Ultrapassada a Espanha (4-2) com uma garra inaudita, que meteu um prolongamente rijo como poucos e uma camada de nervos capaz de abanar a fachada da igreja da Sagrada Família, Portugal era obrigado a apresentar-se nesta final do Mundial de Barcelona com aquele toquezinho ligeiro de favoritismo do qual muitos de nós já têm saudades, tantos vão sendo os descalabros multiplicados neste desporto que já foi uma espécie de menina dos olhos de todos os portugueses mas que chegou agora ao exagero de não se conquistar um título mundial desde 2003 e, ainda por cima, de ser ver a Espanha tomar, de longada, a dianteira de maior açambarcadora de campeonatos do mundo da modalidade – 17 contra 15.
Tal como sucedeu com o futebol, o hóquei em patins resolveu adoptar a filosofia aborrecidamente defensiva de que não sofrer golos é o caminho aberto para obter uma vitória.
Ninguém se surpreendeu, portanto, que o zero-a-zero entre argentinos e portugueses durasse e durasse e durasse como o coelhinho das pilhas Duracell. Andava-se demasiado por ali sem grandes ambições, ou pelo menos sem a coragem de quererem ser superiores, serem melhores, serem dignos do titulo mundial que diputavam.
E, neste ritmo meio molenga, interrompido por quezílias constantes, o zero foi andando até final, com prolongamento e tudo, obrigando à decisão por grandes penalidades tal como acontecera no Portugal-Itália dos quartos-de-final.
Recorde-se que Portugal e Argentina já tinham embirrado num empate (1-1) na fase de grupos, superiorizando-se os argentinos na classificação final por melhor diferença de golos.
16 anos! Como dissemos atrás, 2003 foi o último ano em que Portugal se sagrou campeão do mundo, batendo nessa altura a Itália na final de Oliveira de Azeméis. É verdade que, entretanto, a modalidade perdeu muito prestígio interncacional. Infelizmente, o hóquei em patins é cada vez mais um desporto que só interessa a portuguseses, espanhóis, italianos e argentinos e o seu frcasso olímpico, em Barcelona, revelou que o seu futuro não tem estradas de tijolos amarelos para o tornarem brilhante como o caminho de Dorothy no Feiticeiro de Oz.
Se ambas as equipas foram incipientes durante todo o jogo na fase de rematarem à baliza, também é verdade que Ângelo Girão, o guarda-redes luso, se destacou como figura do jogo com intervenções de qualidade ímpar e que garantiram a Portugal a luta pelo troféu até ao minuto derradeiro. E aí, convenhamos, sem que isto tire mérito aos nossos felizes compatriotas que sonhavam com este momento há anos a mais, os acontecimentos caíram para o nosso lado.
Na fase das grandes penalidades, as coisas inverteram-se. Portugal foi bem mais incisivo. Nicolia deu vantagem aos argentinos mas Gonçalo Alves não se deixou levar pelos nervos e pôs tudo a par logo a seguir. Depois, remates falhados, um para cada lado, sendo que Girão defendeu o que lhe era calhado.
Hélder Nunes deu a Portugal o momento de superioridade que não viria a perder. Em seguida, falhanços atrás de falhanços. 2-1 seria suficiente para que a selecção nacional recuperasse o ceptro de campeão do mundo que já estava a tornar-se numa espécie de obsessão.
Era momento para a festa.
Ou para a tristeza, se nos debruçarmos sobre os aargentinos que já tinham batido os portugueses na final de um mundial em 1995, em Recife, no Brasil.
Sendo, seguramente, dono do campeonato nacional mais interessante e equilibrado do mundo – recorde-se que a última “final four” da Liga dos Campeões teve três equipas portuguesas – já se exigia mais à equipa das quinas ao peito. Depois de uma restruturação interna que levou Portugal a surgir no primeiro plano das competições interclubes, este vazio ia-se tornando incompreensível. O título mundial servirá, espera-se, para que o hóquei em patins português recupere o lugar que desde o final dos anos-40 foi seu no panorama universal. Isto é, o primeiro.