Os pais de hoje

No retrato dos pais de hoje posam adultos stressados e sem tempo que não tiram os olhos do telemóvel para ouvir o filho. Há até vários artigos que alertam para este fenómeno. Não é um retrato totalmente errado, mas só apanha um ângulo do cenário. É verdade que os empregos roubam cada vez mais tempo…

No retrato dos pais de hoje posam adultos stressados e sem tempo que não tiram os olhos do telemóvel para ouvir o filho. Há até vários artigos que alertam para este fenómeno. Não é um retrato totalmente errado, mas só apanha um ângulo do cenário.

É verdade que os empregos roubam cada vez mais tempo às famílias e que os filhos são os mais prejudicados. Em casa tenho o exemplo vivo disso, se há filhos que jantam com o pai sete vezes por semana, os meus jantam sete vezes por mês.

Também é verdade que acrescem ao tempo de trabalho uma série de afazeres que contribuem para que parte da vida seja feita a correr. Muitos relacionados com os próprios filhos, como levar à escola, aos treinos, a festas, a jogos, etc.

As novas tecnologias também não têm ajudado, porque outra fatia do pouco tempo que resta muitas vezes é usada atrás delas, seja a contactar com amigos, a resolver assuntos pendentes, a fazer listas de coisas que não podem ficar esquecidas, a adiantar algum trabalho, a efetuar pagamentos ou simplesmente nas redes sociais.

Não podemos censurar. As 24 horas do dia são poucas para tantas exigências. Mas além de tudo isto, do outro lado do ângulo, descobrimos pais dedicados, preocupados e próximos dos filhos. O tempo é importante, mas não é tudo. Se antigamente os pais tinham mais tempo, não acredito que estivessem mais disponíveis. Há minutos que valem horas e há horas perdidas que têm pouco valor.

Nunca se viu tantos pais em parques infantis, tantos pais a brincar com os filhos, homens a cuidar de bebés, mães a amamentar filhos quase até terem idade para beber Coca-cola, licenças de parentalidade que – apesar de ainda não satisfazerem – vão no sentido ascendente, a procura permanente de respostas em livros, artigos e workshops para as dúvidas que o crescimento e desenvolvimento destes pequenos aliens nos colocam, ou até mães que vão à casa de banho com os filhos ao colo para eles não ficarem a chorar. Sem desfazer nos pais de antigamente, estes de hoje, que têm sido tão criticados pelos efeitos nefastos que o seu stress e falta de tempo pode ter nos mais pequenos, fazem das tripas coração para serem os melhores do mundo.

Estão extremamente próximos, baixam-se cada vez mais para ouvir, para abraçar ou para beijar. Brincam com legos, bonecas, fazem plasticina, jogam à bola, leem livros. Andam de escorrega, de baloiço e estão sempre a par de todos os eventos de crianças. Têm menos tempo, é certo, estão mais stressados, infelizmente, mas conseguem estar mais próximos. E a sociedade vai precisamente nesse sentido, do respeito pelas crianças, da necessidade de as entender, de as ajudar, da oferta inesgotável de atividades e eventos, de lojas de roupa, de técnicos especializados, de brinquedos e de puericultura.

É um novo tempo, com pais que se têm ajustado e que fazem tudo para acompanhar os filhos esquecendo-se até de si próprios. Do outro lado do ângulo podemos apreciá-los mais justamente: são próximos, compreensivos, preocupados e amigos. Há quem considere que até em demasia. Mas isso daria assunto para mais uma crónica.

filipachasqueira@gmail.com