Há uma semana, discutia-se o concerto dos Arctic Monkeys no NOS Alive, o contraste entre a combustão do passado e a quebra de tensão de “Tranquility Base Hotel & Casino”. Crescimento? Amadurecimento? Envelhecimento precoce? Todas as teorias serviram para explicar a reação fria à transição para uma nova era.
Um pouco mais novos, os xx também não são os mesmos de “VCR”, “Crystalized” ou do fabuloso instrumental “Intro” – ou como uma canção sem voz pode dizer tanto sem palavras – quando reconstruíram o minimalismo e o fatalismo dos primórdios dos Cure para uma nova geração. Livres mas sofridos, dessa banda resta um punhado de ligações diretas ao coração que ocupam um bom quinhão do concerto.
Oliver Sim e Romy Madley-Croft distribuem elogios ao público. Em nenhum momento, se desconfia da sinceridade das palavras.
É o último concerto da digressão e “durante este tempo muita coisa aconteceu na nossa equipa. Nasceram bebés…”, recapitula o longilíneo vocalista.
“Já estamos muito tristes”, confessa Croft, a reencarnação vocal de Tracey Thorn dos Everything But The Girl. Quase dez anos de liga dos campeões depois, a lágrima no canto do olho ainda não é forçada.
Poucas bandas tocam tão fundo no coração como os xx e ainda assim cresceram a olhos vistos. A arquitetura moderna domina o palco com dois ecrãs-vídeo a projetar gestos, movimentos e sensações.
Gera-se uma relação sincera de carinho entre banda e público. Oliver Sim dedica “Fiction” à comunidade LGBT e a resposta é ruidosa; solitária, Romy embala a “muito especial” “Performance”.
E de repente os dois saem, entregando a condução a Jamie xx, o discreto patrono sonoro da banda. “Loud Places”, a canção dos xx que acabou no álbum-solo do produtor, tem lugar direto no alinhamento.
A tensão cresce mas é em “On Hold” o êxtase – colagem perfeita entre a remistura de Jamie xx para a versão limpa da banda. Os xx de “I See You” (expressão que não se cansaram de repetir) apanharam a boleia do engenheiro da casa das máquinas. Ganharam cor e ritmo mas não perderam a singularidade que os elevou a uma condição, talvez inesperada quando se mostraram ao mundo sem máscaras.
É uma noite de glória, depois de no ano passado terem sido a banda mais elogiada do NOS Alive. E quando “Angels” dá por finda a sessão, estamos todos um pouco melhores.
Em prol do bem e da memória, amigos e família homenagearam Zé Pedro. Nestes tributos, a carga emocional é quase sempre mais pesada que a bagagem musical.
Versões sinceras de “Conta-me Histórias”, por Manuela Azevedo e de “Circo de Feras”, por Manel Cruz, conviveram com bandeiras como “London Calling” dos Clash. E toda a gente pôde reparar que a expressão de Tó Trips em “Submissão” é igual à de Zé Pedro.
Os momentos do Palma ‘s Gang (“Picado pelas Abelhas” e o hino “Portugal Portugal”) e dos Xutos & Pontapés (feliz a escolha de “Não Sou o Único” para fechar) sintetizaram uma homenagem sentida. Em todos os convidados se sentiu a tristeza da perda, mas sobretudo a interiorização da coragem de quem não quis morrer devagar. Mais do que o músico, deixou-os o amigo.