Coreia – economia aberta, inúmeras oportunidades para negócio

  

Em seminários e workshops de internacionalização em que tenho participado o aspeto que mais surpreende empresários e gestores do nosso país é descobrirem que a Coreia do Sul é um mercado de excecional potencial. E para o qual não é difícil exportar. O principal óbice é que muitos dos nossos empresários ou gestores nunca pensaram neste país como mercado, prioritário ou não. Mas a verdade é que a República da Coreia, com apenas 51 milhões de habitantes, é a 11.ª economia do mundo. E o 7.º maior importador e o 7.º maior exportador mundial. A Coreia do Sul é famosa pela sua ascensão fulgurante de um dos países mais pobres do mundo, colonizado pelo Japão entre 1910 e 1935, para um país desenvolvido e com elevado PIB/capita PPP (c. US$ 36000 em Dez 2017) em apenas uma geração. Está incluído no grupo dos Onze Países (N-11) que, conjuntamente com os BRICS, alguns economistas consideram que dominarão a economia global em meados do século XXI. A economia sul-coreana obteve o primeiro lugar no ranking ICT Development Index 2016 (Portugal-44.º) e no 2018 Bloomberg Innovation Index (Portugal-30.º) e está em 4.ª posição na graduação do World Economic Forum Doing Business 2017 (Portugal-29.º).

Os governos e os opinionmakers da Coreia consideram que a principal razão para a sua prosperidade económica radica numa economia aberta ao exterior. Assente numa poderosa economia industrial de exportação, construiu a maior rede de acordos de comércio livre (ACL) a nível mundial (15 ACL que cobrem 50 países  representando 75% do comércio global). Um desses ACL é precisamente com a UE, constituindo aliás o mais ambicioso e abrangente acordo comercial implementado pela UE. A UE como um todo é o terceiro mercado das exportações coreanas; Portugal, porém, representa apenas 0,1% das exportações coreanas. A Coreia do Sul é o 9.º destino das exportações da UE; Portugal, todavia, representa apenas 0,05% do valor global das importações coreanas (plásticos e borracha; máquinas e aparelhos; metais comuns; minerais e minérios; matérias têxteis, são os principais produtos exportados).

Há uma série de setores identificados pela diretora da delegação da AICEP na Coreia, Prof. Joana Neves, como apresentando boas oportunidades de negócio para empresas portuguesas na Coreia – setores navais de alto valor acrescentado, indústria de plantas marinhas, rochas ornamentais, produtos de padaria/confeitaria, cortiça, têxteis-lar, TIC, robótica inteligente, impressão a 3D, vinho, azeite,  compotas,  refeições prontas a comer, energia térmica, hidroelétrica e fontes de energias renováveis,  medicina personalizada,  tecnologias de convergência multidisciplinares, detergentes biológicos, calçado, moda,  café, turismo cultural, religioso e golfe, ensino superior (ex.: cursos em inglês e português na área da economia e gestão), alimentos funcionais, congelados) – elencados num excelente artigo que deve ser lido por todos que querem explorar as potencialidades do mercado coreano  

A área metropolitana de Seul tem mais de 25 milhões de habitantes. As empresas que encontrem um importador ou distribuidor que cubra esta área metropolitana só precisam de se preocupar em ter escala para satisfazer a procura. O facto de serem uma economia aberta, levou os importadores e distribuidores coreanos a serem particularmente pró-ativos através da sua enorme associação empresarial – KOIMA. Já que não conseguem evitar que produtos estrangeiros concorrentes penetrem o seu mercado, mais vale montar um novo negócio sendo agente ou distribuidor de quem exporta para lá e ficar com 20-30%; é uma atitude inteligente que deve ser aproveitada pelas nossas empresas, e uma via especialmente útil quando associações empresariais vão promover produtos na Coreia.
Todavia, hoje em dia uma parte significativa e crescente dos consumidores coreanos (>10%) adquire uma panóplia infinda de bens estrangeiros através de compras online; existe até uma expressão – jikgoo-jok – para designar essa crescente  ‘tribo das compras diretas’. Uma das tarefas prioritárias da estratégia de entrada neste mercado devia passar por uma presença estruturada de empresas portuguesas nas principais plataformas/portais de vendas online – WeMakePrice, www.11st.co.kr, Coupang, G-Market; o mercado de e-commerce sul-coreano é hoje o 3.º maior da Ásia e o 7.º maior do mundo.

Os consumidores coreanos, com elevada propensão para o consumo, valorizam o marketing, o design, a diferenciação, produtos e nichos premium, bem como outros fatores (p. ex., os bens ou serviços em causa contribuírem para uma economia verde ou integrarem a economia criativa) que facilitam acrescentar boas margens ao bem ou serviço oferecido.

Nem tudo são facilidades, porém. 

