É provável que só tenha ouvido este mês o nome de Kolinda Grabar-Kitarovic. E se só a conheceu em julho quase que a poderia chamar de Marcelo Rebelo de Sousa da Croácia. Se, naturalmente, as semelhanças físicas com o nosso Presidente da República são nulas, em termos da postura perante o público são inegáveis. Kolinda Grabar-Kitarovic é a Presidente da República da Croácia e este mês tornou-se muito popular pelos seus gestos no Mundial de futebol, na Rússia. Tal como Marcelo Rebelo de Sousa fez, em 2016, no Europeu, em que se deslocou até à França para ver a meia final da competição, Grabar-Kitavoric também voou até à Rússia, pela primeira vez durante o Campeonato do Mundo, para assistir aos quartos de final do Mundial – jogo em que a Croácia eliminou a Inglaterra da competição e seguiu para as meias finais. A única diferença foi que a governante croata viajou em classe económica e Marcelo deslocou-se num Falcon da Força Aérea. Tal como o nosso Presidente, despertou a atenção dos populares com as selfies que tirou a caminho do Mundial. Um estilo que estamos habituados a ver em Marcelo, conhecido pelos seus abraços e pelas várias selfies que tira com a população nas suas (imensas) aparições públicas. Por fim, a fuga ao protocolo: tal como Marcelo, Kolinda parece gostar de quebrar as regras: foi ao balneário para abraçar os jogadores, viu os jogos da bancada e não da tribuna e, no final, ainda distribuiu os já famosos cumprimentos de fair-play aos adversários na final França-Croácia, em que os gauleses venceram os croatas por 4-2. E se depois de todas estas evidências ainda não está convencido, eis mais um ponto que os dois governantes têm em comum: Kolinda Grabar-Kitarovic sabe falar português fluentemente.
Kolinda foi a primeira mulher a chegar à presidência da Croácia. Já passou pela NATO, embaixada dos Estados Unidos da América e pelo ministério dos Negócios Estrangeiros e é certo que não perde uma oportunidade para apoiar a seleção de futebol do seu país. Este ano, para além de ter surgido nas redes sociais com um sorriso na cara, debaixo de chuva, com a camisola da Croácia vestida, a abraçar e a cumprimentar Macron, foi também muito aclamada por ter viajado para a Rússia porque decidiu pagar as viagens do seu próprio bolso e, segundo escreveu a ABC, nos dias em que lá esteve descontou do seu vencimento porque não estava a trabalhar. Por essas, e mais razões, tornou-se muito popular e chegou mesmo a ser apelidada de ‘rainha das selfies’. No fim do jogo França-Croácia, a presidente não hesitou e foi até aos balneários para congratular a equipa, tirou mais selfies, saltou e até cantou. Asua boa disposição não passou despercebida quando a Croácia viveu um momento histórico ao vencer a Inglaterra e se ter qualificado para a final do Mundial. Na altura, a governante encontrava-se em Bruxelas a participar na cimeira da NATO, mas não perdeu pitada da euforia que se viveu na Rússia. «Estivemos a seguir o jogo durante o jantar. Foi fantástico porque todos os Aliados estavam a torcer por nós, ou pelo menos a maioria», contou Grabar-Kitarovic aos jornalistas presentes no encontro, citada pela Associated Press. Mas o mais curioso é que Grabar-Kitarovic estava na mesma mesa do presidente francês, Emmanuel Macron, a quem decidiu deixar uma espécie de aviso: «Esta vai ser uma cimeira de sucesso. E no domingo vamos ganhar». Ainda na cimeira, a presidente esteve novamente sob as luzes da ribalta quando deu uma camisola da seleção croata a Donald Trump e outra a Theresa May.
‘Futebóis’ à Parte
Nasceu em 1968 na região croata da ex-Jugoslávia. Tem 50 anos e é casada com Jakov Kitarovic desde 1996, com quem tem dois filhos – Katarina e Luka.
Ao longo da sua vida, decidiu apostar nos estudos. Antes de ingressar na vida política esteve um ano a estudar nos Estados Unidos da América, na Universidade de Harvard, onde se formou em literatura inglesa e espanhola. Estudou diplomacia e tirou um mestrado em relações internacionais. Começou a trabalhar como consultora de cooperação internacional do Ministério e Tecnologia da Croácia quando ainda se encontrava a estudar. Posteriormente, seguiu carreira como conselheira na embaixada de Otava, no Canadá, durante três anos.
Em 2000 regressa à Croácia e ocupa a pasta dos Assuntos Europeus, voltando, mais tarde, aos Estados Unidos já como embaixadora – já lá iremos.
Sabe falar sete línguas e uma delas, como já tínhamos contado, é português. Também é fluente em espanhol, alemão, francês, italiano, inglês e croata.
