Alexandre Ribeiro fala a determinada altura em «revolução» e não é para menos. Este jovem ativista luso-francês, de 26 anos, nascido em La Rochelle, mas a viver em Bordéus, pretende a refundação da República francesa com «uma nova Constituição e uma VI República, com referendo para governar».
Desde a primeira hora na luta dos coletes amarelos – foi ele quem organizou a primeira manifestação em Bordéus, a 17 de novembro, que juntou 12 mil pessoas –, é radical na forma como olha para a abertura demonstrada agora pelo Presidente Emmanuel Macron: «Não há nada para discutir com um Governo que não escuta o seu povo».
«Nós só queremos um pouco mais de justiça social e mais democracia», acrescenta Alexandre Ribeiro, que reivindica a ideia da criação de «referendos populares» como forma de governar mais próxima dos eleitores. E garante que há outros portugueses e lusodescendentes nos coletes amarelos: «cruzei-me com muitos».
Licenciado em Contabilidade, filho de um português de Lisboa e de uma portuguesa de Guimarães, Alexandre Ribeiro tem um longo currículo de ativismo de causas sociais e operárias. «Há muitos anos que ando nas ruas a lutar por esta ou aquela causa social, seja a lei laboral ou a questão do asilo e da imigração», explica ao SOL num diálogo por escrito através do Facebook.
Já esteve ao lado dos «ferroviários, dos estudantes e, recentemente, dos assalariados da Ford que vão ser despedidos a poucos dias do Natal – é cruel!». «Em setembro, bloqueei muitos edifícios de fábricas para denunciar a Lei Elan [a lei da habitação que reforma o direito imobiliário e que entrou em vigor em novembro] que reduz a percentagem de habitações acessíveis para pessoas com deficiências», acrescentou.
Para o ativista, o movimento dos coletes amarelos começou por ser muito redutor nas suas exigências. «Acho uma pena que o movimento fosse apenas sobre a taxa de combustível. Fui um dos primeiros a apelar à convergência de lutas», explica.
Agora que o Governo recuou em aplicar a taxa de combustível, agrada-lhe o facto de os coletes amarelos continuarem em luta, porque há mais a exigir ao poder central que apenas um redutor imposto, por mais que esse tenha um impacto direto na carteira das pessoas. «Não sei se sou por alguma coisa, mas o meu primeiro objetivo foi alcançado».
Macron deixou que a corda fosse esticando em relação aos múltiplos grupos que se foram criando nas ruas, uns mais radicais outros mais moderados, sem perceber que a sua multiplicação era um sinal de estarmos perante algo mais do que uma simples subida do preço dos combustíveis. O Governo menorizou a rua, deixou a situação deteriorar-se e agora que acenou esta recuo, já não parece capaz de travar a luta na rua. Ribeiro é curto e grosso na sua apreciação das medidas anunciadas pelo primeiro-ministro, Édouard Philippe, esta semana: «Penso que estão a gozar connosco, para ser educado». Porque se «o Governo vai congelar o preço da energia durante seis meses» o que «acontecerá depois»?
O jovem ativista diz que «o movimento está em fase de estruturação e vai amplificar-se». A mobilização em Bordéus tem sido forte e os sete grandes coletivos que surgiram na região (Yellow Friday, Nord Gironde, Entre Deux Mers, Bassin d’Arcachon, o grupo da autoestrada A63, o do Langon e do Médoc) procuram agora unir-se, ao mesmo tempo que expulsam os elementos mais violentos. Porém, questionado sobre se está a ver o movimento a transformar-se em partido político, Alexandre Ribeiro é franco: «Não acho. Há demasiadas pessoas que não partilham dos mesmos ideais. Mas na revolução… acredito!».
De qualquer maneira, tal como acontece em Bordéus, os diferentes grupos procuram acercar-se por aquilo que têm em comum. «Somos diferentes, mas a maioria das reivindicações dizem respeito a toda a gente», explica. «E todos nós estamos de acordo com a ideia de maior justiça social e fiscal», acrescenta.
Este sábado, o Governo anunciou a mobilização de 89 mil agentes para tentar conter os manifestantes e impedir que os acontecimentos do passado fim de semana voltem a suceder. No entanto, ao ativista lusodescendente não lhe parece que isso vá mudar alguma coisa. Haverá manifestações, protestos e, «seguramente, serão ainda mais violentos».
A mobilização ter-se-á alargado a 20 mil ou 25 mil pessoas, de acordo com as adesões no Facebook, mas com uma capacidade de mobilizar metade dessas pessoas nas ruas. Todos eles têm em comum essa ideia de que não basta que Macron substitua Édouard Philippe como primeiro-ministro, também o próprio chefe de Estado tem de cair para que as ruas se acalmem. A dissolução da Assembleia Nacional é igualmente uma reivindicação comum aos grupos de coletes amarelos de Bordéus.