Conseguir 1080 likes num post no Facebook não é, para uma pessoa comum, tarefa fácil. Para os “famosos” (artistas, celebridades, personalidades conhecidas), este número até é pouco. Mas, para todos, é bem verdade o que diz a frase – esses likes são “uma mão cheia de nada” e, como acrescentava Irene Lisboa, “outra de coisa nenhuma”. São puro vazio. Mas um vazio que afaga o ego, que nos dá a sensação de não estarmos sós, que cria a ilusão de que há outros à nossa volta que se preocupam connosco, com o que escrevemos, com o que partilhamos, com a imagem que transmitimos de nós. Ao vermos o número de likes aumentar, sentimos que faz algum sentido aquilo que colocámos online.
Muitas pessoas usam o Facebook para partilhar a sua opinião sobre o estado do País, sobre acontecimentos políticos atuais e trocar impressões, sobre esses temas, com as pessoas que conhecem, como se estivessem numa tertúlia. Outras pessoas usam o Facebook para divulgar fotografias das viagens que fazem, partilham com quem não vai algumas imagens daquilo que veem e consideram ser importante dar a conhecer. Pessoas há, igualmente, que aproveitam para, no Facebook, retomar contacto com parentes distantes ou para saber como estão ou o que fazem as pessoas de quem gostam. Há, também, quem recorra ao Facebook para publicar textos que, muitas vezes, poderiam figurar como crónicas num jornal; textos demasiado sucintos para serem publicados em papel; poemas; capítulos de uma prosa que um dia se torna livro. Há, ainda, quem veja o Facebook como um meio para anunciar datas de lançamentos de livros, conferências, exposições, concertos… Há quem faça tudo isto em diferentes momentos. E, depois, há aqueles que utilizam o Facebook de forma abusiva, para empolar situações, criar quezílias, armar uma batalha em torno de um assunto de que discordam ou sentem que devem defender quase com a própria vida.
Em qualquer dos casos, importa que os utilizadores desta chamada «rede social» saibam e tenham consciência de que a vida vive-se lá fora, fora do ecrã, fora das paredes onde consulta o computador ou o telemóvel e, muitas vezes, fora de si. Um abraço transmite calor e cheiro, um beijo indica proximidade, um sorriso transporta empatia. E, como avisa poeticamente Tolentino Mendonça: «Mesmo que faça frio / não aproximes do fogo / um coração de neve.»
Não há nada como a vida, aquela a que passou a chamar-se «vida real», a única que efetivamente existe e da qual cada um de nós é o protagonista, e que, em época de Páscoa, assume promessa de renovação e de esperança.
Tendo consciência disto, somos capazes de relativizar o que é dito no Facebook ou em qualquer outra aplicação e articulá-lo com a vida quotidiana, em que, se pudéssemos, por vezes, não colocaríamos like, mesmo sabendo que os aspetos negativos também fazem parte da vida e nos ajudam a equacionar devidamente e equilibrar o que nos acontece. Como diz Tolentino Mendonça: «Nem sempre a sombra é o contrário da luz, como a árdua fadiga de viver não é o contrário da felicidade. São etapas do mesmo rio que corre». Importa, pois, ter consciência desta verdade, em todos os momentos da vida, no meio de tanta revolução, da nossa liberdade e dos beijos que trocamos.