Não sou capaz de me conformar com a ideia de ter de esperar uma eternidade sempre que vou a um serviço de saúde. É muito raro, seja no Estado ou no privado, alguém ser atendido pontualmente e parece que todos aceitam isso como se fosse uma inevitabilidade. A hora marcada é simplesmente uma referência. Eu sei que há médicos que são chamados de urgência e consultas que demoram mais do que o previsto, mas ainda assim parece-me que se as consultas fossem marcadas com maior espaço entre elas, os atrasos não seriam tão obscenos. No público, as escassas verbas e a consequente falta de pessoal levam a um exagerado número de consultas em pouco tempo e no privado é muitas vezes a ganância de ganhar mais que leva às mesmas consequências. Ou seja, não temos para onde nos virar. Se naqueles serviços de atendimento ao público em que todos sabemos que temos de tirar o dia para ir buscar um papel é muito aborrecido esperar, na saúde, onde muitas vezes as pessoas estão em sofrimento, ansiosas ou diminuídas, batem-se recordes de falta de humanismo, sobretudo na urgência. E isto só para falar dos tempos de espera.
Há uns meses, por exemplo, fui com o meu filho de dois anos a um hospital público para ser suturado. Depois de já ter sido visto na triagem e por dois médicos, ficámos mais de uma hora à espera que a única auxiliar de ação médica que havia nas redondezas estivesse disponível para limpar a sala de cirurgia antes de entrarmos. Quando a médica estava finalmente de linha na mão entra um colega a dizer que tinha sido chamada para outro serviço para onde teria de ir impreterivelmente.
A falta de pessoal, tal como de material, infraestruturas adequadas e de tudo o que possa exigir dinheiro, leva à sobrecarga e exaustão de quem trabalha e a um terrível ambiente de insatisfação que é transversal a todos os profissionais. Ouvimos reclamações, protestos, que podem ser connosco, com o computador, com o país, com o Estado, com o patrão, com os colegas ou com tudo ao mesmo tempo. É no entanto de enaltecer e de pasmar quando encontro funcionários que, nestas condições, nos acolhem de forma tão dedicada e empática.
Há umas semanas fui com outro filho a uma consulta privada e tive de levar também o irmão mais novo. Provavelmente iria ser um quebra-cabeças para conciliar com a hora de saída dos irmãos mais velhos da escola. Mas se por algum remoto acaso fôssemos atendidos pontualmente teria mais que tempo para fazer tudo com calma. A primeira meia hora de espera correu bem. Estivemos a ler histórias, a brincar e a petiscar, mas passado esse tempo os miúdos já não queriam estar sentados. Corriam, saltavam, pulavam, rebolavam pelos sofás e divertiam-se como mais ninguém naquela espaçosa sala.
Eu estava na dúvida de com quem me devia zangar: se com eles que pareciam ter encontrado a solução perfeita para o tédio, se com a médica ou com o hospital. Uma amiga que foi connosco aconselhou-me a fingir que aquelas estridentes crianças não eram minhas, mas pelos olhares acusatórios percebi que já não conseguia enganar ninguém. Depois de quase uma hora e meia fomos chamados. Quando cheguei a casa enviei uma mensagem à tal amiga que nos acompanhou a pedir desculpa pelo comportamento quase selvático dos meus filhos. Ao que ela respondeu: ‘Selvagem é quem deixa crianças pequenas tanto tempo à espera fechadas num hospital’.