À primeira vista, o título deste artigo parece apenas uma manifestação de vontade, com uma pergunta dirigida a todos. Mas é mais do que isso. Foi extraído na íntegra do texto teatral de um dos números da nova revista em exibição no teatro Maria Vitória – Parque Mania -, que o incansável lutador Hélder Freire Costa e a sua magnífica companhia nos oferecem. E que, desde já, recomendo vivamente.
Não quero falar muito da peça, para não retirar o interesse a quem lá a for ver. Mas também não posso deixar de registar (e de me interrogar também) como é possível, nos dias de hoje, construir um espetáculo com tanta qualidade e excelentes interpretações. É fantástico! Estão todos de parabéns!
Coincidência ou não, esteve há dias na minha consulta uma senhora na casa dos 80 anos com os problemas inevitáveis dessa avançada idade a nível físico, mas essencialmente queixando-se das dores da alma – muito comuns nessa faixa etária, onde entra a solidão (por falta de gente nova na família), a tristeza, o desânimo e o desinteresse por tudo. Quando lhe perguntei se via televisão, a resposta não se fez esperar: «Para quê? Só para ver desgraças?». Fiquei em silêncio, sem saber ao certo como devia responder, e lembrei-me da minha sogra, de saudosa memória, que dizia convictamente «Recuso-me a ver telejornais!», invocando o mesmo motivo.
E, de repente, vejo-me conduzido para o palco do teatro, cuja rábula, da autoria de Renato Pino e primorosamente interpretada pelo talentoso Flávio Gil, já por mim citado nestas colunas, vem ao encontro dos verdadeiros problemas sentidos pela população.
O texto é um hino à esperança e uma chamada de atenção para as pequenas coisas boas da vida, tantas vezes ignoradas, ou a que não damos o devido valor, visto estarmos a ser constantemente bombardeados com notícias que trazem consigo desgraça, destruição, sofrimento e terror.
O número da revista começa com a projeção de imagens relativas a notícias nos vários canais de televisão, com um denominador comum: a violência. Ao entrar em cena, o autor diz: «É isto que nos mostram diariamente. São estas as imagens que querem que fiquem bem guardadas na nossa memória. Só não percebo por que é que fazem o mundo parecer tão pesado, quando a leveza custa exatamente o mesmo a mostrar. Não precisamos que nos digam que o mundo vai mal, precisamos é que nos lembrem e nos digam que o mundo não tem de ser assim. Quando é que a boa notícia virá à frente da desgraça, da morte, do ódio deste fim do mundo que nos vendem diariamente? Nós precisamos de acreditar que o amor não é uma batalha perdida, mas sim a única que podemos vencer todos os dias».
A letra da canção que se segue é suficientemente clara e dispensa comentários: Ainda há tempo/Levanta os olhos do chão/Ainda há tempo/Para vencer a solidão/Ainda há tempo/Para fazer o que é preciso/Ainda há tempo para ganhar mais um sorriso.
«A simples mudança de que todos continuamos à espera pode começar por si, por mim, por nós…» – mas é fundamental e urgente, acrescento eu. «Quando é que um telejornal vai começar com a notícia que nos fala daquela mãe que conseguiu salvar um filho, daquele carro que conseguiu travar a tempo, daquela pessoa que dedica todos os dias um pouco do seu tempo a cuidar dos outros?».
Não seria bom, pergunto, um telejornal acabar sempre com uma mensagem de esperança?
Não nos esqueçamos que a televisão é a grande companhia dos idosos – e, por isso, é necessário um cuidado especial com as imagens a mostrar. Por que será que as coisas más desta vida se têm de sobrepor às boas? Só a desgraça é que é notícia? Que temos nós a esperar do comportamento dos idosos se o panorama à sua volta for assim tão negro? Que mensagem podemos incutir-lhes se não tivermos alternativas para lhes propor?
Conscientes das nossas possibilidades, voltando ao refrão da canção final: Por isso há que acreditar/Encontrar novo sentido; e assim o mundo pode ser um lugar melhor. Não tenham medo.
Meu caro Flávio, aceitamos a tua escolha. Queremos todos ser felizes!