A costa portuguesa está em risco. Quem o diz são os especialistas e ambientalistas da Quercus que, ao SOL, destacam algumas praias, de norte a sul do país, onde o desaparecimento do areal tem sido mais notório.
Praia de Vale do Lobo em Loulé, Portinho da Arrábida em Setúbal, as praias da zona norte da Costa de Caparica – como a Praia de São João, a Praia de Santo António da Caparica ou a Praia do Norte -, a Praia do Abano em Cascais, a do Furadouro e a da Cortegaça em Ovar, a da Costa Nova e a da Barra em Ílhavo, a do Pedrógão em Leiria, a da Vieira na Marinha Grande, a de Vagueira em Vagos e, em Esposende, a Praia de São Bartolomeu, a de Esposende e a de Ofir – destinos de tantos banhistas ao longo de anos, hoje estão reduzidas a areais escassos e algumas apenas a pedras, tendo mesmo perdido a qualidade balnear que outrora tiveram.
Mas qual o motivo na base do problema? Porque é que a costa portuguesa, tão elogiada pelas suas praias e largos areais, tem estado a perder parte do seu património natural? Nuno Sequeira, membro da direção da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza – explica ao SOL que, apesar de não haver uma resposta «totalmente conclusiva», é possível identificar elementos que contribuem para o que se está a verificar.
«No norte e no centro do país, o grande problema tem que ver exatamente com a falta de sedimentos, que chegam ao mar através dos rios, onde proliferam grandes barragens», elucida o responsável. «Em zonas mais a sul, como a Costa de Caparica, pensa-se que também parte do problema pode ser a existência de grandes barragens, que fazem retenção de sedimentos, que possa estar na origem desta falta de areia».
Só na bacia hidrográfica do Douro, por exemplo, existem mais de 50 barragens em Portugal e em Espanha – um facto que pode ajudar a compreender o porquê de as praias do norte português, em comparação com o resto do país, serem as mais prejudicadas quando se fala em falta de areia.
Para o membro da direção da Quercus, «devia haver uma medida que obrigasse os concessionários das barragens a libertar a areia para que ela chegasse ao mar, mas isso não acontece e portanto os rios, que naturalmente levariam os sedimentos para o mar e esses sedimentos iriam recarregar as praias, acabam por não conseguir levar a areia e portanto a falta de areia sente-se nas praias». À falta de uma imposição oficial, Nuno Sequeira defende que os próprios concessionários «podiam libertar essa areia, com descargas de fundo, por exemplo»: «Mas isso acaba por trazer prejuízos financeiros às empresas e por isso não o fazem».
Segundo o especialista, na base do problema pode haver também outras explicações, como o aumento de fenómenos extremos – marés vivas e tempestades – e o aumento do nível médio da água do mar. Segundo o mais recente Relatório do Estado do Ambiente, referente ao ano de 2017, em Portugal o nível médio das águas do mar tem subido 4,1 milímetros por ano, nos últimos 10 anos.
Mas Nuno Sequeira destaca ainda outro motivo que contribui para a dinâmica verificada, relacionado com o ordenamento do território: «A erosão costeira tem que ver com a perda de areia, mas também com a ocupação ilegal das dunas e com o próprio ordenamento do território que foi feito ao longo de décadas em Portugal e que permitiu também a existência de diversas construções junto ao mar, e com elas a destruição de dunas, o que acaba por potenciar a erosão costeira e fenómenos como a falta de areia. É uma situação realmente preocupante», defende Nuno Sequeira.
Os dados do Relatório do Estado do Ambiente de 2017, mostram que existe uma extensão de 180 quilómetros de território costeiro que está «efetivamente em situação crítica de erosão», um número que, na visão do responsável da Quercus, «é muito, muito elevado». Já no Relatório do Estado Ambiente do ano anterior (2016), o número avançado era o mesmo.
«No entender da Quercus este é um cenário muito grave, que pode ter efeitos devastadores na nossa costa», diz.
E embora à primeira vista as implicações possam parecer apenas ambientais, a verdade é que vão muito além disso. «Há obviamente também implicações sociais e económicas, uma vez que muitas atividades que temos em Portugal, como o turismo, e que são tão estruturais na economia do país, podem vir a sofrer com esta situação que se está a viver na nossa costa».