Dois cremes antirugas fizeram esta quarta-feira o que um mestrado aparentemente forjado não fez. Um pequeno roubo de supermercado de há sete anos provocou a demissão de Cristina Cifuentes, a presidente da comunidade autonómica de Madrid, que há semanas vinha evitando a saída causada pelo escânadlo do seu título universitário. Que a governante espanhola estava prestes a abandonar o importante cargo, muitos já o antecipavam. Mas que o faria como esta quarta, ninguém o supunha.
O jornal espanhol “OK Diario” revelou de manhã uma gravação de câmaras de vigilância datada de 2011, altura em a governante do PP era vice-presidente da comunidade, e na qual ela é aparentemente apanhada com dois cremes roubados a um supermercado. No vídeo, Cifuentes é conduzida a uma sala da loja com um guarda que vasculha os seus pertences e investiga os boiões. A gravação termina com Cifuentes contando na sua carteira o valor dos boiões: 40 euros.
A dirigente do PP demitiu-se ao fim da manhã. Tinha já sobre si uma moção de censura comunitária que quase certamente a obrigaria a partir e que está relacionada com o mestrado forjado na Universidade Rey Juan Carlos, onde não foi às aulas, foi aprovada administrativamente e onde o seu trabalho de fim de curso parece ter sido avaliado com assinaturas falsas. O caso está a cargo do Ministério Público.
Cifuentes, avançava esta quarta o “El País”, planeava abdicar momentos antes de votada a moção de censura do PSOE e fazer-se substituir por alguém do seu partido. A moção, que ainda não tinha data marcada mas já contava com o apoio do Ciudadanos, o partido de centro-direita que viabiliza o governo minoritário de Rajoy, parece neutralizada.
“Fez o que tinha de ser feito”, reagiu esta quarta-feira Mariano Rajoy, nas mãos de quem Cifuentes colocou o seu futuro político assim que explodiu a bomba do mestrado forjado – que entretanto já atingiu outros governantes espanhóis. A presidente da comunidade de Madrid reiterou ainda na semana passada que apenas se demitiria caso o presidente do governo o exigisse.
Disse esta quarta, porém, que se afastava não por considerar que errou – discursou sorridentemente e não assumiu culpa no caso na universidade ou do supermercado – mas porque não aceita a exposição mediática. “Aguentei mais de 34-35 dias de exposição permanente. O que acaba de acontecer cruzou uma linha”, disse em Madrid, explicando aos jornalistas que o caso dos cremes foi um “erro” pelo qual já foi chantageada antes.
Segundo diz, levava os cremes nos bolsos enganada, pensando que já estavam pagos. Assim que os guardas lhe chamaram a atenção, garante, afiançou os 40 euros em dívida. “Não quero magoar a minha família, que é a razão pela qual tomo esta decisão – para que não continuem neste calvário. É melhor para os madrilenos e para o meu partido.”
A justificação de Cifuentes, no entanto, não corresponde à versão do furto que esta quarta-feira avançava alguma imprensa. Segundo o “El País”, que cita fontes policiais da capital espanhola, Cifuentes recusou-se inicialmente a pagar os dois boiões que levava nos bolsos. Afirmou que eram seus e que entrara no supermercado com eles. Chamada a polícia, Cifuentes evita a detenção dispondo-se enfim a pagar os 40 euros dos cremes antirugas.
“Quem nunca acionou um alarme de supermercado?”, chegaram ainda a lançar fontes próximas da presidente da comunidade durante a manhã, antes de estar decidida a demissão.