Uma revolta de 17 horas dentro de cinco estabelecimentos prisionais em Manaus, no estado do Amazonas, Brasil, causou a morte de 57 presos. O primeiro motim começou no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), durante o horário de visita de domingo passado, resultando em 15 mortos. No dia seguinte, foram encontrados cerca de 40 prisioneiros executados por enforcamento, segundo a Secretaria de Administração Penitenciária (SEAP) brasileira. É o maior massacre no Brasil em instituições prisionais desde Carandiru, São Paulo, em 1992, quando 111 presidiários foram mortos por agentes da polícia.
As mortes resultaram de perfurações com escovas de dentes, asfixia e golpes de “mata-leão” – o epíteto brasileiro para designar uma técnica de estrangulamento usada pelas artes marciais japonesas -, segundo as autoridades brasileiras.
Os incidentes ocorreram devido a conflitos entre fações e organizações criminosas da Família do Norte, aliada ao Comando Vermelho do Rio de Janeiro e o Primeiro Comando da Capital, com base em São Paulo, de acordo com o jornal brasileiro O Estadão. Estas organizações disputam as rotas do tráfico de droga no Amazonas. O Departamento de Correções da Amazónia afirmou à agência de notícias EFE que a situação estava controlada no final da tarde de domingo.
Recorde-se que o Compaj já tinha sido palco de confrontos entre gangues rivais, em 2017, que deixaram 56 pessoas mortas, muitas delas por decapitação. Além disso, um agente prisional morreu dentro da prisão em dezembro de 2018.
De acordo com a SEAP, as mortes da passada segunda-feira – onde inicialmente o Governo estadual falava em 42 óbitos – foram todas por enforcamento, em cinco complexos diferentes: Instituto Penal Antônio Trindade (25) ; Unidade Prisional do Puraquequara (6); Centro de Detenção Provisória Masculino (5); Complexo Penitenciário Anísio Jobim (4). Todas localizadas na capital do Amazonas. A rede amazónica da Globo, afirma que as autoridades locais estimam que mais de 130 prisioneiros poderão ter fugido.
Em comunicado, o governador do estado amazónico, Wilson Lima, declarou que pediu ajuda a Sérgio Moro, ministro da Justiça de Bolsonaro, naquilo que considerou ser “um problema nacional”. Com base nesse pedido, o Ministério da Justiça e Segurança Pública enviou uma Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária para atuar no complexo penitenciário de Manaus. “Formada por agentes federais de execução penal dos 26 estados da federação e do Distrito Federal, a FTIP obedece o planejamento definido pelos entes envolvidos na operação, sempre que houver necessidade de sua atuação”, explicou em nota o Ministério de Moro, clarificando ainda que “a Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) é responsável pela segurança da área externa do Complexo Penitenciário Anísio Jobim desde nove de janeiro de 2017. A FNSP continuará atuando no local”.
Entretanto, Lima pediu a transferência de nove presidiários para estabelecimentos prisionais federais “A gente quer transferir ainda essa semana. São cabeças e são líderes de grupos criminosos”, disse o governante à Globo. Por sua vez, Moro confirmou pelo twitter que o Governo Federal vai disponibilizar unidades federais para receber os respetivos presos. “Vamos disponibilizar vagas nos presídios federais para a transferência das lideranças envolvidas nesses massacres”, garantiu o ministro.
Além de estarem relacionados com disputas entre grupos de tráfico de droga, os motins são também fruto de situações de sobrelotação, prejudicando as condições dos reclusos. Uma investigação do Conselho Nacional de Justiça brasileiro, em outubro do ano passado, avaliou as condições do Compaj como péssimas. O complexo tem capacidade para 454 presidiários, mas abriga cerca de 1224 presos. Não possui detetor de metais e os presos provisórios dividem as celas com condenados. O Brasil tem a quarta maior população carcerária do mundo, estando apenas atrás da Rússia, dos Estados Unidos e da China. São mais de 622 mil reclusos, equivalendo a 1,67 presos por vaga.
Todavia, há quem desvalorize as condições das penitenciárias do país. “Quanto a evitar 100% que uma morte acontecesse, temos de ter a maturidade de entender que, em qualquer prisão do mundo, quando se quer matar, infelizmente vai se matar, como mataram. Enforcados, alguns com mata-leão. Então, isso o Estado não tem como evitar”, afirmou o secretário da Administração Penitenciária do Amazonas, Marcus Vinícius de Almeida. Opinião partilhada pelo governador amazónico, que considerou as mortes como “inevitáveis” e que impedir a matança nas celas seria “praticamente impossível”.