As empresas portuguesas são desconhecidas neste mercado e não beneficiam de um branding positivo do país (como no caso da Itália, p. ex.). É necessário investir na promoção do nosso país e dos nossas empresas e seus produtos, até porque as empresas concorrentes das nossas e as agências públicas desses países investem fortemente neste apetecível mercado. Algumas naturais dificuldades na adaptação dos produtos ao mercado coreano (que beneficiarão com parcerias locais, desde logo com importadores e redes de distribuição local) poderão ser ultrapassadas com uma análise cuidadosa do setor e da concorrência e, em alguns casos, com comprovação de excelência dos nossos produtos. 

O fator linguístico é uma dificuldade que deve ser ponderada; não raro, nem sequer o responsável pelas operações internacionais de empresas coreanas fala (ou não fala bem) inglês.  E é necessário compreender que a sociedade coreana é bem diversa da maioria dos mercados ocidentais a que os empresários portugueses estão habituados; embora a distância cultural ou geográfica nunca tenha assustado os portugueses.

Por outro lado, a taxa de poupança das famílias tem vindo a subir e é estimada em cerca de 30-33%. O que lhes permite ter um significativo rendimento disponível para, entre outras finalidades, viajar.

Em termos de turismo, os visitantes provindos da Coreia continuam a aumentar em bom ritmo, De 2010 a 2016 houve um incremento de 42% (+ 26% entre 2015 e 2016). Curiosamente, o principal destino dos turistas coreanos na Europa é a Croácia (em parte graças à promoção do país feito na Coreia, em boa parte devido ao enorme efeito catalisador da série televisiva Guerra dos Tronos). Os dados do TravelBI Turismo de Portugal (TP) apontam para c. 120 000 visitantes coreanos em finais de 2017;  parte significativa alicerçada em turismo religioso (o cristianismo é uma das principais religiões na Coreia e muitos coreanos vêm regularmente a Fátima). Tudo isto sem um voo direto entre cidades dos dois países e sem qualquer promoção por parte do TP na Coreia. É absolutamente necessário que o TP passe a dedicar alguma atenção e a fazer promoção do país noutros mercados para além dos europeus e americano. Além do mais, a ausência de uma delegação do TP em Seul inibe a aposta por uma companhia coreana (a TAP parece incapaz de ter uma estratégia para além da área atlântica…) de lançar um voo direto. Pois se nem as autoridades de Portugal se interessam em promover o país, porque há de uma companhia aérea coreana correr o risco sozinha?

A Coreia é ainda um importante emissor de investimento direto no exterior (IDE) (16.º no ranking mundial). Uma parte significativa do IDE coreano advém, naturalmente, da internacionalização dos grupos coreanos, em especial dos chaebol, em busca de novos mercados e de novos locais onde os custos de produção sejam mais baixos. O pouco incentivo para aplicações financeiras domésticas também explica o ritmo crescente de IDE. As obrigações do tesouro e outras emitidas por grupos empresariais coreanos oferecem uma remuneração muito baixa. Várias entidades financeiras coreanas – o fundo soberano (KIC), fundos de pensões, grandes bancos e outras instituições financeiras – têm excedentes de liquidez e gerem portfolios de centenas de biliões de dólares. Após picos inflacionistas e especulação bolsista provocada por aplicações domésticas, todas estas entidades têm vindo a efetuar, em ritmo crescente, ‘investimentos alternativos’ no exterior. É muito importante que as nossas empresas, consultores e instituições bancárias e financeiras tenham perceção disso e se posicionem para o efeito. 

A colocação de Portugal e das empresas portuguesas no radar não é fácil. Desde logo porque a nossa promoção naquela parte do mundo tem sido quase nula, ao invés do que sucede quanto a muitos outros países; a título de exemplo, na delegação comercial de Espanha em Seul existem 4 (quatro) especialistas encarregues da promoção dos vinhos espanhóis… Mesmo assim, deve saudar-se a abertura em Seul, em outubro de 2015, de uma delegação da AICEP Portugal Global – ainda que assaz exígua e desprovida de meios, nomeadamente de pessoal local que permita ultrapassar a barreira linguística – e a designação de um scout de investimento para cobrir a Coreia; infelizmente compete-lhe cobrir também o Japão e isso transforma uma tarefa que já de si seria hercúlea – existem mais de 50 chaebol na Coreia… sem contar com o trabalho que necessita de ser feito junto de clusters, fileiras, empresas relevantes, entidades do setor financeiro, etc. – numa tarefa praticamente impossível. Infelizmente, a AICEP, não obstante ser a agência pública com maior vocação para a promoção económica externa de Portugal e das empresas portuguesas, vive estrangulada de recursos financeiros por manifesta miopia dos sucessivos governos portugueses, não obstante as eternas juras de empenhamento e os discursos bonitos para confortar almas e aliviar consciências.