Quem liga a estas coisas da história da televisão e passou os dias à espera de um final feliz para a missão impossível que se montara para resgatar 12 adolescentes e o seu treinador, presos numa gruta no norte da Tailândia, não deixou de lembrar o célebre caso de Kathy Fiscus. A menina de três anos que ficou ligada tragicamente à história da televisão – em abril de 1949, os três dias da tentativa de resgate da menina que caíra a um poço abandonado em San Marino, Califórnia, foram transmitidos em direto pelo canal KTLA e mantiveram a América agarrada aos televisores.
Quase 70 anos depois, a operação na gruta Tham Luang manteve, não só um país, mas o mundo inteiro preso em velo nas transmissões televisivas em direto desde uma província tailandesa, Chiang Rai, no norte da Tailândia, junto à fronteira com a Birmânia e o Laos. Além da dimensão da operação e do alcance da transmissão, outra coisa separou a operação de salvamento de Kathy Fiscus e da equipa de futebol dos Wild Boars, aquilo que parecia encaminhar-se para uma tragédia, teve direito ao seu júbilo final.
Dez mil pessoas participaram na operação, incluindo dois mil soldados, 200 mergulhadores e uma centena de representantes de agências governamentais. Se é preciso uma aldeia para educar uma criança, foi necessária uma cidade para salvar 12 adolescentes (entre os 11 e os 17 anos) e um treinador (de 25 anos) refugiados numa câmara a quatro quilómetros da entrada da gruta.
As condições difíceis do percurso, a inexperiência dos jovens, a escuridão, as condições meteorológicas que anunciavam chuva. Tudo em torno desta operação de resgate apontava para uma missão impossível ou, pelo menos, uma missão que tinha tudo para não resultar.
O controlo de acesso dos media ao local a partir do momento que começou a retirada dos jovens, permitiu às autoridades tailandesas gerir as notícias e precaver-se para a tragédia que pudesse acontecer. A possibilidade de alguma das crianças não resistir à dificuldade do percurso existia, até porque nunca se tinha procedido a uma operação desta dimensão numa gruta, em condições tão adversas e com tanta gente para salvar. E como o céu podia não ajudar, havia uma componente de contrarrelógio que aumentava a possibilidade de se cometerem erros e daí resultarem fatalidades. A morte de um experimentado mergulhador tailandês, que pertencera aos fuzileiros tailandeses provou-o ainda antes de os jovens começarem a ser retirados.
Para se ver como a operação era generalizadamente considerada como uma missão impossível, as autoridades viram-se obrigadas a divulgar um vídeo dos 12 jogadores e do seu treinador na enfermaria do hospital, porque se multiplicavam os rumores de que não estavam vivos, apenas se escondia a notícia.
Pormenores divulgados posteriormente, citando mergulhadores e outros operacionais das equipas de salvamento, mostram como, pelo menos por duas vezes, a tragédia esteve realmente quase a acontecer. Segundo o New York Times, citando o major Charles Hodges, comandante da equipa americana no local, na viagem número 11, o mergulhador que ia à frente (uma equipa de dois mergulhadores transportava o jovem sedado) perdeu a corda guia debaixo de água, sem visibilidade e andou mais de hora e meia à procura de encontrar o caminho. Valeu-lhe a experiência para nunca ter entrado em pânico.
O segundo percalço, aconteceu algumas horas depois do último resgatado ter sido levado para o hospital. Uma bomba de água avariou-se e o nível da água começou a aumentar rapidamente numa altura em que uma centena de pessoas ainda estavam dentro da gruta, a quilómetro e meio da saída. Por sorte, uma semana de drenagem e de retirada de lama com pás permitiu que as pessoas pudessem fugir mais rapidamente.