«Bom dia! Sorri»

Na Avenida do Brasil, em Lisboa, uma frase cruzou o meu caminho. Dizia: «Bom dia. Sorri». E, efetivamente, sorri porque gostei de que me desejassem um bom dia e me recomendassem que sorrisse.

Ora, um sorriso, como qualquer outro complemento (uma bela carteira ou um par de sapatos novos), fica bem com um bonito fato ou um elegante vestido. Mas fica, sobretudo, bem em qualquer rosto – de criança, jovem ou adulto, masculino ou feminino. E predispõe quem o usa para ter um dia melhor, enfrentando-o com uma «arma» adicional, que lhe permite desarmar eventuais contratempos ou contrariedades. Como diz Ana Bacalhau, em crónica na Notícias Magazine: «Um sorriso que dá luta, forte como uma parede de granito, na qual se esborracham os punhos cerrados e as palavras de ódio. A coragem de oferecer um sorriso ao ódio não é de menosprezar. (…) Pior do que o amor não correspondido é o ódio não correspondido, porque retira aos “odiadores“ as armas e a razão. (…) Sorrir, frente à adversidade, ao ódio. A força criadora sempre vencerá a força destruidora».

Com esta orientação moral em mente, acreditamos realmente no triunfo do bem sobre o mal, na força criadora que vence a força destruidora. E, se não acreditássemos, nada faria sentido, porque muitas são as evidências que nos levam a duvidar de que as fadas hão de vencer as bruxas e de que os anjos conseguem enganar os demónios. Acreditando nestes seres imaginários, apaziguamos dúvidas e repomos a esperança. Se, um dia, um só dia, duvidarmos da correta ordem das coisas, a caixa de Pandora será aberta e começaremos a duvidar; começarão a vacilar muitas mais certezas que tínhamos e que são, no fundo, o garante da nossa salvação, porque estabelecem os fundamentos aos quais nos agarramos para não nos afundarmos, para não nos tornarmos demasiado céticos ou cínicos.

Assim, um sorriso, um simples sorriso, «um sorriso com muita luz», nas palavras de Eugénio de Andrade, pode ser, como referido, uma arma muito poderosa, porque é capaz de surpreender o ódio e a raiva com que algumas pessoas vivem e que, à menor contrariedade, deixam transparecer e, por vezes, fazem refletir nos outros. 

Não há, obviamente, seres perfeitos, porque, como diz Alberto Caeiro, «o que é perfeito não precisa de nada». Mas todos conhecemos exemplos de seres mais imperfeitos que outros – pessoas que, na fila do supermercado, não deixam passar outra pessoa com um só bem, quando o carro delas está cheio de produtos; pessoas que, no trânsito, por motivos menores, se exaltam e insultam os outros ou até chegam a ameaçá-los violentamente; pessoas que, no avião, se recusam a mudar de lugar para que um pai e um filho pequeno possam ficar juntos; pessoas que, ao perguntar uma direção não agradecem quando as indicações lhes são dadas; pessoas que nem sequer dizem «bom dia» antes de pedir um café… A lista seria interminável. Infelizmente, são muitas as pessoas que, vivendo mal consigo próprias, não toleram a existência de outros seres humanos à face do planeta.

E todos sabemos que o eu só se afirma quando existe outro, quando nos apercebemos de que a existência dos outros é que dá individualidade à nossa própria existência. É por isso que só com os outros se justifica existir. A presença dos outros é muito importante, mesmo que, no silêncio da madrugada, nos sintamos sós, ao lado da solidão…

 

Maria Eugénia Leitão

Escrito em parceria com o blogue da Letrário, Translation Services