A aliança de partidos timorenses liderada pelos ex-presidentes Xanana Gusmão, à cabeça, e, um posto abaixo, Taur Matan Ruak, venceu as eleições antecipadas deste fim de semana e conquistou uma maioria absoluta capaz de pôr um fim à paralisia política do último ano. Os resultados parciais divulgados ontem dizem respeito a praticamente os valores finais: com 99% dos boletins registados, a recém-formada Aliança de Mudança para o Progresso, a AMP, somava 51,29% dos votos e tinha já assegurados 34 dos 65 assentos parlamentares em jogo. A Fretilin, chefiada pelo primeiro-ministro Mari Alkatiri, contava 34,27% dos boletins: quase mais cinco pontos que os conquistados nas eleições do ano passado, mas, ainda assim, insuficientes para derrotar Xanana e Matan Ruak.
Alkatiri passa para a oposição com uma mão muito mais fraca que a que tinha em julho do ano passado. Xanana, por sua vez, regressa a primeiro-ministro com uma aliança nova, que até recentemente poucos anteviam. E uma maioria também. É o começo de uma nova arquitetura do poder timorense. Se Xanana e Alkatiri vinham dividindo o poder desde 2014, formando acordos entre os dois principais partidos, Fretilin e CNRT, que os levaram a conquistar quase o mesmo resultado nas eleições do último verão, das quais surgiram separados por apenas 0,2 pontos, agora as alianças são outras: Xanana é hoje parceiro de Matan Ruak e de Jose Naimori. Alkatiri tem do seu lado apenas o Partido Democrático, que ontem registava 7,95% dos votos, uma queda em relação aos 9,79% conquistados em 2017.
A quebra deu-se no rescaldo das últimas eleições. A Fretilin superou o CNRT em 0,2 pontos e parecia guiada para um novo governo de grande coligação com o CNRT de Xanana, naquele que seria mais um indício da nova “democracia de consenso” timorense. Mas Alkatiri não abriu discussão interna sobre o posto de primeiro-ministro, e Xanana afastou-se. O presidente Francisco “Lu Olo” Guterres, próximo da Fretlin, não conseguiu convencer Xanana, e o histórico guerrilheiro entregou-se à oposição. Alkatiri fez aliança com o Partido Democrático e iniciou um governo minoritário que em quase um ano nada conseguiu aprovar de relevo. A incerteza deu em alguns episódios de violência. Em janeiro, quando as autoridades fizeram rusgas à casa de Xanana, Zenilda, o CNRT passou à ofensiva e acusou o governo de manipular a polícia para proveito próprio. Sete dias depois, Lu Olo convocou eleições antecipadas.
Coligação frágil
O isolamento de Alkatiri pode ser temporário. A coligação dos ex-presidentes timorenses viu-se forçada a um certo contorcionismo diplomático e de agenda para sarar feridas recentes. A aliança, por outras palavras, é frágil. Não escasseiam indícios. Em fevereiro de 2016, então presidente, Matan Ruak acusou Xanana e Alkatiri de programas de favorecimento familiares semelhantes aos do antigo ditador indonésio Soherto. Xanana devolveu uma medalha oferecida pela presidência e criticou ferozmente Matan Ruak. No mês passado, porém, Matan Ruak desvalorizou as divisões: “Nós temos uma relação emocional, apesar das diferenças. E não é só de agora. Mas o respeito, o amor, o carinho entre nós é inseparável. Isso foi uma das grandes razões para ganhar a guerra, porque de outra forma teríamos partido o país”, disse à Lusa.
A Fretilin venceu as eleições no leste do país e nas principais comunidades no estrangeiro: Portugal, Austrália e Reino Unido. A AMP triunfou no centro da Coreia do Sul e na maioria dos municípios, incluindo Dili. As eleições, acompanhadas por observadores internacionais, decorreram sem violência ou reclamações. “Esta vitória não é um prémio, mas sim um mandato que o povo nos concedeu para trabalharmos em seu nome”, afirmava ontem um responsável da AMP à Reuters, sob anonimato e incentivando os apoiantes a celebrar nas ruas. “Acredito que estas eleições serão o fim do impasse”, disse Xanana no sábado, depositando o voto.