O mês de outubro trouxe um comportamento incomum aos mercados financeiros. Nas passadas semanas temos observado a queda simultânea tanto de ações como obrigações, ativos que normalmente exibem uma relação de movimento contrária. Por entre muitas explicações, a que me faz mais sentido é a que combina os efeitos de uma recuperação nos níveis de inflação – que por sua vez tem obrigado a Reserva Federal americana a continuar a aumentar taxas – com os primeiros sinais de abrandamento económico dos dois lados do atlântico. A fraqueza económica observa-se em especial no setor manufatureiro europeu, enquanto a desaceleração no homólogo americano é amenizada por um setor petrolífero que continua em forte expansão. A combinação de inflação crescente com o declínio de crescimento tem levado os investidores a aumentar as probabilidades da economia mundial entrar num ciclo de stagflation – estagnação com inflação alta – que seria o catalisador perfeito para atiçar ainda mais as tensões populistas atuais. Se por hipótese extrema as tensões presentes no Médio Oriente despoletassem uma guerra, então poderia ser o regresso a um cenário económico não visto desde a década de 70.
Quem não gostou nada destas quedas foi o sempre vocal Presidente Trump, que bem ao seu estilo foi rápido a encontrar um bode expiatório – desta vez na forma da Reserva Federal, o banco central americano. Aproximam-se as eleições intercalares e o partido do Presidente está em risco de perder a sua maioria em pelo menos uma das câmaras do Congresso, o que ao confirmar-se limitaria a sua margem de manobra durante a segunda metade do mandato presidencial. O estado atual da economia, ou melhor, as perceções dos eleitores sobre esse estado, são sempre um elemento chave nas eleições americanas e Trump sabe que o efeito de sinalização de quedas generalizadas é politicamente nocivo.
Porém, colocar a mira no banco central é um jogo perigoso, pois para obter a benesse temporária de desresponsabilização política o Presidente arrisca pôr em causa um dos maiores garantes da estabilidade de preços moderna – a independência dos bancos centrais. Esta independência é sempre contingente na vontade do poder político em mantê-la, portanto qualquer sinal de recuo nesta matéria tem o potencial de gerar uma onda de desconfiança generalizada no sistema monetário. Mesmo acreditando que nem mesmo Donald Trump conseguiria ser assim tão temerário, a verdade é que a sua postura de procurar vitórias pessoais a qualquer custo indica que este é um risco latente que não deve ser ignorado.
*Gestor fundo macro no BIG – Banco de Investimento Global