Janelle Monáe – “Dirty Computer”. Ok Computer!
Um álbum de Janelle Monáe não é um álbum. É um banquete de ideais. E uma tese sobre o estado do mundo. Ou da nação americana. Com influxos de feminismo, política pura e dura. E festa, porque a música tem de continuar e que melhor forma de atrair o intelecto do que atrair o corpo? “Metropolis: Suite I (The Chase)” seguia Fritz Lang em banda sonora inteligente e adulta para os 22 anos de Monáe. “The ArchAndroid (Suites II and III)” ampliava esse corpo musical a referências bíblicas da pop como sua omnipresença Prince, David Bowie e os Outkast. “The Electric Lady” era condomínio de luxo da negritude com Prince, Stevie Wonder, Erykah Badu, Solange (pré-”A Seat In The Table”), Miguel e Esperanza Spalding. É entre camadas, dimensões e mundos que a reencontramos em “Dirty Computer”, talvez a mais audaz opus da sua obra. O reconhecimento de um sistema operativo complexo e atento aos sinais ideológicos da América e à batalha homem-máquina, sem conservadorismos bacocos e sob o olhar atento de Prince.
Beach House – “7”. Sonho interrompido
Talvez os Beach House tenham essa habilidade corajosa de se reinventar a cada novo episódio. De evoluir na continuidade. Mas continua a faltar-lhes o nervo que fez, por exemplo, dos Mazzy Star um dos paraísos perdidos dos anos 90. Sim, Victoria Legrand e Alex Scally construíram uma parede de mistério e “7” adensa um nevoeiro, ora procurando cortinas eletrónicas, ora explorando o que está para lá dos postos fronteiriços do country. Quando os Beach House se desprendem dos clichés, como na magnífica “Dark Spring” – excelente abertura para efeitos de posto de escuta -, suspeita-se que enfim os Beach House encontram uma praia mas “7” acaba por cair na monotonia e nos lugares comuns de uma melancolia forçada à qual faltam arrepios. O problema deste e de outros álbuns dos Beach House é esse: é uma história sem sal, verídica mas distante do coração, porque faltam ideias brilhantes para evidenciar os argumentos que se pressentem mas continuam adiados à espera que o pano da encenação caia.
Confidence Man – "Confidence Man". Levanta-te e ri
“Não há idiotice suficiente na música de dança”, reclamava a vocalista Janet Planet, pseudónimo selvagem de um bando de sadios irresponsáveis. Se se pensar que uma máquina engoliu a vida de Avicii, a reclamação é manifestamente exagerada mas se voltarmos à época do glitter e do electroclash – em parte, precedente do fenómeno Scissor Sisters – então há um fundo de seriedade na declaração. “Confidence Man” não é para levar a sério. Cumpre a missão hedonista de pôr o corpo inteiro a dançar, da ponta dos pés aos neurónios. Tem melodias irresistíveis de Jane Planet, algures entre os planetas do B 52’s, o escárnio de Tiga e o deboche dos Scissor Sisters. Há sintetizadores espaciais a descolar a toda a hora. Linhas de baixo gordas como no big beat dos Basement Jaxx e Fatboy Slim. House de escola vogue. Euforia, bar aberto, linhas sobre a mesa, gnomos e duendes. Um universo paralelo, já conhecido é certo, contestatário do real e cinzento. “Confidence Man” é de uma eficácia extrema e bate-se ao nível dos melhores humoristas.