Confirma-se a previsão: os terrenos sinalizados como prioritários para limpeza florestal não foram todos limpos dentro do prazo, que termina hoje. As autarquias e os proprietários não conseguiram cumprir o calendário do governo e ficaram com terrenos prioritários por limpar, havendo concelhos com metade da área sinalizada por tratar.
E este incumprimento não é exclusivo dos proprietários privados e das autarquias. Há casos de terras que pertencem ao Estado e que também não foram limpas, denunciam ao i alguns autarcas.
Nem o governo nem a Associação Nacional dos Municípios Portugueses recolheram dados que permitam fazer um balanço da medida lançada em janeiro deste ano pelo executivo para prevenir incêndios. Mas o i contactou vários autarcas que traçaram um retrato do seu concelho. Em Viseu, onde há sete mil hectares de terreno por limpar, dos quais mais de mil hectares são de responsabilidade direta da autarquia, das 16 freguesias prioritárias ficaram por tratar “mais de metade”, diz ao i o presidente da Câmara Almeida Henriques. “Nem a meio do trabalho vamos e se olharmos para os privados se forem a metade será muito”, sublinha ainda o autarca.
“Desde o início que disse que esta era uma missão impossível”, lamenta Almeida Henriques, que tem garantido às freguesias tratores para a realização da limpeza e tem recorrido a empresas e a uma equipa de sapadores para tratar “o máximo” de terrenos. Agora, explicou ainda ao i o autarca, há que limpar as zonas identificadas “como mais críticas, que é o caso da Colina Verde, um bosque que fica no meio da cidade e que não está limpo”, sendo “um risco iminente”.
O mesmo cenário repete-se no concelho de Mação. “Muito foi feito, é inegável, mas não se fez tudo e há situações que não estão de acordo com aquilo que devia ter sido feito e que está no espírito da lei”, diz ao i o presidente da Câmara de Mação, Vasco Estrela. “Era uma imensidão” de área por limpar, refere ainda o autarca, que das 122 freguesias do seu concelho tinha 39 localidades sinalizadas como prioridade máxima. “Não conseguimos de todo chegar a todo o lado”, remata Vasco Estrela lamentando que a lei tenha sido aplicada de igual forma e com os mesmos prazos para os 308 municípios, não prevendo regras diferentes que atendessem à área de limpeza de cada concelho. “Ter 20 localidades ou 120 não é a mesma coisa”, sublinha Vasco Estrela.
O coordenador dos autarcas social-democratas, Álvaro Amaro, presidente da Câmara Municipal da Guarda, traça o mesmo retrato ao i, reconhecendo que “houve uma grande sensibilização e é notório um maior cuidado” com a limpeza dos terrenos mas, seguramente, “não foi limpo tudo o que havia por limpar”. Álvaro Amaro deixa um apelo: “espero que haja compreensão e tolerância por parte das autoridades”.
Já o representante dos autarcas socialistas, Rui Santos, presidente da Câmara de Vila Real, diz que “nunca foram limpos tantos terrenos como este ano” e a situação “é muito melhor que há um ano”. Mas o autarca alerta que os últimos dias de chuva fizeram com que a “vegetação tenha crescido novamente a um ritmo muito acelerado”.
Estradas e caminhos-de-ferro por limpar
Os autarcas ouvidos pelo i denunciam que também o Estado não cumpriu com a limpeza dos seus terrenos. “Estamos também a ser confrontados com o incumprimento do próprio Estado, que anda a apregoar a moralidade e é o primeiro a ser imoral”, aponta o presidente da Câmara de Viseu. Neste concelho, as Infraestruturas de Portugal “ainda não limparam nada daquilo que é crítico à volta do município”, alerta Almeida Henriques, que diz também que “nada foi feito”ao lado do IP3, do IP5 e na EN 229 que vai para Sátão. E esta não é uma situação que esteja a acontecer apenas no concelho de Viseu. Segundo os vários autarcas contactados pelo i, a IP não procedeu a qualquer limpeza junto aos caminhos de ferro e junto às bermas das estradas.
Mais de mil contraordenações
Entre os dias 2 de abril e 28 de maio a GNR instaurou 1024 autos de contraordenação por falta de limpeza de terrenos, revelou ao i o Ministério da Administração Interna, que não detalha que entidades foram alvo de multa ou os concelhos onde mais se registou incumprimento. O número de contraordenações ainda deverá subir tendo em conta que neste balanço não estão incluídos os últimos três dias de fiscalização da limpeza.
A partir de amanhã, a GNR vai verificar se estas 1024 situações de falta de limpeza foram regularizadas e, caso os terrenos não tenham sido limpos, a multa será cobrada. Os valores subiram este ano para o dobro e flutuam entre os 280 euros e os dez mil euros no caso de um proprietário singular e os três mil euros e 120 mil euros para pessoas coletivas.
Entre os dias 1 e de 30 de junho estará em vigor a fase de limpeza dos terrenos sinalizados como 2.ª prioridade.