Com a entrega do Prémio a Bob Dylan, em 2016, a Academia Sueca foi acusada de buscar protagonismo, e mesmo escudada pelo fervor de todos aqueles fãs que viram na atribuição ao músico do máximo galardão literário como um evento ao nível da conversão do Imperador Constantino ao cristianismo, exaltando a vontade daquele organismo de cortar com o conservadorismo típico do meio literário, hoje não tem como evitar essa escolha como um marco, uma linha divisória entre um passado em que a Academia se resguardava numa grande discrição e a sua nova vida enquanto protagonista de sucessivos episódios mediáticos.
No turbulento choque em cadeia que foi provocado depois de, em novembro do ano passado, uma reportagem no Dagens Nyheter, o diário mais vendido na Suécia, ter revelado as acusações de abusos sexuais contra Jean Claude Arnault, o marido da poeta Katarina Frostenson, até ali membro da Academia que se deixou enredar numa luta de poder interna entre duas facções no seu seio. O maior escândalo da sua história levou assim a uma série de afastamentos, o que obrigou o Rei da Suécia a intervir, anunciando que iria alterar os estatutos para permitir a eleição de novos membros. Foi uma medida necessária de modo a ultrapassar o impasse criado pela falta de quórum. Mas vai ser preciso tempo para retomar alguma normalidade nos trabalhos da Academia, e, assim, pela primeira vez em 75 anos o prémio não será atribuído devido a um escândalo. Anteriormente, o prémio tinha já sido retido em 1914, 1918, 1935, 1940, 1941, 1942 e 1943.
Depois de o rei sueco e a fundação que financia a Academia terem assumido publicamente que tinham perdido a confiança nesta, a medida foi anunciada na quinta-feira depois de uma reunião em que os membros restantes daquele organismo discutiram o plano de atuação de forma a mitigar as consequências do escândalo sexual. Enquanto espera reganhar a confiança pública, na nota que emitiu, a Academia admite que este escândalo coloca em causa a sua reputação, mas garante que não terá impacto nas restantes categorias do Nobel este ano.
«Os membros da Academia estão claramente atentos à atual crise de confiança que exige medidas a longo prazo e um forte trabalho para a mudança. Nós achámos necessário este tempo para recuperar a confiança na Academia antes do próximo laureado poder ser anunciado», declarou Anders Olsson, secretário interino da academia, citado pelo The Guardian.