro periodicamente para ser avaliado e verificar como está a sua capacidade, mas as mudanças são notórias: antes não conseguia fazer qualquer atividade sem perder o ar e agora costuma fazer “três a quatro vezes ginásio por semana” e ainda hidroginástica.
“Faço ao meu ritmo, mas faço uma vida completa. Essa é a grande diferença”, sublinhou.