Se era certo que a campanha à liderança do Partido Conservador seria marcada pelo Brexit, foi uma surpresa para todos que tenha vindo à baila o consumo de drogas por parte dos candidatos. O tema surgiu quando o ministro do Ambiente britânico, Michael Gove, admitiu ao The Daily Mail ter consumido cocaína em múltiplas ocasiões, quando era jornalista, há mais de 20 anos – um crime punível com até sete anos de prisão no Reino Unido. Desde então, os vários outros candidatos têm sido questionados sobre o assunto, que tem gerado acusações de hipocrisia, face à política dura do Partido Conservador quanto à criminalização de estupefacientes.
“Foi um erro profundo”, lamentou o ministro do Ambiente, nas vésperas do lançamento do livro Michael Gove – Um Homem com Pressa, do jornalista Owen Bennett. No livro, é explicado que o assunto surgiu na verificação de antecedentes para a corrida à liderança dos conservadores de 2016, em que Gove também foi candidato. O ministro do Ambiente, que foi ministro da Justiça, terá admitido o uso de drogas, na antecipação de perguntas comprometedores que poderiam ser feitas pelos jornalistas. “Gove recebeu instruções para não dar essa resposta em público”, lê-se no livro, onde se refere que a resposta esperada seria que “os políticos têm direito uma vida privada antes de entrar para a política”.
Entretanto, sucederam-se as acusações de hipocrisia contra o ex-ministro da Justiça – que sempre se mostrou veemente contrário à despenalização das drogas. Tem sido relembrado um artigo seu, publicado no The Times em 1999 – ironicamente intitulado de “Quando é correto ser um hipócrita” – em que defende a manutenção da criminalização do uso de drogas. No artigo, Gove critíca os profissionais de classe média por exigirem a liberalização do uso de drogas, supostamente para lidar com a sua própria culpa. “É a recusa em defender valores porque a própria pessoa não os conseguiu cumprir”, escreveu Gove
Um antigo conselheiro do Governo britânico para as drogas, David Nutt, criticou o candidato, notando que esta revelação prova que os mais privilegiados sentem-se confortáveis “em quebrar a lei, mas não que os outros façam o mesmo”. Numa entrevista à BBC, o ex-ministro da Justiça foi confrontado com o facto de muitas pessoas estarem na prisão por cometerem exatamente o mesmo crime que ele. Gove respondeu que “as drogas arruínam vidas”, reafirmando o seu arrependimento.
Vários críticos do ministro do Ambiente têm exigido que se retire da corrida à liderança. Inicialmente visto como a única alternativa possível a Boris Johnson – o candidato mais bem posicionado – a queda em desgraça de Gove dá espaço a outros concorrentes, como Jeremy Hunt ou Sajid Javid, que também foram ministros de Theresa May.
Contudo, o ex-ministro da Justiça não é o único conservador a ter admitido utilizar drogas no passado. Ainda há alguns anos, em 2008, no programa Have I Got News For You, Boris Johnson admitiu ter experimentado marijuana e cocaína na universidade, explicando que lhe tinham oferecido uma “substância branca”, mas assegurou: “Eu espirrei e por isso não me entrou pelo nariz, podia ser açúcar”. Pouco tempo depois, questionado sobre a entrevista, Johnson afirmou que, não tendo entrado pelo nariz, era mentira que tivesse consumido cocaína. Contra acusações de hipocrisia, disse: “Tornei-me muito pouco liberal quanto ao assunto. Não quero que os meus filhos tomem drogas”.
Outro candidato que tomou drogas pesadas foi o excêntrico Rory Stewart (ver caixa ao lado), que assumiu esta semana à Sky News ter fumado ópio num casamento no Irão. Stewart lamentou o incidente, dado ter conhecido prisões quando era ministro, vendo em primeira mão “os estragos feitos nas comunidades”. Contudo, é de notar que não alterou a sua posição quanto à despenalização das drogas. Além disso, vários outros candidatos reconheceram ter consumido marijuana, nomeadamente Jeremy Hunt, Esther McVey e Dominic Raab e Matt Hancock.