3. A revisão geral das políticas públicas
a. O objetivo e o método
Mobilizar a sociedade civil em geral e os funcionários e agentes em todos os níveis do Estado; recentrar o Estado na execução de missões prioritárias, realizando profundas transformações nos serviços prestados; produzir as reformas e aprofundá-las, melhorando sempre a qualidade do serviço e diminuindo os respetivos custos.
b. O contexto
A intervenção do Estado tornou-se multiforme e pouco clara.
As missões multiplicaram-se, sobrepuseram-se, sem que a coerência do conjunto fosse sempre garantida. Políticas que deveriam ter tido caráter provisório tornaram-se permanentes. Missões que não derivam da essência do Estado foram desenvolvidas. É, pois, necessário fazer uma reflexão sobre as prioridades do Estado e a pertinência de certas missões que hoje lhe estão atribuídas.
A organização do Estado tornou-se progressivamente mais complexa para os utilizadores, obrigando o cidadão a múltiplos esforços quando recorre aos respetivos serviços.
A dimensão do Estado aumentou nos últimos 40 anos, quer em número de funcionários (que ninguém sabe ao certo quantos são), quer em organismos, mesmo considerando a repartição de serviços pelas autarquias e outros operadores do Estado.
c. Os objetivos
– Melhorar a qualidade do serviço prestado aos utilizadores, no acolhimento aos cidadãos, na redução dos tempos de espera, no tratamento eficaz das reclamações e, ainda, na ‘desmaterialização’ dos procedimentos, para facilitar a procura pelos utilizadores;
– Reduzir a despesa pública, através do esforço de recentrar o Estado no seu objeto principal, reorganizar a Administração Central, racionalizar a Administração descentralizada, centralizar as funções de apoio e fazer participar todos os vetores públicos no objetivo de diminuir a despesa.
– Prosseguir a modernização da Função Pública e valorizar as iniciativas dos seus Agentes, responsabilizando os quadros, melhorando o recrutamento, a formação, o desempenho e a valorização da iniciativa e da inovação;
d. Os princípios da ação
– Partilha desenvolvida e apoiada sobre propostas interiores, aprofundadas e analisadas por peritos, e comprometendo os executantes no seu desenvolvimento;
– Envolvimento de todas as estruturas do Estado;
– Apoio político forte, com intervenção direta do primeiro-ministro, e um ministro diretamente responsável.
– Análise profunda e detalhada das especificidades de cada ministério/organismo, num contraditório sobre cada medida e avaliando o respetivo potencial;
– Pilotagem rigorosa do avanço de cada medida, avaliado com base em ‘relatórios de progresso’.
e. Exemplos de reforma das políticas públicas
As funções Estado Moderno podem organizar-se em quatro grandes grupos:
– Soberania;
– Economia e Finanças;
– Apoio Social (educação, saúde, segurança social e cultura);
– Desenvolvimento (obras públicas, equipamentos, inovação, etc), grupos estes que correspondem a grandes áreas de coordenação da ação governativa, as quais devem ser dirigidas por responsáveis que respondam diretamente perante o primeiro-ministro.
Para a área da soberania, teríamos o que hoje são responsabilidades dos Ministérios da Defesa, dos Negócios Estrangeiros, da Administração Interna e da Justiça.
Sendo consensual que poderá fazer-se a junção dos Ministérios da Administração Interna e da Justiça, a soberania seria garantida pelas políticas de Segurança Nacional (Defesa mais Administração Interna e Justiça) e de política externa (Negócios Estrangeiros).
A Segurança Nacional envolveria os assuntos da Defesa (defesa militar mais defesa civil) e da Administração Interna e Justiça (forças e serviços de segurança, organização judicial e outros), encetando-se uma estreita e direta ligação ao Sistema de Informações da República, na direta dependência do primeiro-ministro.
Trata-se assim de clarificar, simplificar e obter ganhos de eficácia.
A ação do Ministério da Defesa
Na era da mundialização, as noções sobre a segurança e sobre os conflitos evoluíram. Esta constatação impõe reorientações estratégicas na utilização dos meios de defesa no interior e no exterior do país.
A estratégia de Defesa e de Segurança Nacional em sentido mais amplo pode ser hoje definida pela observância de cinco grandes funções estratégicas: conhecer e antecipar, prevenir, cooperar, proteger, intervir.
Neste cenário, a missão de um Ministério da Defesa deve ser assegurar a defesa do território, da população e dos interesses nacionais, no quadro dos acordos e tratados internacionais (ONU e NATO) ou regionais (UE e CPLP).
Em paralelo, o Ministério da Defesa deve empenhar-se em missões de serviço público, colocando os seus meios humanos e materiais ao dispor de outros departamentos do Estado, no quotidiano ou nas urgências, no território nacional ou no estrangeiro.
Para isso é absolutamente essencial que, em definitivo, o Ministério da Defesa assuma a condução das políticas de ‘defesa militar’ e de ‘defesa civil’, pela integração da hoje designada Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC) e do Instituto de Emergência Médica (INEM), pois só assim se desenvolverá uma política coerente, com economia de recursos e ganhos de eficiência para os utilizadores.
