Tornar a “América branca de novo”?

Trump sugeriu a quatro congressistas da ala esquerda do Partido Democrata que voltassem para os “seus países”. Mas são cidadãs americanas.

Tornar a “América grande de novo” é tornar “a América branca de novo”? Foi com esta acusação que a democrata Nancy Pelosi, líder da câmara dos representantes, reagiu à fúria de tweets do Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra quatro congressistas da ala progressista desde domingo. Trump sugeriu que as mulheres voltassem para os seus “países infestados pelo crime”.

Mas Alexandria Ocasio-Cortez, Ayanna Pressley, Ilhan Omar e Rashida Tlaib, as mulheres visadas pelos comentários do Presidente, são cidadãs americanas. Das quatro, apenas Omar não nasceu nos Estados Unidos, tendo-se fixado no país aos 12 anos como refugiada da Somália.

O que levou Trump a sugerir que as quatro congressistas – conhecidas como o “Esquadrão”, por se posicionarem à esquerda da liderança do Partido Democrata – voltassem para “os seus países” terá sido o facto de não serem brancas e de estarem a mostrar-se muito críticas da sua política de “tolerância zero” para a migração. As congressistas têm denunciado as condições das instalações dos centros de detenção na fronteira com o México, depois de as terem visitado há duas semanas.

Para as quatro mulheres, que estiveram numa conferência de imprensa conjunta na segunda-feira, as palavras de Trump servem apenas para “distrair” os americanos das políticas postas em prática. “Encorajo todos os americanos a não morder o isco”, pediu Pressley.

“Ele não sabe como defender as suas políticas, por isso ataca-nos pessoalmente”, lamentou Ocasio-Cortez, reiterando que Trump não consegue “olhar de frente para uma criança” e justificar ao país porque é que a “está a atirar para uma cela”.

“Esta é a agenda dos nacionalistas brancos”, não hesitou em dizer Omar, numa das intervenções mais duras da conferência, em que defendeu o impeachment de Trump. Antes da reação das congressistas, já Trump tinha revelado não se preocupar se os seus comentários o ligavam à supremacia branca: “Muita gente concorda comigo”.

Os republicanos têm sido tímidos na condenação das palavras do Presidente. Apesar dos dois únicos membros negros do partido no Congresso terem considerado inequivocamente que os comentários do Presidente foram “racistas”, o líder do Senado, Mitch McConnell, não teceu quaisquer comentários à controvérsia. Lindsey Graham, senador da Carolina do Norte e próximo do Presidente, pediu a Trump que se concentrasse no ataque às políticas “comunistas” que as mulheres defendem. 

Por outro lado, o senador do Massachusetts e antigo candidato presidencial, Mitt Romney, considerou os comentários do Presidente “destrutivos”: “Dizer a cidadãos americanos para voltarem aos seus países é passar os limites”.

“Apesar da tentativa do ocupante da Casa Branca de nos marginalizar e silenciar, por favor saibam que nós somos mais de quatro pessoas”, afirmou Pressley. Sim, a congressista rejeitou chamar Presidente a Trump: “Eu vou sempre referi-lo como ocupante”.

* texto editado por José Cabrita Saraiva