Uma grande maioria do eleitorado irlandês aceitou a alteração constitucional que permitirá criar leis que despenalizem ou legalizem o aborto num dos países europeus mais conservadores no que diz respeito à interrupção voluntária da gravidez e aos direitos das mulheres.
Na tarde deste sábado, o voto favorável à alteração constitucional rondava os 67,3%, num momento em que 37 das 40 regiões eleitorais já estavam contadas. O referendo ocorreu na sexta-feira, mas os resultados apenas serão conhecidos ao fim do dia deste sábado.
“Aconteceu uma revolução silenciosa”, afirmou este sábado o primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar, à medida que os votos eram contados e o desfecho se mostrava inevitável. “As pessoas decidiram. Decidiram que precisamos de uma Constituição moderna para um país moderno”, lançou.
“Este voto equivale a rejeitarmos uma Irlanda que trata as mulheres como cidadãs de segunda classe”, afirmou, esta tarde, Orla O’Connor, codiretora da campanha “Juntos pelo Sim”. “Isto trata-se de as mulheres finalmente reivindicarem o seu lugar justo na sociedade irlandesa.”
Ao fim da manhã deste sábado publicaram-se as sondagens realizadas à boca das urnas: 69% dos irlandeses defendeu abrir a porta a uma Constituição que permite o aborto, revelaram o “The Irish Times” e a estação RTÉ. Os resultados reais encaminham-se para estes valores.
A influência da Igreja Católica na Irlanda vem diminuindo visivelmente. Em 1995, o referendo constitucional que abriu as portas à legalização do divórcio na Irlanda ilustrou um país dividido no que diz respeito a temas de identidade social e religiosa: o “sim” venceu então por uma margem muito reduzida, 50,28% contra 49,72%.
Dez anos depois, em 2015, porém, no referendo à alteração constitucional que permitiria o casamento homossexual , o “sim venceu” por 62%. Estava dado o primeiro grande sinal de progressismo social na Irlanda. Hoje, três anos depois, o primeiro-ministro irlandês é abertamente gay.
“Pensei sempre que existiam duas Irlandas”, afirmava este sábado o humorista irlandês David O’Doherty, em declarações ao diário britânico "Guardian". “Mas essa ideia morreu ontem. Morreu já com a igualdade do matrimónio, mas morreu de verdade ontem.”