«Falem agora, que eu já estou fora e até já». Foi este o lema, inspirado no fado cantado por Fábia Rebordão, que Jorge Jesus escolheu para ilustrar a sua ida para a Arábia Saudita. Mas antes de deixar Portugal, o ex-treinador do Sporting foi convidado para as conferências do International Club of Portugal e, sem nunca falar em Bruno de Carvalho para não quebrar a cláusula de confidencialidade que tem na sua rescisão do contrato, deixou alguns recados à presidência do clube de Alvalade.
«Mandar é fácil, saber mandar é que é difícil», disse Jesus, reforçando que «o líder tem de se saber adaptar às situações que lhe aparecem diariamente», deve «saber desempenhar, interpretar, a responsabilidade que tem» e, apesar de serem «potencializáveis», têm «de nascer com alguma coisa diferente». O próprio tema da conferência convidava a uma reflexão sobre a liderança quer do clube, quer da equipa, uma vez que era a «Liderança na multiculturalidade». «Calhou bem», comentou Jorge Jesus com o presidente do International Club of Portugal ainda antes do almoço debate começar. «Todos nós gostamos muito da palavra [liderança], principalmente quem lidera e quem comanda», criticou JJ.
«Para mim, o princípio da liderança tem a ver com o conhecimento, com aqueles que seguem e que reconhecem a capacidade de trabalho», afirmou o ex-treinador. «Só és líder se quem trabalha contigo te seguir, se não seguir não te reconhecem valor», retorquiu ainda, naquilo que pode ser visto como uma alusão aos pedidos de demissão que têm sido publicamente feitos a Bruno de Carvalho.
No entanto, para Jesus, a liderança no futebol deve ser mais do que conseguir bons resultados – que também são importantes -, deve estar focada nas pessoas, desde os jogadores ao presidente. «Não há um bom presidente sem um bom treinador e um bom treinador sem bons jogadores».
Quando questionado sobre a possibilidade de, no futuro, vir a assumir a presidência do seu «clube do coração», Jesus descartou completamente essa possibilidade. «Nem no Sporting nem em clube nenhum. Nenhum dos meus objetivos passa por gerir ou ser presidente» de um clube de futebol, respondeu JJ, reafirmando mesmo que «isso está fora de questão». «A minha grande paixão é o jogo, é o futebol, é isso que me move e por isso é que eu dei um salto de Portugal para a Arábia Saudita». Mas a saída «não é fácil» para o treinador que acabou por se emocionar durante o discurso. «Antes de ser treinador sou um ser humano, os meus jogadores a mesma coisa», disse tendo de interromper o discurso para se recompor. «Aquilo que eu posso garantir é que a minha saída tem um objetivo: voltar a Portugal».
Com partida marcada para dia 20 deste mês, Jorge Jesus acredita ter deixado o Sporting mais próximo dos dois rivais – o Benfica e o FC Porto. A sua estadia como treinador nas últimas três épocas «foi uma luta, uma valorização, um legado» que foi deixado ao clube dos leões. «Eu vim de um lado [Benfica] em que estava habituado a ter coisas. Eu senti que para seres campeão ali [no Sporting] tens de as criar, porque, se não, nunca vais ser», partilhou o ex-treinador leonino.
Chico-espertos do futebol
Além dos recados a Bruno de Carvalho, Jorge Jesus aproveitou o debate para criticar o atual estado do futebol nacional. «Em Portugal criou-se nos últimos 10 anos [uma cultura em que] os Chico-espertos eram aqueles que poderiam ser vencedores nas competições em que nós estamos inseridos», afirmou o treinador criticando os diferentes escândalos de corrupção que envolvem a modalidade. «O que é verdade é que todos nós temos de mudar a nossa forma de pensar e de comunicar sobre o futebol».
E por falar em comunicação, JJ quis também deixar uma palavra à comunicação social que Bruno de Carvalho tanto tem criticado, chegando até a acusar os jornalistas de perseguição ao Sporting: «A comunicação também é um jogo que ajuda a atingir objetivos, é uma luta constante».