Na célebre entrevista que Fernando Medina deu no dia 1 de setembro anunciando o fartar vilanagem dos passes sociais, disse outra coisa que, compreensivelmente, ficou ofuscada: disse que havia uma ‘bolha imobiliária’. Que em Lisboa está a formar-se uma ‘bolha’ que dificulta o acesso à habitação por parte das famílias da classe média.
A Câmara Municipal, se descontarmos as transferências do Estado central, vive do IMT, imposto sobre a venda de imóveis, portanto é parte interessada na pujança do negócio imobiliário.
Claro que, para sossegar a opinião pública, adota um discurso hipócrita. Desde o primeiro dia em que assumiu o executivo, Medina prometeu casas para as famílias da classe média. Estávamos em abril de 2015, quase a fazer quatro anos.
Em 2017, ano de eleições, prometeu um regime de renda acessível sobre o qual eu escrevi várias vezes. Seriam construídos milhares de fogos. Como antecipei, não há prédios, não há casas. Dos quinze locais previstos, ou não houve concursos ou ficaram desertos. Podem confirmar em www.lisboarendaacessivel.pt
Nenhum privado quis construir para ser senhorio de pessoas com poucos recursos. É simplesmente o maior fiasco deste executivo das esquerdas.
O Bloco de Esquerda, até fazer o acordo para ir para o executivo, sempre fez do tema da habitação a sua principal bandeira. Com a defenestração de Ricardo Robles, o tema ganhou má fama. O Bloco substituiu o vereador e a bandeira. Da habitação passou para a mais cândida e inofensiva educação.
Mas a verdade é que o problema subsiste e é grave. De que se lembrou Fernando Medina? De subarrendar!
Explicou que a Câmara de Lisboa está a preparar um programa em que a autarquia arrenda as casas aos proprietários e depois subarrenda aos residentes, «garantindo ao proprietário que recebe sempre a renda».
Esquecendo por instantes o flop da renda acessível, façamos um esforço racional de compreensão da medida. O presidente da Câmara acredita que existem milhares de casas desocupadas em Lisboa. Acredita ainda que os proprietários têm como sonho dar o seu imóvel à Câmara. Câmara esta que depois subarrenda às famílias…
Portanto, o bom do senhorio não só atura a Câmara como os inquilinos que esta escolhe.
Fernando Medina acrescentou ainda que tal programa não tem custos para a autarquia. Esta parte é assaz importante: se a CML arrenda a preço de mercado e subarrenda barato, quem arca com a diferença de preços?
A ideia, assim desmanchada, ainda consegue ser mais tonta e inexequível do que parece. Talvez por isso, ninguém a comentou e a oposição não se pronunciou.
Persiste, no entanto, subjacente a velha premissa socialista: hão de ser os privados, os proprietários, a ceder os seus imóveis para os socialistas fazerem políticas sociais. De preferência, baratinho.
sofiarocha@sol.pt