O arcebispo de Adelaide, Philip Edward Wilson, foi ontem considerado culpado do encobrimento de abusos sexuais de crianças e pode ser condenado a uma pena que vai até dois anos de prisão. Trata-se de uma decisão histórica que marcará outros casos do género. Wilson, de 67 anos, é o mais alto membro da hierarquia católica a nível mundial a ser condenado por cumplicidade em casos de pedofilia.
O escândalo envolvendo crimes de abusos sexuais de crianças por parte de membros do clero ameaça atingir ainda mais figuras da Igreja Católica da Austrália. O cardeal George Pell, que o papa Francisco tinha nomeado como seu braço direito para a área das Finanças, teve de deixar o cargo temporariamente para se defender em tribunal num processo por abuso sexual de menores.
No tribunal de Newcastle, 160 km a norte de Sidney, o juiz Robert Stone disse perante uma sala de audiências completamente cheia que considerava a acusação como provada. O arcebispo sabia que o padre pedófilo James Patrick Fletcher tinha atacado sexualmente Peter Creigh, quando este era um acólito de dez anos, e não tinha comunicado à polícia.
Peter Creigh contou em tribunal que em 1976, quando tinha 15 anos, disse a Wilson o que tinha acontecido em 1971 e voltou a insistir meses depois e ele não fez nada. Fletcher acabaria por ser condenado em 2004 por violar outro acólito, acabando por morrer na prisão dois anos depois.
O arcebispo, em comunicado, mostrou-se “desapontado com a decisão”, acrescentando que vai estudar com os seus advogados o que fará a seguir. Wilson tentou quatro vezes nos últimos três anos que o processo fosse arquivado.
Em tribunal negou que dois acólitos lhe tivessem contado que tinham sido abusados sexualmente por um padre: “Não me parece que pudesse esquecer-me disso”, afirmou, sublinhando que se tivesse conhecimento dos casos teria informado os seus superiores. Acrescentando que não tinha qualquer conhecimento de que o padre Fletcher abusasse de crianças.
Uma investigação de cinco anos chegou à conclusão o ano passado que “dezenas de milhares de crianças” foram abusadas sexualmente em instituições da Austrália durante décadas, incluindo igrejas, escolas e clubes desportivos.
Más notícias para Francisco É mais uma má notícia para o papa Francisco, depois de na semana passada todos os bispos chilenos, 34 no total, numa iniciativa inédita, terem colocado o seu lugar à disposição do Vaticano, depois de terem sido acusados pelo sumo pontífice de encobrir e destruir provas.
“Pusemos os nossos cargos nas mãos do Santo Padre e vamos deixá-lo decidir livremente sobre cada um de nós”, referiram os bispos em comunicado, onde aproveitam para pedir desculpa ao Chile e ao papa.
A Santa Sé abriu uma investigação às alegações de que o bispo Juan Barros teria escondido os casos de abusos sexuais de menores do padre Fernando Karadima.
Em abril, a polícia do Vaticano já tinha detido um antigo diplomata da Santa Sé por ter na sua posse pornografia com menores.
Para os críticos de Francisco, todos estes casos, envolvendo até figuras muito próximas do papa (como Pell, que levou para o Vaticano para tratar das finanças; como Barros, de quem sempre foi muito próximo e defendeu publicamente), mostram que a “ação decisiva” que o chefe da Igreja Católica pediu em 2013 contra a prática de encobrir os casos de abusos sexuais foram apenas palavras.
O painel especial criado em 2014 para analisar as denúncias de abusos sexuais de crianças envolvendo membros da igreja – a Comissão Pontífice para a Proteção de Menores – teve de ser renovado em fevereiro, depois de dois dos seus membros, antigas vítimas de abusos sexuais, se terem demitido em protesto pela falta de reformas e a obstrução ao trabalho do painel por parte de membros da alta hierarquia católica. O cardeal americano Sean O’Malley foi confirmado como líder do painel, que ganhou mais nove membros, alguns deles vítimas de abusos quando crianças, que se somaram aos sete membros que transitaram do anterior. O painel é agora composto por oito homens e oito mulheres.
Já em 2011, o papa Bento XVI dera instruções aos bispos de que qualquer denúncia de abusos sexuais de menores devia ser imediatamente transmitida à polícia. Uma prática bem diferente da que foi usada muitos anos pela Igreja Católica que foi a de silenciar as denúncias (chegando a ameaçar os denunciantes), lidar com os casos internamente, transferindo indefinidamente os padres acusados.