O PSOE saiu vencedor das legislativas desta semana em Espanha, mas os seus 123 deputados (29%) não são suficientes para governar com maioria. O líder socialista, Pedro Sánchez, quer formar um Governo sem outras forças políticas, nomeadamente com o Unidas Podemos, preferindo um Executivo minoritário. Quer, assim, replicar a fórmula que lhe permitiu governar Espanha no último ano ao oferecer um pacto de apoio ao partido de Pablo Iglesias e ao Partido Nacionalista Basco – este último tem cinco deputados. Registe-se que os catalães, que se recusaram a apoiar o último orçamento socialista, não são encarados como aliados potenciais, ao contrário da última legislatura.
«A nossa intenção é ter um Governo como o atual, sozinhos, mas com vontade de chegar a acordos com outros partidos, se bem que preferimos fazê-lo com o Unidas Podemos, com quem já há uma experiência de entendimento», disse José Luis Ábalos, número três do PSOE, num discurso no 1º de Maio. Estas palavras não caíram bem a Pablo Iglesias, que encara o seu partido como fundamental para uma futura governação à esquerda pelo PSOE. Depois de ter dado o seu apoio aos socialistas na última legislatura, o Unidas Podemos pretendia integrar o Governo, ganhando força no sistema político espanhol. O partido de esquerda-radical conquistou 42 deputados, uma queda de 24 face às legislativas de 2016, quando conquistou 71. «Se se encontrar com a direita, saberemos do que estarão a falar e o que estarão a negociar», reagiu o líder do Unidas Podemos no 1º de Maio. «Haverá pressões para que não estejamos no governo, estamos preparados para lhes resistir», garantiu.
O mal-estar piorou ainda mais quando Sánchez anunciou que desejava reunir-se com todos os partidos antes de tomar uma decisão sobre o futuro executivo. Iglesias teme que o líder socialista o venha a excluir, preferindo aliar-se com outros partidos oferecendo-lhes um pacto de apoio. Ao longo da campanha eleitoral, foram muitos os avisos de Iglesias sobre um possível acordo governativo entre o PSOE e o Ciudadanos.
Mas o Ciudadanos, garantiu Albert Rivera, quer ser o líder da oposição contra o próximo Governo de Sánchez: «O nosso partido ergue-se como a esperança e o futuro da Espanha. Os líderes da oposição serão os deputados do Ciudadanos». Um aviso tanto para os socialistas como para os populares, que se arriscam a perder a liderança do bloco de direita como nunca antes. Independentemente de qual for a estratégia seguida, Sánchez será obrigado a mostrar as suas cartas a 21 de maio com a constituição das cortes, a eleição do novo Presidente do Congresso e da conferência de líderes parlamentares.
A primeira fase das negociações será sobretudo pela composição da mesa do Congresso. Sabendo disto, o líder do PP, Pablo Casado, que, depois de sofrer uma dura derrota no domingo passado – perdeu 71 dos seus 137 deputados -, pretende apresentar pactos a Sánchez. «Ofereci o nosso apoio nos orçamentos para se baixarem os impostos, se amortizar a dívida e se reduzir o défice, e a resposta foi concordar com o Podemos», disse Casado aos jornalistas, recuperando pouco depois os principais temas da sua campanha: «É preciso recuperar a legalidade, a coexistência e a prosperidade na Catalunha».
O líder popular não está numa posição fácil. Foi eleito Presidente do PP sob a promessa de recuperar a sua importância e de o reiventar, mas, ao invés, entregou a pior derrota eleitoral dos populares desde 1989. Perdeu votos para o Ciudadanos, mas principalmente para o Vox, de extrema-direita, permitindo-lhe entrar no Parlamento espanhol com 24 deputados. Pouco depois da noite eleitoral, Casado voltou atrás na sua aliança com o Vox e caracterizou-o como sendo de extrema-direita, levantando a hipótese de incompatibilidades de aliança, e recusou que tenha sido a sua estratégia política a responsável pela hecatombe. Bem pelo contrário, chegou mesmo a responsabilizar o antigo líder popular Mariano Rajoy pela quebra de votação.
As declarações não deixaram de abalar o Governo andaluz, onde o Vox, PP e Ciudadanos governam em conjunto depois de 36 anos de governação socialista. Nenhum líder do PP da Andaluzia repetiu as declarações do Presidente popular para não fragilizar ainda mais a coligação em vias de fazer 100 dias de governação e o contorcionismo verbal foi a solução encontrada. «A esquerda do PSOE é tão extrema-esquerda quanto a direita do PP é extrema-direita. Vox é para o PP o que o Podemos é para o PSOE. Isso é uma desqualificação», disse o porta-voz parlamentar do PP na Andaluzia, José Antonio Nieto. A coligação andaluza foi encarada pelas lideranças do bloco de direita como uma experiência regional que poderia abrir o caminho a uma solução nacional se o bloco saísse vencedor. Mas a expectativa de vitória não se concretizou. E a direita fragmentou-se como nunca nos últimos anos.
Além da subida do Vox, o Ciudadanos subiu dos 32 deputados para os 57 (15,86%), algo associado a uma perda de eleitorado do PP. E, no campo dos partidos regionais, os catalães da Esquerda Republicada da Catalunha conquistaram nove deputados, o Euskal Herria Bildu dois eleitos e a Coligação Canária um.
A fragmentação no Parlamento é tão grande que uma solução governativa estável será difícil de estabelecer, principalmente se se tiver em conta os temas a que o próximo Governo terá de fazer frente, como o independentismo catalão.
Entre os desejos de Sánchez e a realidade vai alguma distância e o líder socialista pode ver-se mesmo obrigado a ter de ir além de um pacto de apoio. A realidade dos números pode impor-se. Sem o apoio do Unidas Podemos – ou com a sua pontual ameaça de retirada de apoio no futuro -, Sánchez ver-se-á mergulhado nesta legislatura numa geometria bastante complicada, dependendo de apoio tema a tema. E o ponto da Catalunha, por exemplo, será fundamental, com Sánchez a ter de escolher entre uma abordagem dura contra o independentismo – como pede o bloco de direita – ou a ter de optar um referendo pactuado, como o Unidas Podemos defende, o que aliaria a sua base social e permitira grandes ataques à direita.