Há pouco mais de um ano a Universidade Católica anunciou com pompa e circunstância que iria abrir em 2020 uma Faculdade de Medicina em Cascais, recuperando o antigo hospital da autarquia liderada por Carlos Carreiras. Mas, afinal, não vai ser assim.
A Faculdade de Medicina vai funcionar em Talaíde, junto ao Tagus Park, concelho de Sintra, reabrindo as portas na antiga Faculdade de Engenharia da Católica, que fechou há cinco anos.
Também a parte clínica do curso, prevista para funcionar no antigo hospital de Cascais, que iria ser transformado em hospital universitário, vai ser transferida para Oeiras. O SOL apurou que os alunos vão estagiar no Hospital Luz Saúde, que funciona junto ao Parque dos Poetas, em Oeiras.
A alteração dos planos foi confirmada ao SOL pelo presidente da Câmara de Cascais, Carlos Carreiras, que explicou que a transferência para o concelho de Sintra se deve «a um compromisso» firmado entre a universidade e a autarquia há cerca de 30 anos.
Segundo Carlos Carreiras, a autarquia de Sintra acionou o compromisso que previa que a Católica «tinha de pagar uma indemnização se não fosse para lá». A compensação à autarquia por parte da universidade deve-se a investimentos realizados pelo município, tendo em vista que a instituição de ensino superior abrisse um polo naquele concelho.
O presidente da Câmara de Cascais, que diz que não tinha conhecimento deste compromisso entre a universidade privada e Sintra, garante que a autarquia cumpriu com o que ficou estabelecido na assinatura do protocolo, em fevereiro de 2017, mas que «não se justificaria ser Cascais a suportar os custos dessas eventuais indemnizações».
Foi então que, continua Carreiras, a Católica «descontinuou o projeto que estava previsto em Cascais», cuja apresentação contou com a presença do ex-secretário de Estado da Saúde, Manuel Delgado.
Universidade Católica adianta pouco
Também ao SOL, a Universidade Católica confirmou que a Faculdade de Medicina «vai funcionar num edifício que pertence à UCP», sem adiantar mais detalhes. Mas já em 2004, o então reitor da Católica, Manuel Braga da Cruz, disse que a instituição tinha apresentado ao Governo «um projeto» para «criar em Sintra» uma faculdade de Medicina «em parceria com o grupo José de Mello Saúde» e que contava com «o apoio do município local». Já na altura o reitor disse que a licenciatura em Medicina iria funcionar da antiga Faculdade de Engenharia, que operou entre o ano 2000 e 2013, tendo encerrado por razões financeiras. Quando encerrou o pólo, este era frequentado apenas por 100 alunos nas licenciaturas em Engenharia Civil, Biomédica, Mecânica, Informática e Industrial.
No início deste mês, em reunião de Câmara, o presidente da autarquia de Sintra, Basílio Horta, manifestou o interesse em instalar a Faculdade de Medicina no concelho. A mesma vontade ficou expressa numa carta enviada pelo autarca à reitora da universidade privada. «É um projeto que acolhemos com bastante satisfação e entusiasmo. A Câmara estará ao lado da Católica para fazer tudo aquilo que for necessário fazer, dentro daquilo que a lei permita, para que a instalação decorra da melhor maneira possível», disse Basílio Horta, que vai reforçar a rede de transportes públicos na zona do Tagus Park.
Ambição antiga
Em Portugal, por enquanto, nenhuma universidade privada conseguiu abrir uma licenciatura de Medicina. Já houve várias tentativas de instituições de ensino superior privadas, mas que nãochegaram a avançar por falta de condições, como foi o caso da Cooperativa de Ensino Superior Politécnico e Universitário (CESPU), da Lusófona, do Instituto Piaget, da Universidade Fernando Pessoa ou da Escola Superior Egas Moniz.
E a Universidade Católica não foge à regra, sendo uma ambição antiga a abertura de uma Faculdade de Medicina. No ano passado, durante o anúncio do projeto em Cascais, a reitora Isabel Capeloa Gil disse que este era um projeto que contava com «30 anos de preparação», lembrando que «os riscos para uma universidade que não tem apoio estatal são diferentes de uma universidade pública» e que por isso a instituição de ensino superior teve de «ponderar muito bem».
Além da parceria com o grupo Luz Saúde, a Católica estabeleceu um protocolo com a Universidade de Maastricht para lançar o curso de Medicina.
Tal como todos os cursos que entram em funcionamento em Portugal, antes de avançar com a licenciatura, a Católica tem de submeter o plano curricular e o corpo docente à Agência de Avaliação e Acreditação (A3ES) que vai verificar se são cumpridos todos os pressupostos definidos na lei.
Sem a luz verde da A3ES nenhum curso em Portugal por funcionar.
Quando receber a acreditação da A3ES, liderada por Alberto Amaral, a Católica terá de posteriormente, registar o curso na Direção Geral de Ensino Superior.
Todo este processo arrasta-se, em média, por um ano.
Tendo em conta que a A3ES ainda não receber a documentação da Universidade Católica sobre o curso, não deverá ser possível cumprir com a meta anunciada pela universidade: abrir a licenciatura de medicina em setembro de 2020.
Cascais avança com outro projeto
Com o fim do projeto em Cascais, Carlos Carreiras diz que já avançou para conversações com uma universidade pública e um grupo privado de saúde para que sejam lançados, no concelho, cursos de pós-graduações e doutoramentos nas áreas de ortopedia e de neurociências.
Para isso, a autarquia diz que vai reabilitar o antigo hospital José de Almeida, na zona da Parede, avançou ao SOL o presidente da Câmara.
Nas antigas instalações do hospital de Cascais, previstas para o hospital universitário da Católica, está a ser desenvolvido um plano municipal de habitação que prevê a adaptação do edifício em apartamentos com rendas acessíveis para jovens ou idosos. Plano que, de acordo com o autarca, vai ser apresentado no próximo mês de setembro.