Basta acreditar

Em Portugal, salvo uma ou outra exceção, a medicina tem acompanhado o progresso do estrangeiro

Nos últimos anos – não é novidade para ninguém -, a medicina tem evoluído em praticamente todas as áreas, o que é muito gratificante e é sempre bom enaltecer. 

Com tanta coisa à nossa volta a desviar-nos a atenção, quase não damos conta dos progressos que se fizeram nesta área nem valorizamos as vitórias alcançadas. 

É próprio do ser humano olhar apenas para as falhas, para os erros, para as limitações; no fundo, dá-se mais valor àquilo que não se tem e aponta-se logo o dedo quando algo corre mal, esquecendo as melhorias ou os avanços conseguidos. 

Em Portugal, salvo uma ou outra exceção, a medicina tem acompanhado o progresso do estrangeiro. Na devida proporção, é certo, mas pode dizer-se que hoje não vale a pena procurar lá fora o que, graças a Deus, já existe entre nós. Longe vão os tempos em que uma pessoa portadora de uma doença grave (oncológica, neurológica, oftalmológica, cardiovascular, entre outras) era obrigada a procurar ajuda no exterior, pelas inúmeras insuficiências no nosso meio. 

Quando era jovem, lembro-me de ouvir o meu pai dizer que um doente tinha ido aos Estados Unidos ou a Londres – e logo percebíamos a gravidade da situação.

Hoje em dia tudo mudou. Os tempos são outros e esse procedimento já não faz muito sentido. Porém, como em tudo na vida, ainda encontramos aqui e além ‘saudosistas’ desse modo de estar na vida e que em situações mais complicadas continuam a ‘piscar o olho’ ao estrangeiro – como se o nosso país já não estivesse à altura de resolver os problemas e não fosse capaz de encontrar a melhor solução para os ultrapassar. 

A esses ‘saudosistas’ aqui fica um testemunho que deixo à consideração dos leitores sem comentários, por serem absolutamente desnecessários.

Uma doente na casa dos setenta anos era portadora de uma doença oftalmológica que lhe causava diminuição da visão e lhe retirava qualidade de vida e alegria de viver.

Como não tinha problemas económicos, decidiu consultar particularmente um conceituado oftalmologista fora de Lisboa, considerado por muitos um dos melhores do país. Este especialista era conhecido pelas novas técnicas que utilizava, representando assim uma nova esperança para os muitos doentes que a ele recorriam diariamente. 

Não era fácil arranjar consulta – mas, a muito custo, lá conseguiu marcá-la. Homem de poucas falas, muito prático e desembaraçado, o médico não precisou de muito tempo para, depois de a observar, lhe dar o seu parecer: «Minha senhora: a sua doença não tem indicação cirúrgica. Sabe-se muito pouco acerca dela e o tratamento médico pouco resulta. Poupe a visão que tem». 

Dececionada, a doente não se conformou com as palavras derrotistas do médico, nem com o pouco tempo de consulta – e, insatisfeita, quis ouvir uma segunda opinião. 

Ouvindo falar de uma clínica famosa em Barcelona, não hesitou. Aí, tudo foi diferente. A consulta foi precedida de numerosos exames complementares, de uma história clínica feita pelos assistentes, a que se seguiu uma observação minuciosa pelo especialista mais graduado e tudo isto no espaço de dois ou três dias. 

A doente estava fascinada com todo este aparato e ansiosa por se encontrar frente a frente com o professor. Chegado o momento mais aguardado, o ‘chairman’ reuniu a documentação existente, observou de novo a doente e por fim ditou a sentença: «Minha senhora: a sua doença não tem indicação cirúrgica. Sabe-se pouco acerca dela e o tratamento médico pouco resulta. Poupe a visão que tem».

 

Esta história real, contada pela própria, é uma verdadeira lição para todos nós – e não só para aqueles que continuam a acreditar que só no estrangeiro existe a resposta e a solução ideal para o tratamento de todos os males. 

Já é tempo de acabar com esse mito, e este episódio é uma prova disso mesmo. A nossa medicina está ao nível das melhores – e, no tocante a certas doenças oncológicas, não é demais dizê-lo, os protocolos de atuação são idênticos em qualquer parte do mundo.

Confiemos nos nossos profissionais e nas nossas instituições. É preciso que os doentes saibam ouvir os médicos – como os médicos devem saber ouvir os doentes e falar com eles. Se caminharmos neste sentido, os resultados irão aparecer. Tenhamos esperança. Basta acreditar!