Em maio fez uma visita a Portugal e até discursou em português durante 15 minutos no Palácio da Ajuda, durante um jantar oferecido por Marcelo Rebelo de Sousa. Foi ainda condecorada pelo nosso Presidente da República com o Grande-Colar da Ordem do Infante D. Henrique. Nessa altura, deu também uma entrevista ao Diário de Notícias, onde revelou que aprendeu português quando estava na Universidade de Zagreb a estudar inglês e espanhol. «Havia um curso de português que escolhi e frequentei durante três anos. Até traduzi um livro de português para croata. Infelizmente nunca tive oportunidade de passar mais do que uns dias num país de língua portuguesa. Precisava de mais para mergulhar na cultura local. Hoje tento ler o máximo possível em português, mas falta-me o contacto humano e as conversas», afirmou.
Vida política e as polémicas
É católica e pode ser considerada uma liberal de direita por ter estado ligada ao partido União Democrática Croata, mas atualmente é a cara que representa a Croácia. Em 2015 tornou-se na primeira mulher e na pessoa mais nova – na altura tinha 46 anos – a assumir a presidência do país, tendo conquistado 50,54% dos votos. Antes, foi também ministra dos Negócios Estrangeiros e embaixadora da Croácia em Washington, entre 2008 e 2011.
Ao longo da sua vida política já defendeu a o aborto – por considerar que decisão de abortar ou não cabe apena à mulher -, o uso de canábis para fins medicinais e ainda os direitos das pessoas LGBTI. Nesse sentido, um ano antes de ganhar as eleições, em 2014, revelou que apoiaria os seus filhos se estes se assumissem como homossexuais.
Mas nem tudo é um mar de rosas e Grabar-Kitarovic já viveu alguns momentos atribulados e polémicos no decorrer da sua vida política. O primeiro foi quando ainda era embaixadora nos Estados Unidos. Na altura, o seu marido usou o carro oficial da embaixada para assuntos de ordem privada, atitude que gerou controvérsia no Governo croata. No entanto, apesar de a sua boa reputação ter diminuído após esse episódio, voltou a subir quando se tornou na subsecretária de Diplomacia Pública da NATO. Em 2017, enfrentou nova polémica, quando enviou as suas condolências à família de Slobodan Praljak – antigo general bósnio-croata que se suicidou em pleno tribunal, depois de ter ingerido veneno, quando ouviu que iria ser condenado a 20 anos de prisão por crimes de guerra contra a população muçulmana bósnia, advogados, público e juízes e ainda por infrações às normas da Convenção de Genebra. Na altura, a presidente croata descreveu o Praljak como sendo «um homem que preferiu suicidar-se a viver como um condenado por atos que acreditava firmemente não ter cometido». Também foi criticada quando o ex-primeiro-ministro da Croácia, Ivo Sanader, foi condenado por crimes de corrupção. Apesar de não ter sido afetada diretamente com a condenação, apontaram-lhe o dedo por ter integrado o Governo de Sanader como ministra do Negócios Estrangeiros. Numa entrevista à Euronews, a jornalista classificou-a como a «protegida» do ex-primeiro-ministro. Kolinda contrapôs: «Não gosto da palavra, peço desculpa mas não era a sua protegida». A jornalista prosseguiu perguntando-lhe quando é que a Presidente teve conhecimento do que se estava a passar, ao que Grabar-Kitarovic afirmou que não tinha conhecimento de quaisquer crimes praticados pelo ex-primeiro-ministro: «Só tive conhecimento quando tudo se tornou público, muito honestamente quando trabalhei com ele não notei nada do que estamos a ouvir agora».
Com toda o mediatismo em torno da presidente croata, também os media relembraram uma fotografia polémica em que a governante surge num jantar com a bandeira criada pelo partido croata, que esteve no poder durante a Segunda Guerra Mundial e que apoiava o regime nazi.
Apesar de Kolinda Grabar-Kitarovic ter conquistado, passemos a redundância, o mundo neste Mundial, onde demonstrou ser uma adepta fervorosa – que acompanhou e festejou, até ao último minuto, o percurso da seleção croata no campeonato -, nos últimos dias foi difundida uma carta aberta que faz duras críticas à classe política da Croácia. Inicialmente pensava-se que a carta era da autoria do selecionador croata Zlatko Dalic, mas afinal o verdadeiro autor, Igor Premuzic, confessou no portal croata Dnevno ter escrito o texto, classificando-se como «um verdadeiro desportista e patriota».
«A Croácia é o país mais pobre da União Europeia, governado por pessoas más e por membros de uma organização que já foi declarada como criminosa», pode ler-se na missiva. E o adepto continua: «Hoje, na Croácia, os nossos reformados não conseguem fazer face às suas necessidades mais básicas, os jovens não conseguem pagar a educação, os cuidados de saúde estão em colapso e o sistema judicial protege o grande capital e é corrupto», fazendo o apelo aos políticos e todos os representantes das autoridades para «que se afastem da seleção da Croácia». J