Os ciclistas desconcertam-me

Ia de carro a subir uma rua de sentido único quando na curva me deparo com pai e filho de bicicleta a descerem descontraidamente em contramão e a olhar para trás. Se eu viesse a fazer o mesmo teríamos todos um grande problema. E é isto que sinto sempre que me cruzo com ciclistas: raramente…

Ia de carro a subir uma rua de sentido único quando na curva me deparo com pai e filho de bicicleta a descerem descontraidamente em contramão e a olhar para trás. Se eu viesse a fazer o mesmo teríamos todos um grande problema. E é isto que sinto sempre que me cruzo com ciclistas: raramente cumprem as regras de trânsito. Sinto-me quase mãe deles. Se não fôssemos nós automobilistas a poupá-los, certamente grande parte deles já não estaria inteiro. Ainda há pouco tempo uma médica que trabalhou no INEM me disse que os acidentes de bicicleta não são assim tão raros e também nada bonitos de ver. Imagino. Quanto a mim, se não os há mais não é por os ciclistas serem condutores exímios, mas por os automobilistas terem um cuidado extremo para que nada lhes aconteça quando lhes surgem a atravessar uma passadeira, a andar em sentido contrário ou quando formam filas de trânsito infindáveis atrás de si em estradas em que ninguém quer correr o risco de os abalroar. Dada a sua vulnerabilidade tornam-se os senhores da estrada e quanto maior e mais largo o carro, maior o respeito que lhes tem.

Honestamente os ciclistas desconcertam-me porque me deixam de coração nas mãos. Lembro-me de quando ia pôr o meu filho à escola e me cruzava diariamente com um colega de seis anos e o pai que seguiam de bicicleta por uma estrada movimentada. Fazia-me sempre confusão o pai ir à frente deixando o filho para trás sozinho. Mas o contrário – ir o filho a abrir caminho entre os carros – não seria melhor. Para mim, nenhuma equação que envolva crianças, bicicletas e carros é boa. Felizmente depois mudámos de casa e deixei de temer pela vida daquele menino todos os dias.

Já nos passeios são os peões as vítimas, porque apesar da legislação prever que só as crianças até aos 10 anos podem andar neles de bicicleta, veem-se muitos meninos de 30, 50 e 60 anos a fazê-lo. Ainda no outro dia vinha uma rapariga de 30 e tal anos numa espécie de marcha de urgência a descer o passeio de uma movimentada avenida de Lisboa, sempre a buzinar, a alta velocidade. Quem não quisesse apanhar com aquela espécie de projétil que se desviasse.

Agora que vivo quase no campo, quando vou a Lisboa parece-me uma cidade louca. Mesmo onde houve obras imensas que causaram o caos durante meses e se criaram ciclovias, as bicicletas e trotinetas cruzam-se em estradas e passeios sem qualquer respeito pelos peões.

Há pouco tempo o Governo decretou que se iria ensinar a andar de bicicleta na escola. Na altura achei uma boa medida porque na minha ingenuidade pensei que estivesse em causa o desenvolvimento pessoal dos mais novos. Só depois percebi que o objetivo era aumentar a utilização de bicicletas 15 vezes até 2030. Há vários sítios do nosso acidentado país onde é praticamente impossível andar de bicicleta, não só pelas condições físicas mas porque os carros são mais que muitos e não deixarão de o ser enquanto não forem criadas alternativas que funcionem mesmo. Veremos como – e à custa do quê e de quem – esta meta será cumprida.

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