O debate parlamentar sobre a defesa do Serviço Nacional de Saúde, proposto pelo PCP, acabou ontem por servir também para discutir o problema que opõe a ADSE – o subsistema de saúde dos funcionários públicos e os privados. A ministra da Saúde, Marta Temido, começou por dizer que existe a perspetiva de “que será possível chegar a um acordo com os prestadores privados”. Uma solução, assegurou, que não belisque “aquilo que são as regularizações e o processo a elas associado”. Mas a pressão do PCP e do Bloco de Esquerda contra “a chantagem” dos privados junto da ADSE levou Marta Temido a ir mais longe no discurso. A governante admitiu recorrer a todos os meios para defender os beneficiários da ADSE, os funcionários públicos e pensionistas que o financiam.
“É evidente que não pactuaremos nunca com qualquer chantagem de onde quer que ela venha e é evidente que utilizaremos todos os meios que ao nosso dispor existem, como já o fizemos relativamente a outros temas, para defender os beneficiários da ADSE”, defendeu Marta Temido, numa breve referência indireta à requisição civil de enfermeiros, depois de mais um anúncio de greve cirúrgica. O i tentou obter dados adicionais junto do Ministério da Saúde sobre quais os meios a que o governo pode recorrer, caso não seja possível qualquer acordo, mas não obteve respostas concretas. A ordem, para já, é para assinalar que existe um entendimento à vista. Um dos pontos mais críticos são os 38 milhões de euros que o subsistema de saúde da Função Pública reclama de regularizações dos privados. O processo tem-se arrastado com a suspensão anunciada de convenções por parte de quatro grupos privados, mas ontem, a presidente do conselho diretivo da ADSE, Sofia Portela, assegurou que irá apresentar uma nova tabela de preços aos privados “dentro de muito pouco tempo” para dialogar com o setor privado.
Mas, o discurso anti-cedência no debate parlamentar teve vários momentos, sobretudo em resposta da ministra a perguntas da deputada comunista Carla Cruz ou do deputado Moisés Ferreira, do Bloco de Esquerda. “A eventual chantagem de alguns operadores privados, sobre qualquer mecanismo seguro, seja ele este ou outro, será certamente algo a que nunca poderemos ceder”, afirmou Marta Temido, na segunda ronda de perguntas de uma discussão sobre o futuro do SNS.
A intervenção inicial de Marta Temido serviu, sobretudo, para passar a mensagem de que o dinheiro não chega para responder a todas as reivindicações dos trabalhadores. “O governo não pode esgotar toda a capacidade de investimento de que dispõe (e que resulta da capacidade coletiva de gerar riqueza)” nos 128 445 trabalhadores do Serviço Nacional de Saúde (SNS), avisou a governante, lembrando ainda que o executivo gastou mais 1400 milhões de euros na atual legislatura face à anterior.
A deputada comunista Carla Cruz considerou, por seu turno, que as reivindicações do setor da saúde são justas, mas existem “processos controversos e perigosos, como o da greve às cirurgias, que visam objetivos alheios aos interesses de todos os enfermeiros e contribuem para atacar o Serviço Nacional de Saúde”. Ou seja, o PCP criticou a greves cirúrgicas dos enfermeiros. O PCP acrescentou também que não se avançou mais na defesa do SNS, na atual legislatura, por “falta de compromisso” do PS.
Por fim, Marta Temido anunciou que já há um acordo com a indústria do setor para reduzir o sal, o açúcar e “gorduras trans em certo tipo de alimentos”, em nome da saúde pública.