A cadeira do Prof. Albuquerque no velho Quelhas denominava-se Cálculo Infinitesimal, uma ‘seca’ da qual só se saía por uma de três vias: estar em condições de discutir, de igual para igual, com o Mestre; empinar páginas e páginas de teoremas exóticos; ou… copiar! Sim, podia-se copiar, porque, escravo do dogma ‘estudante universitário não copia’, o bom professor nada via. Olhava para as sebentas escancaradas sobre as mesas, mas, literalmente, não as via.
Cinquenta anos depois, aparecem candidatos a émulos do velho professor, igualmente crédulos, de uma credulidade que ofende a inteligência. Vejamos…
1. «Primeiro-ministro não mente! Se mentisse, teria de ser substituído». Bem prega Frei Tomás…;
2. «Governador do Banco de Portugal não mente! Quem o contraditar, estará a caluniar um homem probo»;
3. No contrato da Fundação Berardo está escrito, preto no branco: «A devedora dará como garantia todo o seu património». Ou seja, 700 milhões de euros de Ativos, margem mais do que suficiente para cobrir os 350 milhões de crédito novo. Agora… se os Ativos já estavam dados em penhor, é coisa que não abala as crenças dos analistas. Como não os perturba o facto de não terem sido constituídas garantias adicionais. Se a única cobertura da dívida é o valor das ações adquiridas, a falha só pode ser imputada aos gestores que não tiveram competência para executar o que está escrito na cláusula das garantias. Mas de miudezas não cura o pretor…;
4. O financiamento contratado com a Fundação foi para comprar «ações cotadas em Bolsa»… não necessariamente do BCP. É certo que, em carta posterior, a Fundação veio precisar… que «os 350 milhões de euros serão utilizados, na sua totalidade, para comprar ações BCP». Mas, para a ‘associação dos amigos do governador’, tal declaração é irrelevante. À narrativa cor-de-rosa importam menos os factos provados do que a letra do contrato. Se existir discrepância entre uns e outro, a culpa é dos factos… que não se submeteram à letra do contrato;
5. Finalmente, o contrato estipula que o financiamento deve ser pago. Pudera! Melhor fora que um crédito desta envergadura fosse omisso no que respeita à liquidação. Hoje, a dívida continua por pagar, mas nem isso releva. Não releva para o Banco de Portugal, menos ainda para os preclaros analistas.
O Prof. Albuquerque nasceu no século XIX e já não está entre nós, mas continua a haver quem queira viver de dogmas e teime em ignorar as evidências. São os que são capazes de sustentar que nas autoestradas não se conduz a mais de 120 quilómetros à hora… porque o Código da Estrada não o permite.
Tanta ingenuidade comove. Sobretudo se vinda de pessoas bem informadas, algumas das quais tidas por intelectualmente sérias. Outras nem por isso, mas para o caso tanto dá…
Felizes os que contam com tão intrépidos defensores. Defendem o indefensável, caem no ridículo, mas, tal como na Roma antiga, os pretores não cuidam de miudezas.