Nos seus discursos na cerimónia de entrega do Prémio Nobel da Paz de 2018 em Oslo, na Noruega, a ativista yazidi Nadia Murad e o médico congolês Denis Mukwege apelaram ao mundo para que abandone a indiferença e proteja as vítimas de violência sexual em conflitos armados. E, acrescentaram, esses atos continuam porque, em pleno séc. xxi, os seus responsáveis não são presentes à justiça. “Até agora, os perpetradores destes crimes que levaram a este genocídio [dos yazidi no Iraque] não foram levados à justiça. Não procuro mais simpatias; quero que esses sentimentos se transformem em ações no terreno”, desafiou Murad. A ativista condenou a inação da comunidade internacional perante os massacres da minoria iraquiana yazidi às mãos do Estado Islâmico – uma inação que, continuou, pode ser emendada se os Estados “providenciarem asilo e oportunidades de imigração àqueles que foram vítimas de genocídio”, contrariando assim a tendência europeia.
Mukwege também não esteve para palavras levianas no seu discurso, afirmando que “a indiferença está a comer por fora as nossas sociedades”. “O meu país é sistematicamente destruído com a cumplicidade de pessoas que se dizem nossos líderes”, denunciou o médico congolês. “Fechar os olhos a este tragédia é ser-se cúmplice. Os perpetradores da violência não são os únicos responsáveis pelos crimes, mas também aqueles que desviam o olhar.” E, passando das críticas internas para as internacionais, Mukwege denunciou que o povo congolês tem sido “humilhado, abusado e massacrado” à “plena vista da comunidade internacional” sem que nada aconteça aos responsáveis.
Os dois laureados com o Prémio Nobel têm experiências complementares sobre a violência sexual. Murad foi raptada e violada por militantes do Estado Islâmico em 2014 – o seu caso foi um entre as mais de 6500 mulheres e raparigas yazidi raptadas, violadas e vendidas como escravas. Segundo Murad, há mais de três mil mulheres e raparigas cujo destino ainda não é conhecido.
Já Mukwege dedicou toda a sua vida como médico e humanista a prestar assistência médica a vítimas de violência sexual nos consecutivos conflitos armados no Congo. Enquanto profissional de saúde, não se limitou a curar as mazelas físicas, mas também as psicológicas e até as sociais, acompanhando as suas pacientes e incluindo-as na sociedade – a sociedade congolesa ostraciza as vítimas de violência sexual.
A atribuição do Nobel da Paz chamou a atenção do mundo para o uso de violência sexual como arma de guerra em pleno séc. xxi.