O motivo desta intervenção é, no entanto, menos a questão da regionalização em si mesma e mais o sentido de oportunidade do debate, num momento tão particular da vida política portuguesa. Não coloco em causa, evidentemente, a legitimidade de todos os agentes que entenderam, por bem, trazer esta discussão para a opinião pública, certamente eivados da melhor das intenções e em defesa das suas convicções regionalistas. Mas, na minha perspetiva, recuperar a regionalização como tema, defendê-la como uma prioridade política e reivindicar a sua concretização, não faz qualquer sentido neste momento.
Desde logo, porque estamos a viver um calendário eleitoral, em plena pré-campanha para as eleições europeias e que se prorrogará até 6 de outubro, dia em que se realizam as legislativas. Nesse sentido, não é difícil compreender que o debate sobre um tema tão disruptivo e estruturante como este, feito num quadro com estas particularidades, será prejudicado na serenidade, ponderação e seriedade de argumentos que se exige. A tendência será sempre a de centrar a discussão no plano partidário e não no plano político – que é onde deve estar situada – contribuindo para que se gere mais confusão, demagogia e, passe a expressão, politiquice.
Acresce, a este facto, estar em curso a transferência de competências do Estado Central para as autarquias. Concorde-se ou discorde-se, seja na substância, seja na forma ou no procedimento (e é lamentável que esteja a decorrer a ‘conta gotas’, sob um manto de opacidade), importa que a descentralização se concretize e se consolide, antes de emergir qualquer debate sobre a regionalização. Por um motivo simples: existem sérios riscos de haver sobreposição de competências nos dois processos, em diversas matérias, o que só vai contribuir para anular a relevância da reforma que está em curso.
Finda a implantação da transferência de competências, que ocorrerá, segundo a Lei Quadro, em 2021, feito o respetivo balanço do processo, será então a oportunidade e o tempo de um novo debate sobre a regionalização, que não se quer inquinado, mas sim aberto, sereno e o mais esclarecedor possível.
Sabendo que, a priori, qualquer discussão sobre regionalização terá uma forte carga de parcialidade e emotividade, é importante que se clarifiquem as questões verdadeiramente relevantes: qual o mapa de regiões contemplado – um novo, ou a reciclagem do de 1998?; que competências serão exercidas pelas regiões administrativas – são delegadas pelo poder central ou saem dos municípios, que estão a recebê-las no âmbito da descentralização? Serão regionalizadas as despesas e as receitas fiscais?; e, a mais importante, qual o modelo de governação a adotar – parlamento e governo regional?
Muitas questões para resolver e que tornam, no mínimo, precipitada esta tentativa de colocar o tema na agenda política. No tempo certo, estarei disponível para o debate.