H averia pergunta mais descabida para fazer a uma criança do que se se sente atraída por homens ou por mulheres? Já para não falar em saber se tem ou já teve algum namorado/a… Com que interesse? E para que fim?
Se com nove anos me tivessem confrontado com a primeira questão, ainda mais com aquela formalidade e referindo-se a homens e mulheres, acho que ficaria bastante confusa – talvez pensasse nos meus pais e outros familiares –, sentir-me-ia pressionada, invadida e envergonhada.
A pergunta surgiu numa ficha sociodemográfica entregue a crianças do 5.º ano numa escola do Porto e a situação foi agora encaminhada para a Inspeção-Geral da Educação e Ciência, mas o mal já está feito e resta-nos esperar que não se repita. Surge desta tendência moderna e doentia de esmiuçar as escolhas sexuais das crianças, seja relativamente a brinquedos ou a pessoas. Assim de repente ocorre-me a questão: por que não deixam as crianças em paz?
Hoje, quando não é quase obrigatório, existe pelo menos a ideia de que é muito saudável os meninos brincarem com bonecas e as meninas jogarem à bola. Parece-me que a ideia original não era essa, mas sim a de que não devemos condicionar ou julgar as escolhas das crianças. Se um menino quiser brincar com bonecas tudo bem, mas se gostar de jogar à bola tudo bem também. E não é por gostar de bonecas que lhe devemos oferecer a mansão e família toda da Barbie, porque aí estaremos nós a condicionar e a confundir.
A questão colocada na escola Francisco Torrinha não é muito diferente. Surge de uma obsessão pela identidade sexual das crianças e pelo desejo de um mundo mais livre, em que ninguém deve ser julgado ou discriminado pelas suas escolhas. Se a intenção podia ser boa, o resultado é desastroso. Pergunto-me qual seria o segundo passo. Um plenário de turma em que os alunos se expunham e discutiam as respostas de cada um e a professora, sem qualquer formação na área, suponho, debitava umas banalidades que os deixaria ainda mais confusos? Preocupante.
Deixamos os nossos filhos na escola com a convicção de que estão entregues a pessoas sensatas e competentes, mas quando oiço falar de educação sexual na pré-puberdade fico logo arrepiada.
Há cem anos Freud dividiu a sexualidade infantil em cinco períodos. O período em que as crianças que responderam a este questionário se encontram seria precisamente o de latência, ou seja, aquele em que as pulsões e interesse sexual estariam adormecidos, dando lugar a outros investimentos como as aprendizagens escolares, culturais e aproximação aos pares. Esta fase alongar-se-ia até à puberdade. Se por um lado é verdade que esta surge cada vez mais cedo, por outro devia ser unânime que os adultos, apesar dos seus temores, pressas e convicções, não a devem precipitar ou ansiar, mas estar disponíveis e abertos para responder e clarificar as dúvidas que vão surgindo ao longo do desenvolvimento e descobertas dos mais novos.
Deixemos as crianças crescerem livremente, sem pressões, sem o controlo apertado que este formulário sugere. Com as suas escolhas guardadas para si e para aqueles com quem as quiserem partilhar. Não nos devemos intrometer, ainda mais numa altura em que ainda tudo é nebuloso e nada está definido, muito menos com o compromisso de uma cruz numa folha de papel.
Se colocassem estas perguntas num formulário a um adulto gostaria de saber quem iria responder.