Itália está prestes a ter novo Governo. Os dois partidos de índole populista – Movimento 5 Estrelas (M5E) e Liga Norte (LN) – chegaram a acordo e viram a sua proposta de primeiro ministro ser aceite pelo presidente. Depois da confirmação ministerial, apenas restarão as moções de confiança em ambas as câmaras do parlamento.
As expectativas já eram baixas – dificilmente sairia destas eleições um governo que atacasse os vários problemas estruturais naquela que é a terceira maior economia europeia com o segundo maior rácio de dívida pública. Porém a combinação dos votos a Sul para o M5E, e a norte para a LN, possibilitaram uma união entre as duas forças políticas mais imprevisíveis, o que tem assustado os investidores em ativos italianos. A intenção de combinar maior despesa pública com redução de impostos afigura-se incomportável para os cofres e compromissos italianos. Perante estes receios, os investidores têm-se afastado das obrigações italianas, movimento que se tem notado em particular nos spreads de risco. O spread italiano, que habitualmente espelha o espanhol, descolou deste último em antecipação ao processo eleitoral e pós-resultados implodiu para níveis que excedem o das obrigações portuguesas – tal fenómeno não se via desde um fugaz período de 2006.
Mas olhemos com maior atenção para as propostas principais deste programa que promete expansão fiscal na ordem dos 7% (!) do PIB. A LN propõe uma radical simplificação de IRS para apenas dois escalões – 15 e 20% – e descida do IRC; o M5E junta o Rendimento Mínimo Garantido (RMG), e pelo meio a reversão da última reforma das pensões. Quadrar o círculo da descida de impostos com o RMG, um curioso paralelo da vincada divisão Norte-Sul, será ainda mais complicado por via do Artigo 81 da Constituição que obriga à neutralidade orçamental de novas políticas…
No caso do RMG, se o mesmo vier para ser a consolidação da multiplicidade de prestações e apoios sociais fragmentados, representará uma brutal simplificação do sistema e provável melhoria do grau de eficácia no combate à pobreza. Quanto a impostos, a redução poderá ser parcialmente financiada por uma simplificação das várias deduções fiscais, contudo, é interessante lembrar a experiência positiva que vários países de leste – Rússia em 2001 e Bulgária em 2008 – tiveram com medidas semelhantes: no ano seguinte viram as respetivas receitas fiscais aumentarem mais do que o esperado, provavelmente devido ao maior incentivo que o novo regime induz no pagamento voluntário. Porém, existe também uma via de financiamento menos benigna sugerida pelo programa, que toma a forma de emissão de certificados de dívida para pagamentos do fisco. Esta ideia amenizaria as necessidades de liquidez mas representaria a fundação de uma quasi-moeda paralela, que transacionaria a desconto e abriria a porta a efeitos distributivos graves por via da negociação dos mesmos entre contribuintes.
Nesta fase está tudo em aberto. Temos populistas a governar Itália – certo. Porém que tipo de populistas irão ser? Tentarão eles quebrar o status quo por via de uma radical simplificação do complexo sistema fiscal e social italiano? Nesse caso arriscariam vir a ser… reformistas. Mais do que vontades pessoais, o que ditará o futuro de Itália e da Europa será a durabilidade do atual ciclo de crescimento económico. Ele determinará de que tipo serão estes populistas.
*Gestor de portfolio multi-ativo no BiG – Banco de Investimento Global