Marquês. Sócrates responde ao ataque à notícia de que poderá perder o mestrado francês

Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po) admite retirar mestrado a Sócrates por fraude se se provar que foi Domingos Farinho a fazer a tese a troco de dinheiro

José Sócrates respondeu este fim de semana com um ataque à notícia de que a universidade francesa onde estudou admite tirar-lhe o mestrado. Os responsáveis do Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po), da Université Sorbonne Paris Cité, referiram ao “Expresso” que estão a acompanhar a evolução da Operação Marquês e que as acusações contra o ex-primeiro-ministro português são sérias, nomeadamente as que dizem respeito a alegados pagamentos a Domingos Farinho para fazer a tese de mestrado.

Agarrando-se ao facto de o jornal ter referido que era a Sorbonne (existem várias instituições assim denominada) que ponderava retirar o título, José Sócrates disse que o seu título era do Science Po tentando assim desmentir a notícia: “[É] difícil tirarem-me o que nunca tive. O meu mestrado foi obtido em Sciences Po”.

E insistiu que Domingos Farinho, professor da Faculdade de Direito de Lisboa, “não escreveu nenhuma parte” da sua tese de mestrado – Perdre La ‘Confiance Dans Le Monde’ – Discussion sur la torture en Démocratie –, contrariamente ao que o Ministério Público defende. Segundo os investigadores da Operação Marquês, Farinho terá sido o verdadeiro autor tendo-lhe sido pago 40 mil euros pelo trabalho.

O certo é que àquele semanário os responsáveis da Universidade de que faz parte o instituto onde Sócrates estudou não deixaram margens para dúvidas: “Temos conhecimento do processo judicial contra o Sr. Sócrates, que inclui a acusação de branqueamento de capitais a favor do Sr. Domingos Farinho, suspeito de ter contribuído para a tese de Sócrates.”

O diretor de comunicação da universidade, Jérôme Guilbert, acrescenta ainda: “Entendemos que a acusação é séria o suficiente para considerarmos a retirada por fraude do diploma emitido”.

Ainda assim, a universidade prefere não se antecipar à justiça portuguesa: “Estamos a aguardar que haja uma decisão do tribunal para tomarmos uma decisão”. Ou seja, a universidade admite que uma condenação no âmbito da Operação Marquês pode vir a ser razão suficiente para retirar o grau académico a José Sócrates.

Como o Semanário “Sol” revelou em 2017, o livro “A Confiança no Mundo – Tortura em Democracia” que, segundo Sócrates era uma adaptação da sua tese, terá sido feito por Domingos Farinho. Esse é, pelo menos, o entendimento do Ministério Público, sustentado nas conversas que foram intercetadas. A 21 de janeiro de 2013 foi enviado um email a Sócrates em que se referia: “Trabalho em desenvolvimento”.

E, ainda segundo o “Sol”, um mês depois, a 19 de fevereiro, Farinho dá-lhe de novo notícias: “A minha preocupação foi, sobretudo, a de completar a estrutura da introdução. No capítulo histórico, fiz a formatação principal mas já não consegui formatar o texto e as notas de rodapé (estou a acabar de escrever agora), pelo que o farei hoje à tarde.”
 Sócrates ia acompanhando a par e passo o desenvolvimento do livro e Farinho pedia-lhe que fosse comentando as passagens que ia apresentando: “Ainda não está completo”, escreveu num email enviado a 7 de março. “Creio conseguir acabar amanhã. Mas não queria deixar passar mais um dia sem mostrar-lhe o que já tenho e também dar-lhe a possibilidade, caso queira, de comentar o que já escrevi de novo.” 

Num outro email enviado a 20 de março refere: “Fiz poucas alterações na parte da história antiga, pois comecei a ler a história da tortura que recebi hoje. Amanhã envio-lhe nova versão com mais elementos bibliográficos integrados na história antiga.”

Ao longo das conversas que mantinha com o ex-ministro, Farinho ia dando também a sua opinião quanto à forma como o texto deveria ser estruturado, como se vê num email que lhe enviou a 2 de abril: “Dado que me parece sobretudo interessante como questão jurídica – a tratar no último capítulo –, por favor diga-me se acha que merece maior destaque do que aquele que lhe dei neste capítulo histórico.”

Para além disso, o catedrático anotava sempre as novas partes que ia escrevendo, para que o antigo primeiro-ministro pudesse dar a sua opinião sobre a forma como o texto estava a ser redigido: “Deixei a amarelo as partes novas, para revermos”, lê-se num email enviado a 17 de abril.

As escutas telefónicas recolhidas pelo MP também corroboram esta acusação. Em outubro de 2013, Sócrates depara com uma parte do texto que não entende – uma citação da jornalista francesa Marie Monique Robin – e decide contactar Domingos Farinho. “Lembro-me dessa citação, impressionou-me”, afirma o professor. “Por isso é que a incluí [no texto].”

Com Felícia Cabrita