Num dia destas férias estava a regressar da praia quando ouço ‘Olha a gorda!’. Ao meu lado vejo um menino de uns três anos de mão dada à mãe a referir-se a uma menina que devia ter uns cinco que caminhava à sua frente também ao lado da sua mãe. Ao ouvir o comentário, de imediato esta última lança um olhar fulminante à mãe do delator que se encolhe vermelha de vergonha. No mesmo dia vejo a tal menina ao pé da piscina a beber um sumo e a comer um Bolicao e nos dias seguintes volto a vê-la quase sempre acompanhada de comidas, bebidas e doces altamente açucarados.
Naturalmente temos de educar os nossos filhos a não discriminar, a terem respeito pelos outros e a não magoar por palavras ou ações – não deixando de incentivar que tenham uma opinião própria e a defendam – mas neste caso parece-me bem mais natural uma criança de três anos exprimir espontaneamente aquilo que vê do que uma família com mais umas décadas contribuir para que aquela criança seja alvo de comentários e problemas de saúde devido a hábitos alimentares errados.
Apesar deste ano se ter verificado uma redução do excesso de peso infantil no nosso país, há ainda um elevado número de crianças obesas e com patologias como a hipertensão, colesterol elevado ou diabetes tipo 2 que antigamente só se conheciam em adultos.
Aparentemente estamos cientes dos malefícios do açúcar – que segundo os pediatras é como um veneno e chega a criar dependência – mas vemos crianças cada vez mais pequenas com dietas diárias que incluem refrigerantes, sumos, gomas, chocolate, bolos, bolachas, etc.
Não sou fundamentalista nesta matéria mas só vejo vantagens em retardar e limitar o consumo de doces nas crianças. Sobretudo em tenra idade, quando ainda não têm acesso a eles por outros meios e só ganham em não os conhecer. Quando há irmãos mais velhos ou começam a ter contacto com estes alimentos deve então imperar o bom-senso, proibir taxativamente também não vai trazer vantagens.
Infelizmente a sociedade tende a acarinhar os doces como se fossem essenciais à sobrevivência dos mais novos, o que complica tudo. Por exemplo, quando o meu filho mais velho entrou para o primeiro ano a professora definiu que a quarta-feira seria o dia dos pais juntarem um doce ao lanche dos filhos. Isto para evitar que as crianças os levassem todos os dias. Fiquei perplexa. Se por um lado não proíbo os meus filhos de comerem doces – comem de volta e meia quando calha – por outro não acho que faça sentido ser obrigatório comerem-nos todas as semanas, ao lanche, num dia fixo. Uma sugestão bem intencionada, que tinha como objetivo reduzir o consumo de doces, quase me obrigou a juntar contra vontade qualquer coisa à lancheira do meu filho que de outra forma jamais me lembraria. Outra situação que se repete várias vezes ao ano e que se tornou um hábito é a dos saquinhos carregados de doces oferecidos pelos aniversariantes nas festas ou na escola. É caso para dizer, toma lá um presentinho envenenado.
Posto isto acho que a criança de três anos fez muito bem em chamar a atenção àquela mãe inconsequente. Só espero que a filha não tenha ouvido. Infelizmente o alerta não coibiu a mãe de lhe continuar a oferecer doces. O que me faz pensar que se esta mãe nem assim percebeu, será ainda mais difícil para aquelas que não recebem alertas ou que têm filhos magros e estão longe de imaginar que estes também podem desenvolver doenças metabólicas.