No dia em que os Beatles terminavam as gravações do White Album, a 18 de setembro de 1968, chegava Electric Ladyland de Jimi Hendrix. Os dois acabam de ser reeditados no 50º aniversário – incluindo uma versão remasterizada do álbum de Hendrix, novas misturas, gravações inéditas, ensaios, fotos e notas de edição para ambos. Para os fãs, motivos redobrados para inserir o código do cartão e aumentar a coleção. Para o mundo, volta a agitar-se a bandeira de dois discos de profunda celebração da liberdade, simbólicos de um tempo de reformas políticas e sociais: o fim da Guerra do Vietname, a revolta estudantil do Maio de 68 e as experiências com drogas a despertarem novos sorrisos e sensações. Um tempo propício à provocação e subversão. E Woodstock a caminho – seria no ano seguinte.
Tanto o White Album como Electric Ladyland são longos, caóticos e provocadores. Ambicionam a reinvenção e refletem esse tempo de mudança. Ambos representam um antes e um depois. Tanto os Beatles, como Hendrix tinham atingido picos de popularidade e vendas, e queriam refugiar-se do ciclo pop de álbum, tops e digressões. Os dois álbuns são um teste. Um bater de asar para reaprender a voar. As «canções» são fruto de experiências sónicas onde se escutam os músicos a usar o estúdio como laboratório criativo. Mundos de aventuras que expandiram o vocabulário do rock, a partir de folhas em branco à espera de ser pinceladas com ideias nunca antes ouvidas.
White Album e Electric Ladyland são uma fotografia desse tempo com antecedentes próprios. Pela primeira vez, os Beatles e Hendrix tinham total liberdade no processo criativo. Brian Epstein, o manager dos quatro de Liverpool, tinha morrido em Agosto de 1967, enquanto Chas Chandler, o manager de Hendrix, deixara o guitarrista entregue a si mesmo durante as gravações do LP, em desacordo com o excesso de liberdade auto-imposto durante as sessões.
O vazio foi preenchido por liberdade criativa. Os Beatles puderam ter total controlo enquanto Hendrix trabalhou com o engenheiro de som Eddie Kramer para chegar ao resultado final pretendido. «Foi como se os estudantes se tivessem revoltado em França. A juventude é compreender o poder [que se tem]. [Antes] era muito o patrão e os seus pupilos. Isso naturalmente mudou com o sucesso e o poder. Eles queriam ter mais a dizer sobre o que faziam», conta o produtor George Martin numa entrevista de 1968 recapitulada nos textos de acompanhamento da reedição de White Album .
A analogia política estava como a revolta para a vontade de mudar o mundo mas nem os Beatles, nem Hendrix usaram a música como panfleto e em Revolution 1, John Lennon não esconde a ambiguidade com um ‘count me out/in’. Paul McCartney é subtil na alusão à luta pelos direitos civis em ‘Blackbird’, enquanto Hendrix toca de raspão nos motins da época em ‘House Burning Down’. Então como hoje, o mundo estava à espera de um novo amanhã e de uma banda sonora para acordar com granadas de esperança no futuro
A memória de White Album é agora lubrificada com as remisturas de trinta canções do produtor Giles Martin, filho de George Martin, acompanhadas por 27 versões acústicas e 50 gravações de estúdio, além de um livreto de 24 páginas e um cartaz dos quatro de Liverpool, quando já não eram uma boys band.
Electric Ladylan é reeditado com um disco de gravações privativas no Drake Hotel de Nova Iorque em 1968, titulado de At Last … the Beginning, um concerto da Jimi Hendrix Experience no Holllywood Bowl, um documentário sobre o álbum, som misturado em surround e as gravações originais também remisturadas. Na caixa, há um manuscrito de Jimi Hendrix a pedir à editora para usar uma foto de Linda McCartney à Experience com uma criança no Central Park de Nova Iorque na capa. O pedido só agora foi aceite, já que a edição original americana capta o esgar suado de Hendrix em concerto e a inglesa 19 mulheres nuas. 50 anos depois, a liberdade foi reposta. E a 28 de novembro chegaria Beggars Banquet dos Rolling Stones. Mas essa é uma outra história…