“A competição é uma responsabilidade mas nunca pode ser um drama.” A frase é de Rui Vitória e foi proferida pelo treinador do Benfica na antevisão do encontro de ontem na Luz, frente ao Ajax, onde as águias tinham a obrigação de vencer. A julgar pelos festejos no golo de Jonas – e na indisfarçável ansiedade que demonstrou na fase final a cada decisão da equipa de arbitragem contrária aos seus intentos -, porém, ficou claro que o técnico encarnado tinha a perfeita consciência do que um triunfo podia significar quer para o futuro do Benfica na Liga dos Campeões, quer para a sua própria posição no comando técnico dos encarnados, cada vez mais fragilizada.
E a verdade é que a entrada das águias em jogo demonstrou de forma bem vincada o desejo das águias de dar a volta à fase negativa e tentar emendar o percurso errante na principal competição europeia de clubes. Para a prova de fogo, e em relação à equipa que iniciou a partida com o Moreirense, Rui Vitória sentou a seu lado no banco Pizzi e Rafa, deixando ainda João Félix na bancada; no onze entraram Gabriel, Salvio e Cervi. Logo a abrir, Onana mostrou que ia ser protagonista, defendendo um remate fortíssimo de Grimaldo do meio da rua. Pouco depois, nova intervenção de qualidade, agora a remate à queima-roupa de Cervi.
Apesar das queixas físicas, depois de ser martirizado por entradas duras dos defesas holandeses, Jonas viria a mostrar que mesmo a 60 (ou menos) por cento consegue ser letal. Embora, verdade seja dita, para tal tenha contado com uma ajuda gigantesca de Onana: o guardião camaronês saiu de forma absolutamente extemporânea a um lançamento longo de Salvio e socou… o ar, deixando a bola chegar aos pés do avançado brasileiro do Benfica. Estavam três defesas do Ajax em cima da linha de golo, mas nenhum conseguiu evitar o tento de Jonas.
Muita vontade e tão pouca cabeça Respirava-se de alívio na Luz – embora nunca se tenha verdadeiramente deixado de sentir o peso em cima dos ombros. E havia motivos para tal. Aos 39’, dez minutos após o golo do Benfica, Vlachodimos fazia a primeira boa defesa, a livre de Ziyech. Em cima do intervalo, intervenção ainda mais apertada, desta feita a remate de Schone; na recarga, Rúben Dias evitou o golo de Tadic e Van de Beek, com a baliza à sua mercê, atirou ao lado.
Os encarnados iam para o intervalo a sofrer, e assim continuariam com a entrada da segunda parte, vendo de uma assentada Salvio e Jonas a sair por problemas físicos, dando lugar a Rafa e Seferovic. Até que, aos 61’, chegou a estocada fatal: um passe fenomenal de Ziyech, a sobrevoar a defesa encarnada, encontrou Tadic, que fugiu por entre André Almeida e Rúben Dias, passou Vlachodimos e atirou para a baliza deserta. O carrinho de Rúben Dias de nada serviu e foi a imagem perfeita da fase atual que o Benfica atravessa: esforço e vontade… mas pouca (ou nenhuma) clarividência.
A partir daqui, aliás, foi de facto esse o comportamento das águias. Houve tentativas – várias, até -, houve investidas à baliza holandesa, mas raramente com critério, sempre à base do coração e quase nunca com cabeça (e ainda um amarelo a Jardel, que assim irá ficar de fora da deslocação a Munique na próxima ronda). A melhor ocasião, na verdade, aconteceu já depois de esgotados os quatro minutos de descontos dados pelo árbitro italiano Gianluca Rocchi: na sequência de um canto, e após muita confusão na área do Ajax, a bola caiu nos pés de Gabriel. O médio brasileiro, com tudo para marcar, disparou para uma enorme defesa de Onana, que aí se redimiu totalmente do erro no golo encarnado.
Com o apito final chegou a confirmação do empate e de uma incapacidade histórica: o Benfica nunca venceu o Ajax em casa (1-3 em 68/69, 0-0 em 71/72 e o 1-1 de ontem). No outro jogo do grupo, que aconteceu ao mesmo tempo, o Bayern venceu sem grandes dificuldades por 2-0 na receção aos gregos do AEK de Atenas (Renato Sanches entrou aos 87’) e deixou os bávaros isolados na liderança do grupo E, com dez pontos. O Ajax soma oito e pode garantir o apuramento para os oitavos-de-final na próxima ronda, quando viajará à capital grega para defrontar um AEK ainda sem qualquer ponto em quatro jogos.
Muito difícil fica a vida para o Benfica, que soma apenas quatro pontos e fica agora obrigado a vencer em Munique para ainda acalentar algumas esperanças de qualificação. Após o término do encontro, de resto, a equipa voltou a ser brindada com assobios e Rui Vitória com lenços brancos, num sinal claro de que a margem de manobra do técnico está a esgotar-se mais e mais a cada jogo – apesar das palavras de Luís Filipe Vieira, que há precisamente uma semana o garantiu no cargo “pelo menos até junho de 2020”, altura em que termina a ligação de Vitória com os encarnados. A continuar assim, porém, daqui a 2020 ainda vai um longo caminho…