Um vídeo mostra que dois elementos do PNR, entre os quais João Patrocínio, candidato do Partido Nacional Renovador (PNR), de extrema-direita, às eleições europeias de 2019, intimidaram, esta sexta-feira de manhã, perto de Picoas, em Lisboa, Mamadou Ba, dirigente da associação SOS Racismo.
Aos gritos, enquanto o segundo elemento filma, Patrocínio interpela, num tom ameaçador, Mamadou Ba acusando a SOS Racismo, associação pela igualdade racial, de promover o "ódio racial". "O ódio racial é promovido por vocês, pela vossa associação", diz o ex-candidato às europeias pelo partido de extrema-direita.
O outro elemento, Carlos Teles, que o i conseguiu identificar, mantém-se atrás do telemóvel enquanto filma, disse: "Tu não tens que ter medo, tu tens de ser confrontado". Ao que Mamadou Ba diz que lhe fizeram uma espera. Depois, também aos berros, acusa Mamadou Ba de querer destruir a sociedade, acusando-o de ser traidor.
Carlos Teles tem, na sua página de Facebook, imagens de Jair Bolsonaro, presidente do Brasil de extrema-direita, com a descrição: "Vêm como as frases dele ofendem os nossos pulhiticos".
Patrocínio e Carlos Teles acusaram Mamadou Ba de viver à custa dos impostos dos portugueses, mas a verdade é que o dirigente da SOS Racismo desconta para a segurança social, à semelhança de tantos outros cidadãos de nacionalidade estrangeira.
Com a intensidade da interpelação a subir de tom, vários trausentes aproximam-se para evitar possíveis agressões, perguntando se está tudo bem. Um outro, de telemóvel na mão, filma a interpelação.
Desde que escreveu no Facebook uma publicação a caracterizar a polícia como "bosta de bófia", na sequência da intervenção policial no Bairro da Jamaica, no Seixal, que Mamadou Ba já recebeu centenas de mensagens de ódio e ameaças pela rede social, muitos deles provenientes de elementos de extrema-direita. Em declarações ao Jornal de Notícias, Mamadou Ba admitiu que teme pela sua vida e que os últimos dias têm sido "os piores da sua vida". "Temo pelo que possa acontecer-me", admitiu o dirigente associativo. "Estou a viver os piores dias da minha vida, mas não vou parar a minha luta", garantiu, explicando que já está habituado a receber ameaças pelo papel que desempenha em defesa das comunidades negras e ciganas no país em casos de discriminação racial e violência policial.
"Há muitos anos que recebo insultos, quase todos eles passando pela animalização do negro, nada no entanto que se compare à violência que estou a viver há dois dias", lamentou Mamadou Ba.
O vídeo da interpelação, que já tem mais de 23 mil visualizações, foi partilhado várias vezes por membros do PNR, entre os quais Augusto Martins, conselheiro nacional do PNR e dirigente do partido em Santarém. Nas centenas de comentários ao vídeo, agora no perfil de Carlos Teles, podem ler-se frases racistas e xenófobas. "Fora com esse negroide de merda", lê-se entre os comentários. "Mandem o macaquinho para o país dele, gosto tanto deles cá como eles de nós lá", escreveu outro. E os comentários deste género sucedem-se.
No entanto, há quem, entre os comentários de ódio, saia em defesa de Mamadou: "Este vídeo para mim é vergonhoso!! Por isso é que Portugal é pequenino! Mentalidade de gente parola nojenta! Sejam brancos, pretos ou amarelos têm tanto direito a estar aqui como nós a lutar por uma vida melhor!", acusando-os de serem "racistas nojentos".
Nos últimos dias, uma carta, com o título "Obrigado/a Mamadou", em solidariedade com Mamadou Ba recolheu mais de duas mil assinaturas. O documento agradece ao dirigente da SOS Racismo a sua "incansável luta contra o racismo, as desigualdades e todas as formas de discriminação em Portugal", relembrando que Mamadou Ba tem sido alvo de "insultos, perseguições, ameaças de morte, tentativas de ridicularização constantes".