No que se refere à ‘componente militar’, a sua organização superior deve corresponder à existência de um Estado-Maior General das Forças Armadas de forte vocação operacional e de comando conjunto, dotado dos meios tecnológicos, nomeadamente de informação e comunicações, que proporcionem ganhos significativos em recursos humanos.
O EMGFA deve assumir o planeamento e a obtenção de todos os recursos, de forma centralizada. E o CEMGFA deve ser o único interlocutor das Forças Armadas perante o poder político e o Presidente da República, sendo o único detentor de quatro estrelas.
A estrutura de forças deve assentar em ‘comandos de componente (naval, terrestre e aérea), em substituição dos atuais Estados-Maiores dos ramos das Forças Armadas, responsáveis pela preparação e aprontamento das unidades operacionais integrantes do ‘sistema de forças’ (nacional), procurando-se obter um conjunto coerente, proporcionado e sustentável.
A procura do que pode ser ‘comum’ e do que deve ser ‘conjunto’ deve ser a primeira prioridade.
A coexistência no mesmo espaço geográfico (ou em zonas muito próximas) de todos os departamentos (Ministério da Defesa, EMGFA, comandos de componentes) deve ser procurada e obtida por uma correta política imobiliária que, garantindo a modernidade e a eficácia, respeite o património e o interesse nacional.
A programação para as necessidades de armamentos, equipamentos e infraestruturas deve ser revista com base nas capacidades e de acordo com a nova estrutura de forças.
Deve ser estudado e apresentado o ‘enquadramento estratégico do orçamento da Defesa’ a um horizonte mínimo de dez anos.
Igualmente deve ser estudada e apresentada uma política de recursos humanos da Defesa para o curto/médio prazo, que contemple os corretos aproveitamentos dos conceitos de reserva, de mobilidade e de reconversão.
A Ação do Ministério dos Assuntos Internos e da Justiça (MAIJ)
A tremenda e rápida evolução na natureza dos crimes e no tipo de criminosos que hoje enfrentamos levou ao aparecimento de uma criminalidade que exige do Estado outro tipo de resposta.
Exige-se hoje uma resposta clara, coordenada na utilização dos recursos, célere e conjugando todas as informações disponíveis.
As organizações de resposta devem obedecer aos princípios da simplicidade, da coerência e da oportunidade, sustentadas em elevados padrões de eficiência e dispondo de produtos altamente eficazes.
No âmbito de uma política pública integrada de Segurança Nacional, a função essencial deste Ministério será tutelar politicamente o Sistema de Segurança Interna, assegurar o funcionamento do sistema judicial e garantir o processo eleitoral.
Numa visão moderna de organização, o Sistema de Segurança Interna deverá ser apoiado por uma estrutura de forças que contemple:
– Na versão terrestre: duas polícias nacionais (PSP e GNR) que, cumprindo missões de polícia geral em toda a sua extensão, sejam organizadas em função da matéria – e a quem são atribuídas zonas de ação coerentes e respeitantes da caracterização dual do sistema integrador. A ‘Polícia nacional’ deverá ser organizada em 3 grandes direções – proximidade e ordem pública, criminal e estrangeiros -, pela extinção e conjugação das polícias de natureza civil existentes.
– Na versão marítima: uma só autoridade (a Direção-Geral de Autoridade Marítima) com uma só força policial no mar, conjugada com os meios da Armada a cada momento atribuídos.
– Na versão aérea: uma só autoridade (a Direção-Geral de Autoridade Aérea) com uma só força de intervenção no espaço aéreo (a Força Aérea Portuguesa).
Esta estrutura de forças deve ser superiormente coordenada e dirigida por um secretário-geral (com equivalência a secretário de Estado), sendo os serviços concentrados (comuns) organizados a nível central no Ministério e os conjuntos dirigidos pelo referido secretário-geral do Sistema de Segurança Interna.
Em resumo, Portugal passaria a dispor de:
– Duas polícias terrestres de caráter nacional, sendo uma de natureza civil e outra de natureza militar;
– Uma polícia do Mar;
– Uma polícia do Ar;
E isto através da junção integrada de mais de duas dezenas de atuais órgãos de polícia criminal e das capacidades existentes na Defesa Nacional, para a cooperação em missões de natureza policial e de segurança interna.
A segurança e a logística das prisões de baixa intensidade poderá ser exercida por privados, sendo nas de média/alta intensidade exercida pelos Serviços Prisionais e pela PSP ou GNR, consoante o respetivo grau de perigosidade, e no desenvolvimento de uma política de aproveitamento dos recursos humanos existentes nos diversos escalões etários.
Importante será também analisar e decidir, de uma vez por todas, o que pode e deve ser feito por privados, e remeter para a ’esfera’ do Estado tudo aquilo que só ao Estado deve competir.
Com humildade, aqui fica o nosso contributo.
P.S. – Considerando os últimos acontecimentos, pela sua acuidade e importância, o tema da próxima semana será O Temor Reverencial.
*Major-General Reformado