Foi como “preso político” que Oriol Junqueras, antigo vice-presidente no governo regional catalão se apresentou perante o Ministério Público e os juízes do Supremo Tribunal espanhol no terceiro dia do julgamento dos 12 líderes catalães envolvidos no referendo e na declaração unilateral de independência da Catalunha. “Considero-me um preso político”, disse Junqueras logo no início do seu testemunho, depois de ter avisado que não iria responder às perguntas da acusação.
“Sou acusado pelas minhas ideias e não pelas minhas ações. Estou num julgamento político, não vou responder às perguntas da acusação. Fui destituído pela aplicação do artigo 155 [da Constituição espanhola] e a partir desse momento considero-me preso político”, declarou o antigo vice-presidente do executivo de Carles Puigdemont.
Toda a intervenção de Junqueras seguiu a premissa deste ser um caso político e não judicial, daí que tenha falado do seu percurso na política, os ideais do seu partido, a Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), e defendeu o direito do povo catalão à autodeterminação: “Esse direito deve ser reconhecido”.
“Trabalhar pela independência da Catalunha de forma pacífica não é um crime. Votar num referendo não é crime. Nada do que fizemos é crime”, desafiou Junqueras, garantindo que essa é uma luta que não o faz deixar de “amar Espanha, o povo espanhol e a língua e cultura espanholas”. Junqueras optou por falar em espanhol, apesar de o tribunal ter dado aos acusados possibilidade de testemunhar em catalão.
Falando das acusações, Junqueras garantiu que os 12 líderes catalães acusados de rebelião, desvio de fundos públicos e desobediência não são apenas independentistas. “Somos muitas outras coisas além de independentistas, somos democratas e republicanos. Defendemos a igualdade de oportunidades e a justiça social”, disse.
Junqueras não tem dúvidas de que o julgamento é responsabilidade do governo de Mariano Rajoy, que acusou de ter preferido “transferir a responsabilidade política para os tribunais”. “Tentámos sentar-nos à mesa de negociações e a cadeira oposta estava sempre vazia”, disse, acrescentando que o governo espanhol “transferiu a sua responsabilidade política para os tribunais”, tratando-os a eles como “inimigos”.
Opinião partilhada por Joaquim Forn, antigo ministro do Interior, que, aceitando responder às perguntas da acusação, revelou ter tentado marcar várias reuniões com o governo de Madrid após o referendo, sendo sempre recusadas. Sem resposta, os independentistas ponderaram convocar eleições para evitar a ativação do artigo 155 da Constituição espanhola e, temendo que essa decisão não o evitasse, avançaram para a declaração de independência unilateral (DIU). “A DIU não foi votada, foi lida”, afirmou, explicando que foi uma “declaração política” sem poder vinculativo.
Sobre a violência registada no dia do referendo independentista, 1 de outubro de 2017, Junqueras negou a violência do lado catalão: “As manifestações foram sempre exemplares, sempre sem o menor incidente”. “Nunca apoiámos qualquer reação violenta ou tentámos uma”, disse.
Recusar a violência é fundamental na estratégia de defesa dos arguidos por o crime mais grave, o da rebelião, pressupor atos violentos. Só por este crime, Junqueras enfrenta uma sentença que pode ir até 25 anos de prisão se for considerado culpado – nas alegações iniciais os advogados de defesa atacaram a “imparcialidade” do tribunal.
No decorrer das investigações o Ministério Público fez uma rusga ao gabinete de Josep María Jové, número dois de Junquera, e encontrou um documento apelidado “Enfocats”, um plano para a independência da Catalunha. Tornou-se numa das principais provas contra os arguidos e Junqueras foi confrontado com ela pelo seu advogado, Andreu Van den Eynde. “Não o conhecia, nunca o tinha visto. É um documento extravagante e apócrifo. Não conheço ninguém que tenha visto esse documento antes”, revelou.