Rosemary Spínola era uma das testemunhas mais aguardadas no julgamento em que Duarte Lima responde pela apropriação de mais de cinco milhões de euros de Rosalina Ribeiro, ex-companheira de Lúcio Tomé Feteira, que foi assassinada em 2009 a cem quilómetros do Rio de Janeiro – homicídio por que já foi também acusado o antigo deputado português naquele país. A melhor amiga da vítima, ouvida esta tarde no Campus da Justiça, em Lisboa, via Skype, garantiu que dias antes de Rosalina Ribeiro morrer lhe confessou que tinha transferido muito dinheiro para Duarte Lima e que estava nervosa com os comportamentos do advogado.
A conversa com a brasileira Rosemary Spínola, uma espécie de confidente, aconteceu logo após ‘Lina’, nome carinhoso por que tratava Rosalina, ter chegado ao Rio de Janeiro – uma viagem que sem saber seria a última.
“Sempre que chegava ao Brasil eu era a primeira pessoa com quem ela se comunicava”, explicou ontem a testemunha perante o coletivo de juízes, adiantando que já se conheciam há mais de 20 anos – conheceram-se por intermédio do marido da brasileira e de Lúcio Tomé Feteira. Apesar de fechada, contou Rosemary Spínola, Rosalina Ribeiro desenvolveu consigo uma relação de amizade e de muita proximidade, tendo inclusivamente aberto contas em cotitularidade para que a brasileira pudesse pagar as contas do condomínio no Brasil, quando Rosalina estava fora.
Quando a procurou em 2009, Rosalina estava mais nervosa do que era hábito e tudo por causa de uns problemas com o seu advogado. “No contacto pessoal que teve com ele, ficou preocupada porque ele estava estranho e ela contou que tinha deixado uma importância aos cuidados dele. Não disse quanto, apenas que era uma importância grande na mão dele”, explicou a testemunha, acrescentando que a transferência desse dinheiro para a esfera de Duarte Lima fora feita para evitar que num qualquer arresto determinado nos processos de inventário que corriam na Justiça pudesse ficar sem nada.
E foi depois disso tudo que “ele não estava agindo correto com ela”. “’Lina’ estava com medo que ele estivesse usando o dinheiro dela”, reforçou Spínola, confirmando a tese das acusações portuguesa e brasileira.
A primeira relativa ao crime de abuso de confiança, ou seja, à apropriação dos milhões de Rosalina Ribeiro e a segunda relativa ao homicídio.
“Parece que a última vez que ele teve com ela antes de ela vir para o Brasil ele queria que ela assinasse documentos inverídicos relativamente a isso”, continuou a testemunha.
E, segundo estas declarações (que já tinham sido importantes para o processo brasileiro), Duarte Lima terá mesmo ligado a Rosalina quando esta estava já em território brasileiro com uma conversa enigmática: “Disse que a intenção era mandar alguém aqui para conversar com ela mas que não podia dizer o nome porque o telefone estava a ser grampeado.”
A data desse tal encontro foi alegadamente a do dia em que Rosalina desapareceu e os registos telefónicos revelam que pouco antes de a vítima descer as escadas, Duarte Lima faz uma chamada rápida para o seu telefone de casa.
Desconhecendo qualquer intervenção de Duarte Lima em processos brasileiros ligados à amiga, Rosemary Spínola adiantou, no entanto, que lhe parecia que Duarte Lima era uma espécie de advogado de Rosalina, até pelos aconselhamentos todos que lhe dava.
Ainda assim e apesar de ter falado em mais de um momento nos receios da amiga, Rosemary Spínola disse, questionada pela defesa do ex-deputado, que nunca lhe foi referida qualquer ameaça contra a vida.
A defesa de Duarte Lima pediu hoje para juntar ao processo as declarações da testemunha no processo de homicídio, algo a que o Ministério Público e a defesa dos assistentes se opuseram por considerarem que não se tratavam de documentos manifestamente relevantes para a descoberta da verdade.
Neste julgamento, que chega ao fim a 26 de setembro, Duarte Lima tem defendido que os milhões que Rosalina Ribeiro transferiu para si foram a título de pagamento de honorários adiantados, isto porque na altura em que o dinheiro caiu nas suas contas (2001) ainda tudo estava no início.
No Brasil aguarda-se ainda uma decisão para se saber se o processo do homicídio será julgado em Saquarema, como pretende Duarte Lima, ou em Lisboa, como defende o MP brasileiro, fundamentando que qualquer possível condenação no Brasil não dará origem a uma extradição – uma vez que Portugal não entrega a outros estados os seus cidadãos nacionais.