A meio da manhã de ontem era noticiado que a Comissão Europeia (CE) revelaria durante o dia a decisão de avançar com o TGV entre Évora, em Portugal, e Mérida, em Espanha. De imediato o Governo veio a público dizer que esta não será uma ligação de alta velocidade de passageiros, mas sim de mercadorias, admitindo, no entanto, que a ligação entre os países ibéricos em comboio de alta velocidade – passageiros e mercadorias – faz parte de um projeto mais global europeu.
A meio da tarde, Bruxelas esclarecia que a ligação de Portugal a Espanha em velocidade ferroviária é uma “visão, uma orientação”, mas na manhã, numa conferência sobre rede de transportes transeuropeia, em Liubliana, Eslovénia, a CE revelara um documento que realçava a importância do troço Évora-Mérida: “O Porto de Sines estará ligado de forma mais eficiente ao eixo de mercadorias Sines-Elvas-Madrid-Paris”.
A nova linha ferroviária que ligará Évora a Mérida vai ser construída no âmbito dos corredores ferroviários transeuropeus, que tanto podem abarcar alta velocidade como ferrovia convencional, e está no mesmo corredor em que foi projetada a construção do TGV em 2009.
O concurso público foi lançado em março e as obras deverão começar em 2019, para um trajeto que coincide com uma das linhas previstas no projeto de alta velocidade do Governo de José Sócrates e cuja construção foi, em 2012, adiada por um período de 30 a 50 anos.
O ministro do Planeamento e Infraestruturas garantiu que a decisão de Bruxelas é sobre o “alto desempenho para mercadorias” e não há qualquer investimento atual em comboio de alta velocidade para passageiros. Segundo Pedro Marques, o “projeto inicialmente pensado teria três linhas, duas delas estariam dedicadas à alta velocidade de passageiros e uma à ferrovia de mercadorias”, mas a “linha que está em implementação agora, desse projeto maior, é a ferrovia de mercadorias”.
De acordo com o ministro, está-se a falar, sobretudo, de uma “linha nova, que permitirá diminuir significativamente o transporte desde os portos portugueses até Espanha, até Mérida ou até Madrid”.
Antes, a comissária europeia dos Transportes tinha revelado o compromisso assumido por Lisboa e de Madrid em resolverem a questão dos ‘missing links’ (elos de ligação) nas vias ferroviárias. Em conferência de imprensa na Eslovénia, Violeta Bulc revelou que acabava de sair de uma “reunião importante e especial com os ministros dos Transportes de França, Espanha e Portugal, que concordaram em avançar com os ‘missing links’ dos corredores […] que vão servir não apenas os países, mas as necessidades da União Europeia (UE)”.
Pedro Marques notou que este investimento está a avançar em articulação com Espanha e a UE. “O que posso eventualmente compreender desse tipo de declarações é que este projeto faz parte de um projeto mais global europeu dos corredores ‘core’, que inclui componente de mercadorias e de alta velocidade de passageiros”, sublinhou.
Na conferência de Liubliana, capital eslovena, a CE revelou um draft (esboço) no qual se lê que o futuro troço ferroviário Évora-Mérida é um “importante elo em falta na ligação ferroviária entre Lisboa e Madrid”.
Questionada pela agência Lusa sobre o ‘missing link’ na conexão de alta velocidade ferroviária entre Lisboa e Madrid, uma fonte de Bruxelas afirmou que o cenário em Portugal é “uma visão, uma orientação”. Sobre se a alta velocidade chegará a Portugal, afirmou que “talvez um dia”.
O documento divulgado na conferência sobre a rede de transportes transeuropeia fala sobre a importância do troço entre Évora e Mérida. “O Porto de Sines estará ligado de forma mais eficiente ao eixo de mercadorias Sines-Elvas-Madrid-Paris e a secção transfronteiriça tratará (do inglês ‘will adress’) ‘missing link’ em falta na conexão de alta velocidade ferroviária entre Lisboa e Madrid”.
Confusão da comissão Citado pela imprensa económica, o Ministério do Planeamento e Infraestruturas refere que sobre o traçado que está a ser construído, “a Comissão Europeia está a fazer uma grande confusão porque o troço que estamos a construir entre Évora e Elvas vai complementar o corredor de alta velocidade”, garantindo que não é um TGV. “Servirá apenas para transporte de mercadorias e não terá capacidade para evoluir para TGV”, refere.
Já em mais de uma ocasião o Governo veio desmentir que a recuperação do TGV está em cima da mesa. Ainda em fevereiro, o primeiro-ministro António Costa afirmava que “a alta velocidade é um tema tabu na política portuguesa e vai sê-lo por muito tempo”.
Mas no início de março o projeto de alta velocidade em Portugal foi lançado com o investimento anunciado para a construção do corredor ferroviário sul que ligará os portos de Lisboa e de Sines a Espanha, que será concretizada com a utilização de travessa polivalente e bitola ibérica. “A utilização da travessa polivalente permitirá a eventual migração para a bitola europeia caso assim seja entendido no futuro”, revelou na altura ao semanário “Sol” o ministério tutelado por Pedro Marques, acrescentando que “quer ao nível técnico, quer ao nível político, Portugal e Espanha têm concordado em avançar de forma coordenada na modernização da respetivas redes ferroviárias, nomeadamente no que respeita à questão das bitolas e da utilização da travessa polivalente”.
Mas, ao todo, serão investidos no âmbito do Plano Ferrovia 2020 dois mil milhões de euros nas obras que se irão estender ao longo de 1200 km de via em alta velocidade. E será feita a ligação entre Sines e Poceirão – uma localização que beneficia da proximidade do futuro aeroporto do Montijo, do porto do Barreiro, de Setúbal e de Lisboa. Todas as ligações serão feitas em alta velocidade.
Este anúncio já tinha sido feito em Espanha pelo presidente da Junta da Extremadura. O projeto é um comboio de mercadorias e de passageiros “com uma velocidade suficiente para que os tempos médios sejam comparáveis ao que queremos”, estando a ser construídas em “plataformas AVE”, ou seja, de alta velocidade, explicou na altura Guillermo Fernández Vara.
Também na altura Violeta Bluc lembrava que “Portugal precisa de ligações ao Mercado Único e encorajamos que esta conectividade seja uma prioridade entre os corredores referenciados”.